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A história do Carnaval em 15 curiosidades

Livro retrata a trajetória do carnaval carioca a partir dos enredos das escolas de samba e seus carnavalescos

Por Thaís Meinicke
Atualizado em 2 jun 2017, 12h46 - Publicado em 4 fev 2015, 22h10
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    Uma das festas mais famosas do mundo, o Carnaval do Rio é motivo de orgulho mesmo para os cariocas menos empolgados com a folia de Momo. Seja nos desfiles das escolas na Marquês de Sapucaí ou nos blocos que animam as diferentes regiões da cidade, é difícil não se contagiar com esta tradição da cidade. Neste embalo, os apaixonados pela folia acabam de ganhar um ótimo entretenimento. Às vésperas do Carnaval e no ano dos 450 anos do Rio, um livro se encarrega da missão de contar a história da festa através de curiosidades sobre seus principais personagens. Com lançamento marcado para este sábado (7), às 14h, na Casa Porto, no Largo de São Francisco da Prainha, Pra tudo começar na quinta-feira – o enredo dos enredos (180 páginas – R$ 35) reúne episódios que marcaram a Avenida.

    Pra tudo começar na quinta-feira
    Pra tudo começar na quinta-feira ()

    A obra se divide em duas partes: na primeira, os autores Luiz Antonio Simas e Fábio Fabato analisam, a partir de uma vasta pesquisa, a relação dos enredos das escolas de samba com o contexto histórico, político e social do país. “O livro surgiu de uma impressão minha e do Simas de que um dos mais importantes quesitos do carnaval, o enredo – hoje muito sacrificado pelos patrocínios temáticos -, ainda não tinha uma obra de referência. Afinal, o carnaval é um grande divã, onde o país se analisa, se vê, se reflete e processa o que vem pela frente”, explica Fabato.

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    A segunda parte trata do papel dos carnavalescos para as escolas de samba. Antes vistos como “intrusos” nas comunidades, estas figuras se tornaram peças-chave no processo de desenvolvimento e inovação dos desfiles ao longo dos anos. Nesta parte, são lembrados nomes como os de Joãosinho Trinta, Rosa Magalhães, Paulo Barros, Julinho da Mangueira e Fernando Pamplona, responsável pelas ilustrações que estampam o livro, cedidas pela família do carnavalesco para a obra. Pamplona, morto em 2013, é tema da São Clemente no carnaval 2015.

    simas e fabato
    simas e fabato ()
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    Confira algumas curiosidades destacadas por Fábio Fabato:

    ► Em 1989, a modelo Enoli Lara protagoniza o primeiro nu frontal da Avenida. A Liesa se enfeza e cria um regulamento proibindo a “Genitália desnudada” para 1990. Joãosinho Trinta, sem concordar com a proibição, criar então o enredo “Todo mundo nasceu nu” para aquele mesmo ano, e coloca um abre-alas com esculturas de vários políticos como bebês pelados, entre eles Lula, Brizola, Collor. Foi vice-campeão. 

    ► Em 1988, Cem anos da Abolição, a Imperatriz fez um enredo super bem humorado chamado “Conta outra que este foi boa”, em que ironizava várias mentiras histórias nacionais. Numa delas, implicava com a Princesa Isabel e acabou em último lugar:

    Cabral, ô Cabral

    O esquema é de lograr (de lograr) (bis)

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    De 71 com a realeza

    Me mandou uma princesa

    Que fingiu me libertar, me libertar

    – Eis que no ano seguinte, 1989, a mesmíssima Imperatriz resolveu homenagear a Proclamação da República e mudou a forma de tratar a princesa. Ficou em primeiro lugar:

    Pra Isabel, a heroína

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    Que assinou a lei divina

    Negro, dançou, comemorou o fim da sina

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    ► Em 2002, a mesma Imperatriz Leopoldinense recebeu patrocínio da Prefeitura de Campos dos Goitacazes para um enredo chapa branca sobre a cidade, algo que começasse com belezas naturais e terminasse num carro com bolo de aniversário. Inconformada, a carnavalesca Rosa Magalhães decidiu driblar a proposta sem abrir mão das cifras. No desfile, não se viu, por exemplo, a alegoria da última ponte erguida pelo alcaide de então. Longe disso.  A artista tratou de falar de antropofagia, partindo de índios cuja dieta era focada em carne humana (os tais Goitacazes), e desembocou no Movimento Modernista da Semana de 1922. Bingo! E ponto para a arte. A Prefeitura da cidade não gostou do resultado final e quase processou a escola, mas o enredo foi considerado o melhor daquele ano. 

    livro samba 1
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    Veja ainda outras histórias contidas no livro:

    ► Não havia, nos primeiros tempos dos concursos, uma ligação necessária entre o enredo proposto pela agremiação, o aparato visual do cortejo e os sambas apresentados. Uma escola de samba podia, por exemplo, fazer um enredo sobre a Festa do Bonfim na Bahia, desfilar com fantasias de nobres da corte com perucas à Luis XV e cantar um samba o sobre amor por uma cabrocha ou o entardecer no Morro de São Carlos.

