Aos 52 anos, Murilo Benício, ator e agora produtor e diretor, anda às voltas com a estreia, em 28 de setembro, de seu segundo filme, Pérola, baseado na peça homônima de Mauro Rasi. Numa espécie de homenagem, emocionante e divertida, a todas as mães e tias de uma típica família brasileira dos anos 1970, Murilo inseriu memórias de sua própria progenitora, Berenice, falecida em 2012. “É um filme leve, mas arrancou pedaços de mim, porque minha mãe não está mais aqui”, conta ele, lembrando que ela o levava duas vezes por semana de Niterói ao Jardim Botânico para estudar teatro na infância. O ator e diretor é também produtor do longa ao lado da Pureza Filmes, com co-produção da Globo Filmes e distribuição da H2O. Depois do sucesso com o temido vilão Tenório da novela Pantanal (2022), Murilo também acaba de gravar para o Globoplay a série Justiça 2, de cabeça raspada, em que vive um personagem ainda mais complexo — Jaime, um dono de supermercado que abusa da sobrinha. “Tento sempre fazer o vilão sem criticá-lo. Mas neste caso, resolvi tirar todo o sentimento dele”, diz o ator, que ainda falou a VEJA RIO sobre o relacionamento a distância com a jornalista Cecilia Malan e com os dois filhos, Antonio e Pietro, que vivem com ele, e da amizade que mantém com a ex-mulher Giovanna Antonelli, responsável por convencê-lo a ser mais ativo nas redes sociais.
Como surgiu a ideia de levar um dos maiores sucessos do teatro brasileiro para o cinema? Em 1995, o Mauro Rasi me convidou para ver o espetáculo e jantamos depois. Quando acabou, falei para ele: “É um filme, você tem que filmar”. Isso nunca saiu da minha cabeça. Era um projeto que já cultivava há muito tempo.
Sua mãe o incentivava ou, como a Pérola, preferia que o filho fosse advogado? Quando falei que queria ser ator, num primeiro momento, meus pais achavam que estava brincando porque eu era muito gago. Mas eles foram grandes incentivadores. Eu era de Niterói, comecei no Tablado aos 11 anos, e minha mãe me levava ao Jardim Botânico e ia para o Shopping da Gávea fazer hora para me esperar. Essa era a mãe que eu tinha.
Sendo uma comédia sobre a figura universal da mãe, acha que o filme pode despertar o interesse do mesmo tipo de público que atraiu multidões para assistir a Minha Mãe é uma Peça? Esses fenômenos, tipo Minha Mãe é uma Peça, não se explicam. Acho que Pérola tem todo o potencial para tocar as pessoas. Você ri, se emociona, lembra de alguém da família. Mas a gente depende de orçamento e uma série de fatores na estratégia de lançamento.
O elenco do filme aposta em grandes nomes do teatro, como Rodolfo Vaz, que acumulam talento, mas não são expoentes nas redes. Como vê essa nova noção de sucesso? Espero que seja uma coisa passageira. Fico apreensivo quando um diretor escala uma pessoa pelo número de seguidores nas redes. Isso pode gerar um empobrecimento inacreditável da obra. Outro dia, eu estava até falando sobre isso com meus filhos, citando a Millie Bobby Brown. Ela tem 63 milhões de seguidores no Instagram porque fez Stranger Things. Não foi o contrário. E assim deveria ser. Primeiro vem um trabalho importante, depois os seguidores.
Seu uso moderado das redes destoa do de seus colegas. Por que optou pela discrição virtual? Olha, até que tenho estado mais ativo nas redes. A Giovanna (Antonelli) me perturba, me colocou até no escritório dela. Sei que as mídias sociais têm a sua importância. Existe essa turma legal que gosta da gente, quer saber o que estamos pensando, fazendo. Então me propus a estar um pouco mais presente, mas de uma maneira que seja razoável para mim.
“Fico apreensivo quando um diretor escala uma pessoa pelo número de seguidores. Isso pode gerar um empobrecimento inacreditável da obra”
Você postou outro dia sua carteirinha da Casa das Artes de Laranjeiras (CAL), de 1989. Mudou muito de lá para cá? Tanta coisa boa aconteceu. Mesmo minhas inseguranças, meus medos e minhas incertezas me ajudaram. O medo te mantém atento, sempre na busca. Acho que as coisas só aconteceram para mim porque, na minha cabeça, eu ia morrer tentando. Nunca desistiria.
Depois do Tenório de Pantanal, você interpreta Jaime, um homem preso por abusar sexualmente da sobrinha na série Justiça 2. É um papel complexo? Tento sempre fazer o vilão sem criticar o vilão, tentando entender a lógica dele. A minha dificuldade agora foi que eu não compreendia o sentimento dele. Em Pantanal, o Tenório passou por muitas questões que o levaram a virar o bicho que era. No caso de Justiça 2, eu tive dificuldade de entender onde estava o sentimento e a dor do Jaime. Resolvi, então, tirar todo o sentimento e encarnar um cara frio.
Como lida com a persistente herança machista na sociedade? Nos anos 80, quando comecei, não havia o politicamente correto. Tive a grande sorte de entrar aos 11 anos no teatro, ver gente de todo jeito e entender que ali é muito mais legal. Meus filhos também me ajudam muito a refinar minha visão.
Saúde mental é assunto na sua casa? Meus filhos estão na terapia e adoram. Eu também já fiz, mas não tenho esse encantamento que todo mundo que faz costuma ter. Lido com as minhas loucuras quando estou interpretando. Vejo como uma forma de terapia, de me livrar de alguns demônios.
A fama de namorador, alimentada por uma vasta lista de colegas de trabalho com quem se relacionou, como as atrizes Alessandra Negrini, Giovanna Antonelli, Guilhermina Guinle e Débora Falabella, o incomoda em algum grau? Não ligo, não. Tudo bem. Mas não tive tantas namoradas assim. É que não sou de sair à noite, então onde vou encontrar as pessoas? No trabalho. Por acaso, vivo em um meio em que se encontram pessoas incríveis uma atrás da outra.
Tem boa relação com suas ex-parceiras? Tenho uma relação ótima com a Alessandra, mas a Giovanna virou minha irmã. Ela se preocupa até com quem estou namorando. Somos família mesmo, e isso é maravilhoso inclusive para o Pietro, nosso filho. Dia desses, ele me perguntou: “Pai, o que você vai fazer hoje à tarde?”. E eu respondi: “Estou indo lá ver tua mãe”. Rimos, porque deveria ser o contrário.
Como é manter o namoro com a jornalista Cecília Malan na ponte aérea Londres-Rio? Não é fácil, e também é caríssimo. Mas todo encontro vira um evento. Tem a distância, que é chata, mas, por outro lado, tem a saudade que fica porque você não pode estar com a pessoa a qualquer momento.