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Que movediça que nada: areia perigosa é a que banhistas deixam suja no Rio

Lixo abandonado por frequentadores e fezes de animais contaminam praias cariocas, que oscilam entre “não recomendada” e “regular”

Por Paula Autran
17 fev 2023, 07h00
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A culpa é nossa: lixo deixado nas praias transmite doenças. (iStock/Getty Images)
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O caso de uma banhista que furou o pé ao pisar numa seringa abandonada na areia do Posto 12, no Recreio, reverberou nas redes sociais no início do verão. Diante da possibilidade de o material ter sido descartado por alguém que fez uso de drogas injetáveis, ela precisou se submeter à profilaxia indicada para evitar doenças como HIV e hepatites B e C. A paciente passa bem, mas os perigos à saúde de quem frequenta as praias seguem escondidos na imensidão de grãos. Com os termômetros passando de escaldantes 40 graus e a orla apinhada de gente disputando um lugar ao sol, a qualidade das areias tem se revelado um motivo a mais para esquentar a cabeça. Após três anos, a prefeitura do Rio voltou a realizar análises nos points mais frequentados por cariocas e turistas — e o resultado não é animador: a maioria dos locais pesquisados, 24 pontos distribuídos em dezenove praias, tem oscilado na maior parte do tempo entre o “não recomendado” e o “regular”.

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A análise é baseada na presença de coliformes totais e fecais, incluindo aí a bactéria Escherichia coli, que pode afetar o funcionamento do intestino, da bexiga, dos rins, e ainda ocasionar doenças desde gastrenterite até meningite. Ao contrário do que se imagina, sua aparição nada tem a ver com a poluição do mar. Eles chegam às areias graças às fezes de animais e ao lixo deixado para trás pelos banhistas. “Não adianta a gente se preocupar só com a água em que a pessoa mergulha se ela está sentada numa areia suja”, alerta Sinval Andrade, superintendente da Águas do Rio, empresa responsável pelo esgoto sanitário das zonas Norte e Sul e do Centro. Como a dobradinha mar e areia forma um mesmo ecossistema, a concessionária firmou convênio com a Secretaria municipal do Ambiente e Clima (Smac) e assumiu, em maio passado, a coleta e análise das faixas sob sua alçada.

Controle de segurança: 24 pontos em dezenove praias do Rio são analisados a cada quinze dias -
Controle de segurança: 24 pontos em dezenove praias do Rio são analisados a cada quinze dias – (Águas do Rio/Divulgação)

O monitoramento abrange praias da Ilha do Governador, Paquetá e de toda a extensão do Flamengo até São Conrado. As demais, da Barra em diante, ficaram de fora do convênio. A coleta é feita quinzenalmente, por funcionários que marcam um retângulo de 2 metros por 1 metro em cada local, sempre na porção de areia seca próxima ao mar, onde as pessoas preferem ficar. Eles recolhem então o material de cinco pontos: os quatro vértices e o centro. Aí misturam tudo e compõem a amostra encaminhada para o laboratório de uma empresa credenciada, para as análises bacteriológicas. O material é separado em quatro níveis de qualidade: não recomendada, regular, boa e ótima. A classificação se baseia na concentração de coliformes fecais a cada 100 miligramas — acima de 20 000, a areia é considerada ruim e, a partir de 30 000, não recomendada. Em caso de avaliação negativa, a orientação dos especialistas é que as pessoas evitem o contato direto com a areia em atividades esportivas e recreação infantil e — atenção — usem cangas e cadeiras.

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Apesar de a Comlurb atuar em todos os 56 quilômetros da orla, com 361 garis só nas praias da Zona Sul, todo o esforço nunca será o bastante sem a colaboração dos frequentadores. “É preciso ter educação sanitária, conscientizar as pessoas dos riscos de jogar lixo e comida na areia, assim como o de não recolher as fezes dos animais”, observa a veterinária Ludimila Santos Amaral, doutora em saúde pública pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). A pesquisadora, que já participou de levantamentos sobre a qualidade da areia de praias como as da Baía de Guanabara, lembra que, além das bactérias coliformes presentes nas fezes, há o risco de serem encontrados parasitas e fungos que transmitem zoonoses. Vale registrar que, no Rio, a Lei 6642/2019 permite animais na areia, apesar das recomendações contrárias da Organização Mundial da Saúde (OMS).

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(iStock/Getty Images)
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Neste cenário que pede uma mudança de hábitos, a Secretaria municipal do Meio Ambiente lançou a campanha Areia Carioca, que até março levará a diversas praias uma programação voltada a normas educativas de boa conduta, a fim de incentivar o cuidado e o uso responsável do espaço mais democrático da cidade. Entre as ações está estender um tapete de lona que simula a praia e contém indicações sobre o que é certo e errado fazer não apenas na areia, mas ainda no mar e no calçadão, com apoio e orientação de educadores ambientais. “A população pode contribuir para a limpeza não deixando para trás tampinhas, garrafas e outros objetos que podem provocar acidentes ou se tornar foco do Aedes aegypti, mosquito transmissor das arboviroses, como a dengue, a zika e a chikungunya”, reforça o secretário municipal de Saúde, Daniel Soranz. O dever de casa para os veranistas de plantão, portanto, é tratar bem seu quinhão de areia — e aí, sim, relaxar.

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