Livre, leve e solta: a transparência domina os looks nas ruas e passarelas
Peças vêm ganhando as araras das lojas, festas e eventos no Rio, num exercício de liberdade em que as pessoas exibem o corpo sem medo de ser feliz
Assim que pipocaram as primeiras fotos de Bruna Marquezine chegando ao desfile da Burberry na Semana de Moda de Londres, as redes sociais fervilharam, e o nome da atriz foi parar no rol dos assuntos mais comentados no Twitter. O fermento para tamanho interesse veio de uma dura crítica da primeira-dama Michelle Bolsonaro, que disparou: “A pessoa gosta de ser feia e vulgar”. No centro da discórdia estava um vestido longo preto cheio de recortes ousados que, por outro lado, arrancou elogios do rapper americano Kanye West (Ye).
Com exíguos panos (poucos, diga-se), a peça é exemplar de uma tendência ascendente nos guarda-roupas femininos: as transparências. Elas vêm dominando os looks não só nas passarelas internacionais e em araras de grifes caras, como nas principais marcas cariocas e em lojas de departamentos da cidade.
“Os tecidos telados existem desde sempre, vão e voltam em ciclos, de acordo com o momento histórico”, explica a pesquisadora e analista de moda e comportamento Paula Acioli, autora do livro A Culpa É do Rio! — A Cidade que Inventou a Moda do Brasil. “Atualmente, estão associados à conquista da liberdade das mulheres em exibir o corpo sem medo e sem preconceitos.”
Na pista de festas que vêm chacoalhando a noite da cidade ou na plateia de grandes festivais de música, os tecidos finíssimos e transparentes se fazem presentes — foram vistos em abundância no Coachella, na Califórnia, e no Lollapalooza, em São Paulo.
Não foi diferente no Rock in Rio, em setembro, onde famosas como Tatá Werneck, Ingrid Guimarães, Giovanna Antonelli, Flávia Alessandra e Vitória Strada surgiram esvoaçantes com vestidos, calças, saias e tops deixando entrever partes do corpo, muitas vezes por cima de biquínis e até tapa-mamilos (aqueles adesivos que escondem o bico dos seios).
“A segunda pele é sempre um sucesso de vendas nas nossas coleções”, confirma a diretora de estilo da marca carioca Dress To, Thati Amorim, que também destaca a popularidade de vestidos para lá de recortados, em que se avista a silhueta na medida certa, “com cuidado para não cair no vulgar”.
As raízes históricas das transparências estão fincadas no Egito Antigo, quando eram usadas túnicas de linho, material bem leve que hoje em dia voltou a estar em alta. O translúcido conceito segue firme e forte neste século XXI, mas repaginado por uma indústria têxtil que avançou imensamente nos últimos milênios.
Além do clássico tule, cujo nome faz referência à cidade francesa Tulle, onde se originou, e é muito empregado para compor as peças do momento, outros tecidos aparecem em blusas, vestidos, saias e calças, entre eles renda, crochê, chiffon e organza.
Eles surgem em variadas cores e estampas. Os materiais mais leves, aliás, têm tudo para se impor no tradicionalmente tórrido verão carioca. “A premissa é: quanto mais pele à mostra, melhor”, enfatiza Vanessa Rodrigues, diretora de estilo da My Place, que recorrerá a panos mais fluidos na coleção da próxima estação, inspirada no oceano.
Além de corpos cuidadosamente à mostra por trás das transparências, eles também se revelam em comprimentos mais curtos, decotes profundos, croppeds (blusinhas curtinhas) de múltiplos estilos e outras peças que viveram seu tempo áureo nos anos 2000 — minissaias, tops cruzados e calças de cintura baixa estão na lista.
“Depois da pandemia, ninguém quer mais ficar de pijama. Eu tenho apostado muito na tendência de recortes e pele à mostra, inspirada nos visuais da Dua Lipa”, conta a influenciadora digital Luiza Tardin, 30 anos.
A cantora britânica, aliás, representa um ícone fashion para as jovens gerações. Na turnê Future Nostalgia, que aterrissou no Rock in Rio deste ano, Dua Lipa mescla uma pegada futurista com a moda chamativa dos anos 1980, trajando um macacão amarelo de renda justíssimo e outro preto, recortado com transparências — uma peça “de milhões” desenhada por Casey Cadwallader, diretor criativo da Mugler.
No mundo pop, não somente os visuais femininos têm caprichado na ousadia, mas também os masculinos — a banda de rock italiana Måneskin, que se apresentou no festival carioca, levou ao palco músicos que usaram e abusaram de rendas e transparências. Na verdade, a maior de todas as modas é ser livre e se vestir sem medo de julgamentos.
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