Aos sábados e domingos, por volta das 11 da manhã, Bernard Rajzman mantém um compromisso religiosamente. Mesmo tendo se curado de um câncer de pele há três anos, o medalhista de prata na Olimpíada de Los Angeles, em 1984, bate ponto na rede de vôlei de praia montada em frente ao condomínio Barramares, na Praia da Barra. Fica ali até por volta das 2 da tarde, mesmo com o sol a pino, disputando em média cinco partidas, em que o ponto alto de sua performance é, invariavelmente, uma invenção sua: o saque jornada nas estrelas. “Comecei a jogar na praia muito jovem, e me dei conta de que, quando a bola alcançava grandes alturas, isso dificultava a recepção dos adversários, que não conseguiam vê-la por causa do sol. Dentro dos ginásios, devido à luz dos refletores, acontecia a mesma coisa. Foi aí que tive a ideia de levar a jogada para as partidas oficiais”, recorda ele, que apresentou o jornada pela primeira vez no Mundialito de 1982, no Maracanãzinho. Entre saques e cortadas, Bernard prepara-se para participar de mais uma Olimpíada, desta vez em um papel bem diferente. Ele será o chefe da missão brasileira na Rio 2016.
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Aos 59 anos, Bernard vai se mudar, em 24 de julho, para um apartamento da Vila Olímpica, onde ficará até o fim dos Jogos a serviço do Comitê Olímpico Brasileiro. Durante esse período, nada de vôlei de praia com os amigos da rede. Diariamente, às 7 da manhã, ele já estará a postos para uma reunião matinal, junto aos outros chefes de missão, na qual apresentará as principais reivindicações dos atletas brasileiros aos representantes do Comitê Olímpico Internacional. “Nosso papel é justamente facilitar a vida dos competidores. Quanto menos problemas eles tiverem com a parte estrutural dos jogos, mais chances terão de alcançar resultados melhores”, explica ele, que repetirá a função já exercida em outras competições, como Londres 2012. Para isso, Bernard estará em contato direto com os chefes das delegações de cada esporte, responsáveis por trazer os problemas ao dirigente. Nos Jogos da Lusofonia de Lisboa, em 2009, por exemplo, um dos atletas da equipe de taekwondo estava com a gripe H1N1, que nunca havia sido diagnosticada em Portugal. Coube a Bernard, como chefe de missão, solucionar a questão: o competidor teve de ser isolado em um hospital, passou por uma quarentena e não pôde competir.
Mesmo tendo encerrado sua carreira como atleta, no início dos anos 90, Bernard nunca deixou o esporte. “Só abandonei o bigode, que estava ficando branco. Careca e de bigode branco, aí também já era demais, né?”, brinca. Depois disso, ele entrou para a política, ocupou o cargo de secretário nacional de Esportes no governo Collor, foi eleito deputado estadual e tornou-se subsecretário estadual dos Jogos Pan-Americanos Rio 2007, sempre defendendo causas ligadas ao esporte. Hoje, ele trabalha como voluntário nos três principais órgãos responsáveis pela realização da Olimpíada — o COB, o Comitê Rio 2016 e o COI. Nesse último, é o único brasileiro com direito a voto. “O Bernard tem uma vasta experiência, tendo começado como atleta e contribuído em inúmeros eventos esportivos no Brasil. Dentro do contexto da Rio 2016, o trabalho do Bernard traz uma dimensão extra para nós, em função de sua grande imagem como ícone do esporte”, afirma Christophe Dubi, diretor de esportes do órgão internacional, do qual Bernard faz parte desde 2013. E, se depender dele, continuará fazendo por um bom tempo, pois a aposentadoria não está nos seus planos.