Aos 35 anos, a carioca Julia Spadaccini vem colhendo os louros por seu interesse pela psicologia humana. Não exatamente por um trabalho à frente de um divã ou de um hospital psiquiátrico. Comportamentos desviantes, relações familiares problemáticas e traumas não resolvidos lhe servem de inspiração para escrever peças que, por sinal, têm conquistado elogios e reconhecimento. É o caso do drama Aos Domingos, em que dois irmãos se reencontram após seis anos, depois que a mãe morre. Da reunião, acabam emergindo frustrações e rancores guardados. Encenado no início do ano e com reestreia prevista para sexta (23), o texto está entre os finalistas do Prêmio Shell, o principal da categoria. Esta, no entanto, não é a primeira vez que a autora é lembrada pelos jurados da premiação: em 2012, a comédia Quebra Ossos, para a qual criou personagens imersos em questões existenciais, também foi indicada. “Tudo o que crio passa por essas elucubrações. Seria incapaz de escrever algo que não tivesse isso”, diz Julia, que ainda está em cartaz com os espetáculos A Porta da Frente, no Oi Futuro Flamengo, e Um Dia Qualquer, de volta ao circuito desde a semana passada.
Formada em artes cênicas pela Uni-Rio, Julia estreou nos palcos, na verdade, como atriz, ainda na adolescência. A virada profissional só aconteceu anos depois, graças à faculdade de psicologia, mantida em paralelo com a carreira, e ao estágio numa instituição que tratava de doentes graves por meio do teatro. “Comecei a escrever sobre as situações que presenciava ali, até que um amigo viu as anotações e sugeriu que as transformássemos em peça”, lembra. Dos escritos surgiu, em 2004, a montagem de Boeing 737 na Contramão, a primeira da sua elogiada trajetória. “Ela consegue dosar humor e drama como poucos, sempre falando de temas pertinentes ao nosso cotidiano”, avalia Jorge Caetano, diretor e intérprete do crossdresser Sasha em A Porta da Frente, o 18º texto da autora montado em dez anos no circuito teatral carioca. Acostumada a um ritmo intenso de produção, Julia ainda acumula a função de roteirista na série Entre Tapas e Beijos, da Globo. “Além de adorar escrever para a televisão, é uma segurança financeira que me permite escolher os próximos trabalhos que quero fazer como dramaturga”, diz. Difícil vai ser sobrar tempo para a análise.