A última semana de outubro deste ano prometia. Surfistas de grandes ondas de todo o mundo lotavam a cidadezinha portuguesa de Nazaré, a cerca de 100 quilômetros de Lisboa, e vinham monitorando pela internet a entrada de um swell histórico, que carregaria massas d’água de até 100 pés — cerca de 30 metros de altura. Moradora da vila de pescadores há cinco anos, Maya Gabeira mal conseguiu pregar os olhos e cumpriu, no dia 28 daquele mês, o ritual que costuma seguir em “dias gigantes”: levantou antes do nascer do sol, pedalou na academia, fez exercícios de respiração, vestiu sua roupa de borracha com colete inflável e entrou no mar, na mesma praia em que quase perdeu a vida há exatos sete anos. Desta vez, a aventura se deu sem intempéries, assim como em fevereiro, quando ela desceu uma montanha d’água de 22,4 metros de altura.
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Maya não só bateu o próprio recorde, como ainda deslizou sobre a maior onda de 2020, entre homens e mulheres. “Essa vida é engraçada”, ri a surfista, ao lembrar que precisou, há dois anos, lutar por meio de uma petição para ter seu primeiro recorde reconhecido pelo Guinness — em 2018, a marca foi de 20,7 metros. O movimento reuniu mais de 20 000 assinaturas e fez com que o guia criasse uma categoria feminina para a competição. “Vendo exemplos assim, as mulheres passam a acreditar que a gente consegue estar no topo, disputando de igual para igual”, entusiasma-se Maya, que começou a pegar onda aos 14 anos, na escolinha de Paulinho Dolabella, no Arpoador, e acabou também se especializando em pilotar o jet-ski que conduz os atletas nos mares revoltos.
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No dia em que bateu o próprio recorde, ela salvou seu parceiro de equipe, depois de ele ter sido arrastado para perto das pedras. Quando chegou em casa, ligou para a mãe, a estilista Yamê Reis, para contar a epopeia. “Sempre telefono depois de um dia gigante. Isso me faz bem, alivia”, diz. A mãe ficou compreensivelmente preocupada, o que não chega a ser novidade tendo uma filha que não para em terra firme.