No tempo de escola, o sobrenome ilustre provocava piadas dos colegas. Somado ao clássico conselho dos mais velhos para procurar uma carreira sólida, esse passado de bullying levou Alice Caymmi a reprimir a vocação e fazer vestibular para direito. A aventura acadêmica durou dois semestres, em 2008, e tornou-se apenas uma curiosidade na biografia da artista de 24 anos, integrante da terceira geração de uma família tremendamente musical. Sua mãe, Simone, foi backing vocal na Banda Nova, de Tom Jobim. Danilo, seu pai, é o irmão caçula de Dori e Nana — e os três são os talentosos herdeiros do grande Dorival Caymmi (1914-2008).
No começo de 2014, de maiô e com muitas plumas, Alice deu vistosa contribuição às celebrações em torno do centenário de nascimento do avô à frente do espetáculo Dorivália. Ao vivo, com seu figurino tropicalista, interpretou clássicos do grande compositor baiano sob guitarra e percussão pesadas. “Fiz o show sem cara de velório. A música brasileira sofre de tributos agudos”, diz. O bom ano culminou com o lançamento de Rainha dos Raios. No segundo CD, ela empolgou público e crítica ao condensar referências variadas em estilo bem peculiar — no álbum de estreia, de 2012, já apontava nesse sentido ao gravar Björk (Unravel) e o avô (Sargaço Mar). A interpretação para Homem, faixa do disco novo, conquistou reconhecimento: o troféu de melhor versão, no Prêmio Multishow, e elogios públicos de Caetano Veloso, o autor da canção. Embalada pelo novo repertório, que ainda vai de Maysa (Meu Mundo Caiu) a MC Marcinho (Princesa), a cantora estrela explosivas apresentações ao vivo em roupas de criação própria. “Gosto de me vestir como uma instalação”, conta.
Alice começou cedo — e comportada. Aos 12 anos, foi convidada pela tia a dividir a gravação de Seus Olhos, no disco Desejo. Depois, participou do show de lançamento, no Canecão, e, no Carnaval, soltou a voz adolescente no trio elétrico de Margareth Menezes, em Salvador. Ainda apareceu em apresentações ao lado do pai e cantou na festa de encerramento dos Jogos Pan-Americanos, em 2007. Inquieta, hesitou diante do direito (por pouco tempo, como se sabe) e formou-se em teatro pela PUC. “Fiquei com medo, mas a música sempre foi minha vida”, conclui, com a voz grave dos Caymmi.