Luciano Szafir e as sequelas da Covid:“Luto para não cair em depressão”
O ator de 52 anos fala sobre o lento e doloroso processo de recuperação após ficar mais de um mês internado
Tive alta do hospital em um sábado, 24 de julho, após 32 dias de internação, uma embolia pulmonar, uma cirurgia de emergência no intestino e, para completar, uma colostomia. Venci a Covid-19, mas a doença me deixou como herança um monte de encrencas.
A principal delas é a luta para não cair em depressão. Agradeço a cada minuto por ter saído dessa. Por ter tido a sorte de sobreviver e voltar para casa, enquanto mais de meio milhão de brasileiros tiveram a vida interrompida pelo novo coronavírus.
Mas a recuperação é lenta, exige muita paciência, e não só a minha, mas a de todos à minha volta. Mesmo fora do hospital, ainda sinto muito medo por tudo que venho passando para me recuperar.
As noites são sempre difíceis. Eu me deito e não consigo pegar no sono. Logo vêm à cabeça lembranças do momento em que fui intubado, a pior experiência da minha vida. Não conseguia respirar e tive a certeza de que morreria.
Aos 52 anos, estou fazendo terapia pela primeira vez. Também me apeguei à meditação e à fé. Ainda no hospital, me reaproximei da religião judaica, e a conexão com Deus tem me ajudado muito a superar as dificuldades diárias.
Eu sempre fui muito ativo, destemido, mas hoje preciso de ajuda para coisas simples, como secar as pernas após o banho, já que não consigo me abaixar. Perdi 17 quilos e meus músculos foram embora. É duro olhar no espelho e não me reconhecer. A impressão que tenho é de que envelheci vários anos em poucos dias.
A Covid tomou metade dos meus pulmões e ainda sinto um cansaço tremendo. Faço uma hora de fisioterapia todos os dias e, quando a sessão termina, parece que corri uma maratona. A endorfina é uma recompensa. Antes de ficar doente, eu levantava halteres de 20 quilos na academia. Hoje, com muito esforço, encaro 2 quilos.
Outro dia, estava exausto após me exercitar, não conseguia nem me mexer. As crianças estavam brincando e eu comentei com a minha esposa (a cantora Luhanna Szafir) que, mesmo sem perceber uma melhora clara, já valia a pena estar ali, observando a movimentação e a alegria dos meninos.
Ainda terei de voltar ao hospital, para uma cirurgia de reconstrução intestinal em outubro, mas, depois, não vejo a hora de poder tirar férias em família, em um lugar calmo, sem celular, só aproveitando o tempo com meus três filhos.
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A verdade é que virei o cara mais medroso do mundo. Estou viciado no oxímetro (aparelho que mede a saturação de oxigênio no sangue). Criei um grupo de WhatsApp com a junta médica que me acompanhou no hospital e toda hora coloco na roda uma pergunta, uma dúvida. Sou o chato de plantão, eu sei. Só que, neste momento, prefiro pecar pelo excesso.
A cada manhã, me sinto melhor, mas não me descuido. Envio um relatório completo para os doutores: meço pressão arterial, batimentos cardíacos, tudo. Pode soar clichê, mas tive realmente de chegar muito perto da morte para entender que é preciso pouco para ser feliz.
Quando estava na cama do hospital, eu só queria sentir o cheiro dos meus filhos, abraçá-los, tive pavor de não vê-los novamente. Poder estar ao lado deles é uma dádiva. A frustração e a depressão estão à espreita, e sei que a minha força vem da mente.
As pequenas vitórias, seja tomando um copo de água, seja caminhando alguns metros sem perder o fôlego, significam muito para mim, é uma superação. Nesta luta, estou certo de que é um degrau de cada vez.
Luciano Szafir em depoimento a Marcela Capobianco