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Taís Araújo: “Não faz sentido ser uma artista que não olhe para o país”

Em entrevista a VEJA RIO, atriz fala sobre carreira, família, representatividade negra e desejo para as próximas eleições: "Brasil, não me decepcione"

Por Melina Dalboni
Atualizado em 25 Maio 2022, 16h38 - Publicado em 20 Maio 2022, 06h00
Taís Araujo
Taís Araujo: "Não tenho tempo para pensar nisso", afirma a atriz sobre a possibilidade de uma carreira internacional - (Andre Nicolau/Divulgação)
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Estar acompanhada das mulheres que a inspiram — esse é um lema na vida da atriz Taís Araujo, 43 anos, que não perde chance de condenar o racismo e o machismo predominantes no Brasil. Ao responder sobre o que está lendo, ela estica o braço e alcança na estante de casa cinco livros de romancistas e intelectuais negras: Bell Hooks, Cida Bento, Sueli Carneiro, Angela Davis e Toni Morrison. “A minha sensação, quando leio essas mulheres pretas, é de pertencimento”, diz Taís, emocionada.

Duas vezes presente na Mipad, a sigla em inglês das 100 pessoas afro-descendentes mais influentes do mundo, a atriz é protagonista de Cara e Coragem, a novela das 7 da TV Globo que estreia no dia 30 com ares de comédia romântica de ação, e também está em cartaz no cinema em Medida Provisória, filme dirigido pelo marido, Lázaro Ramos, e visto por 400 000 espectadores em quatro semanas de exibição.

Não tem planos, porém, de investir em carreira internacional. “Eu tenho dois filhos para criar, levo no colégio todo dia, não tenho nem tempo para pensar nisso não”, brincou durante o papo com VEJA RIO.

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Você está sempre envolvida em vários projetos. Concilia bem vida profissional e pessoal? Eu? Esquece, não existe conciliar. Seria mentira dizer que eu consigo. Fico equilibrando os pratinhos o tempo inteiro. Aí um prato cai, quebra, eu pego, colo, e às vezes fica mal colado mesmo. Nem tudo vai dar certo. Até porque não tem como ser pleno em tudo e o tempo inteiro.

Sente culpa? Muita. O que mais me culpa, obviamente, é a relação com meus filhos, especialmente quando faço novela, porque nos vemos muito pouco — e eles não têm culpa da profissão que escolhi. Eu tento ficar junto quando estou livre, mas, muitas vezes, não é um tempo de qualidade, porque estou sempre exausta e pensando na cena que eu tenho de estudar, nas coisas a fazer.

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Qual foi seu maior desafio como mãe? Entender que eles não são uma extensão de mim. Tive uma educação excelente, mas muito rígida. Não se falava sobre drogas, sexo. Hoje, com tudo a que eles têm acesso pela internet, não há como ignorar esses assuntos. Uma frase que a gente usa muito aqui em casa é: não tem conversa difícil.

Planeja investir em uma carreira internacional? Tenho preguiça, essa é a verdade. Com dois filhos para criar e uma carreira de mais de trinta anos, não tenho tempo para pensar nisso. Aos 43 anos, vou ficar batendo de porta em porta, fazendo teste em Hollywood para receber não atrás de não? Se acontecer, é porque caiu no meu colo.

Houve mudança na dramaturgia e no mercado em relação a personagens e atores negros? Houve sim, mas ainda está muito aquém do que deveria ser. É vergonhoso quando vejo pesquisas sendo feitas para saber se o público negro quer se ver na televisão. É óbvio que queremos nos ver, que não dá para fazer uma novela na Bahia cheia de gente branca. A demanda existe, é mundial, e quem não atendê-la vai perder público, dinheiro e espaço.

Você é um símbolo dessas mudanças? Só de Globo eu tenho 25 anos e vi muita coisa mudar para melhor. Porém, tive muito mais oportunidades do que outras atrizes negras. Não sou a mais talentosa, nem a mais bonita. Só me tornei a atriz que sou hoje porque eu pude exercitar, tive chances, possibilidades e ganhei bagagem.

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É bom voltar a fazer uma comédia? Eu amo fazer novela das 7 porque são leves e a gente está precisando rir, ver um romance, aliviar um pouquinho. Ninguém está aguentando mais viver em sobressalto contínuo, com esse aperto no peito. A comédia e a arte proporcionam um momento de escape.

Sua personagem em Cara e Coragem é uma empresária de sucesso. Você a compõe pensando em alguém? Conheço muitas mulheres que estão na liderança de empresas, como a Rachel Maia e a Luiza Trajano. Adoro conversar com elas porque é um universo diferente do meu. Mas sei que ainda não é natural ver mulheres no poder. Vivemos num país machista e misógino. O patriarcado é um enorme obstáculo, mas já há um entendimento de que quanto mais mulheres no poder, melhor nossa vida será.

Participa das cenas de ação? Essa parte eu deixo com a Paolla (Oliveira) e o Marcelo (Serrado), porque não tenho a mínima vocação para ação. Não é meu talento. A gente tem de saber para que serve na vida.

“Não faz sentido ser uma artista que não olhe para o país em que vivemos”

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Já sofreu racismo ou assédio no trabalho? Há bem pouco tempo passei por uma situação dessas. Não é porque sou protagonista de novela que isso não vai acontecer comigo. Ninguém está livre, basta estar com a guarda um pouco mais baixa. Se alguém te pega num momento frágil, quando você percebe já está enredada, chorando e tremendo toda.

Como você se posiciona nessas situações? É o que eu falo para todas as mulheres: devemos estar sempre alertas para botar limite, seja em quem for. Ninguém pode atravessar você e seu corpo. As pessoas sempre falam: mas tudo é racismo, tudo é machismo? Sim. Porque o Brasil foi construído sobre esses dois pilares. A partir desse entendimento, podemos conversar e começar a desconstruir as coisas. É um exercício.

Lázaro, que a dirigiu no cinema, declarou que teve ciúme nas suas cenas de beijo em Medida Provisória. Você também sente ciúmes? Eu finjo normalidade. Por dentro, fico morrendo de ciúme, mas não demonstro, para não dar brecha. Só que agora ele vai saber (risos).

As pessoas acham que vocês são aquele casal perfeito de comercial de margarina. Tem receita? Se tivesse, estava vendendo por aí. Uma vez, uma pessoa me disse sobre casamento: quando estiver difícil, foca nas qualidades e, se as qualidades estiverem valendo a pena, siga em frente. Tem de voltar e lembrar porque você escolheu aquela pessoa.

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Foi difícil conviver na pandemia? Se alguém tivesse me dito que iríamos nos casar e passar 24 horas juntos, provavelmente eu teria dito não. A gente teve de superar uma série de questões, fazer adaptações, como todo mundo.

Após quase vinte anos de terapia, qual a maior lição? Aprender a lidar com frustração e expectativa. E tentar sempre ser fiel a mim, porque, às vezes, a gente se atrapalha.

Você já sofreu ameaças em decorrência de declarações políticas? Sim, mas quando me manifesto, não estou falando por mim, até porque minha vida é muito boa. Estou olhando para o Brasil, para um botijão de gás que hoje custa 10% do valor do salário mínimo.

Como você lida com os ataques? Não faz sentido ser uma artista que não olhe para o país em que vivemos. Eu estou aqui para entreter e para fazer rir, sim, mas também para provocar reflexão.

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O que você espera das próximas eleições? Um novo presidente. Brasil, não me decepcione.

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