    ► O desfile que sistematiza a união entre enredo, visual e samaba é o da Portela, em 1939. Além de desenvolver o enredo Teste ao Samba, Paulo da Portela fez o samba e foi responsável pela harmonia da escola. No dia do desfile, apresentou-se como um professor que distribuía diplomas aos alunos na frente da comissão julgadora. Este enredo é a primeira referência que existe de uma dramatização completa do cortejo das escolas. O samaba dizia:

    Vou começar a aula

    Perante a comissão

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    Muita atenção, eu quero ver

    Se diploma-los posso

    Salve o fessor

    Dá nota a ele, senhor

    Quatorze com dois, doze

    Noves fora, tudo é nosso

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    ► Em 1938, o Regulamento proposto pela União das Escolas de samba, seguindo a cartilha da exaltação nacionalista da Era Vargas e em evidente tentativa de legitimar as agremiações, estabelecia que “não serão permitidas histórias internacionais em sonhos ou imaginação”. Tal perspectiva gerou a desclassificação da Vizinha Faladeira, que desfilou naquele ano com o enredo Branca de Neve e os Sete Anões, baseado no desenho de Walt Disney.

    ► Com pequenas variações, a exigência de temas nacionais permaneceu até a década de 90. Foi abolida em 1997, quando a Acadêmicos da Rocinha desfilou com o enredo A Viagem de Zé Carioca à Disney. Na sinopse de apresentação, a agremiação afirmava que “o carnaval do Rio de Janeiro terá pela primeira vez em sua história uma escola de samba desfilando com um motivo internacional”. A pioneira Branca de Neve da Vizinha Faladeira, nos românticos anos 30, não deve ter gostado da onda que a Rocinha tirou.

    ► A exaltação à cultura negra só apareceu na Avenida na década de 60. Ao desfilar com o seminal Quilombo dos Palmares, no carnaval de 1960, o Salgueiro de Fernando Pamplona apresentou uma visão dos quilombolas fundamentada no caráter guerreiro e na defesa tenaz do território rebelde. A letra dizia:

    (…) Os escravos fugiram da opressão

    E do julgo dos portugueses

    Esses revoltosos

    Ansiosos pela liberdade

    Nos arraiais dos Palmares

    Buscavam a tranquilidade

    ► A primeira vez que escolas de samba citam um orixá é no tardio ano de 1966, mais de 30 anos depois dos primeiros desfiles, durante o período da africanização dos temas. A primazia coube a duas escolas: o Império Serrano e a São Clemente, que desfilaram, em grupos diferentes, com enredos sobre a Bahia e citaram Iemanjá.

    ► Em 1967, ano seguinte à citação de Iemanjá que introduziu os orixás no vocabulário dos sambas-enredo, a Unidos de Lucas apresentou o enredo Festas folclóricas do Rio de Janeiro. O refrão é o primeiro registrado na história dos desfiles que ousa simular um canto de candomblé nagô:

    Bulaiê, Bulaiê, Bulaiô

    Airá é Xangô, Airá é Xangô

    Agulelê, Agulelê

    Gulê Olorum, Axá Norogô

    ► Um exemplo de que as efemérides continuaram firmes e fortes aconteceu em 1965, quando a cidade completou 400 anos. O aniversário do Rio, comemorado no dia 1º de março, caiu no domingo de carnaval. Inseridas na programação do jubileu e em constante diálogo com o poder público, as agremiações de todos os grupos fecharam acordo com o governo para fazer um carnaval temático em homenagem à data. A campeã foi o Salgueiro, com o enredo História do Carnaval Carioca.

    Confira abaixo um vídeo sobre o Carnaval de 1965 produzido pelo Comitê Rio450:

     

    ► A instauração do regime militar em 1964, aprofundado em seu caráter repressivo em 1968, com a instauração do AI-5, repercutiu nos enredos das agremiações cariocas, sobretudo na primeira metade da década de 1970, quando a ditadura surfou na onda desenvolvimentista do “milagre brasileiro”. Seguindo esse ritmo, várias escolas embarcaram na onda dos enredos ufanistas.

    ► Nesse assunto, a Beija-Flor acabou recebendo a a pecha de agremiação chapa-branca da ditadura, com enredos de louvação ao Brasil dos militares. Depois de homenagens em 1973 e 1974, o samba de 1975, O Grande Decênio, em comemoração aos dez anos do golpe, beirava o inacreditável, com saudações ao PIS e o Pasep, ao programa de alfabetização Mobral e ao Funrural, programa de auxílio ao pequeno lavrador.

    ► Algumas escolas, no entanto, tentaram driblar o cerco dos militares. Em 1974, a Unidos de Vila Isabel desenvolveu o tema Aruanã Açu, sobre os índios Carajás. Originalmente, a proposta do enredo exaltava os índios e fazia críticas severas ao progresso desenfreado. O regime fez pressões e a escola teve que transforma o enredo em uma insólita apologia à Transamazônica, rodovia concluída pela ditadura, descartando com isso um lindo samba de Martinho da Vila que denunciava o drama dos indígenas.

    ► Já nos anos 80, a abertura fez com que as escolas embarcassem nas críticas sociais, muitas vezes com irreverência e muita pimenta. Hoje em dia, os temas patrocinados ditam o tom da folia e atrapalham as grandes histórias. Carnavalescos como Rosa Magalhães e Paulo Barros são os principais gritos contra a tendência dos patrocínios castradores, buscando vias alternativas criativas para os enredos.

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