A cozinha solidária aos pés do Morro da Providência chegou à marca de 1 000 refeições servidas diariamente a pessoas em situação de vulnerabilidade. O cardápio é balanceado e nutritivo, e já recebeu assinatura de chefs como Claude Troisgros. Por lá também fica a maior horta comunitária da região, que abastece as quentinhas doadas a famílias da vizinhança e muitos mais. As iniciativas se desenrolam na nova sede da Ação da Cidadania, prestes a completar trinta anos de um notável trabalho de combate à fome sob a direção-executiva de Rodrigo Afonso, o Kiko.
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Segundo ele, ainda criança, foi “picado pelo bichinho do trabalho social”. Pudera. Seu pai, Carlos Afonso, ajudou a fundar, junto com o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho (a quem conheceu no período em que ambos se exilaram no Chile), o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas, o Ibase. Era 1981, e estava plantada ali a semente da ONG que ele hoje conduz, assim como a de várias outras. “Ganhei bastante dinheiro no setor privado, mas não era feliz. Acompanhando desde cedo essas lutas, sentia que precisava fazer mais”, lembra Kiko, que passou a infância no Canadá e veio para o Rio aos 7 anos.
Em 2014, quando o Brasil finalmente saiu do Mapa da Fome, ele prestou uma consultoria para pensar novos rumos para a Ação da Cidadania. Mas logo o cenário mudou, infelizmente, retrocesso revelado em dados: quatro anos depois, o número de brasileiros em insegurança alimentar grave havia dobrado. Atualmente, só no Rio, o problema com contornos de drama humanitário atinge 15% da população. “A fome foi agravada pela pandemia e políticas públicas desarticuladas nos últimos tempos”, pontua.
É o que faz Kiko, aos 49 anos, trabalhar duro. Ele retomou o Natal Sem Fome, maior campanha de arrecadação de alimentos da América Latina, e criou um braço pandêmico chamado Brasil Sem Fome, que arrecadou 20 000 toneladas de alimentos em 2021. Também vai atrás de empresas, apresentando modelos de parceria e captando recursos, e leva iniciativas da Ação Cidadania a cidades que enfrentam desastres naturais, como aconteceu com Petrópolis nas enchentes do início do ano. “O terceiro setor está evoluindo, se profissionalizando e, apesar de toda a dificuldade, remamos no lado certo da maré”, sentencia, embalado pelo otimismo.