Aos 17 anos, naquela fase da vida em que o jovem se sente imortal e não está nem aí para o futuro distante, Bruno Wainer decidiu conhecer o Afeganistão. Já havia comprado a passagem quando o início da guerra civil no país frustrou sua aventura. Na época, fim da década de 70, seus pais ? a escritora Danuza Leão e o magnata das comunicações Samuel Wainer ?, preocupados com a falta de rumo do filho, lhe deram um ultimato para abandonar a vida de playboy que levava em Paris e fazer algo produtivo no Brasil. O casal havia retornado de um longo exílio na capital francesa, mas ele permanecera por lá para concluir os estudos e vinha adiando quanto podia o ingresso na vida adulta. Sob pressão, voltou para seu Rio de Janeiro natal, onde a mãe já movera os pauzinhos com os amigos para que ele fosse exercer uma função no cinema. A primeira opção era trabalhar no longa sobre o assassino Chico Picadinho, rodado no presídio do Carandiru, em São Paulo. Detalhes de agenda, no entanto, acabaram por levá-lo para Bye Bye Brazil, o road movie que Cacá Diegues filmou nas estradas do Norte e do Nordeste. A mudança se mostraria decisiva em seu destino. “Acredito que jamais teria seguido no ramo se tivesse feito a fita no Carandiru”, reconhece ele, aos 52 anos. “Mudei de direção várias vezes na carreira, mas dei sempre a sorte de acertar o primeiro passo.” Depois de rodar um bocado por diversas atividades do setor, ele se firmou com a distribuidora Downtown, que hoje domina 70% do mercado de filmes nacionais. Seu feito mais recente se deu com De Pernas pro Ar 2, que no último fim de semana ultrapassou a margem de 3,5 milhões de ingressos vendidos, igualando a ótima marca do primeiro título da franquia.
No comando da empresa, Wainer põe em prática os conhecimentos múltiplos que adquiriu no primeiro estágio da carreira, quando exerceu diversas funções em um set: trabalhou como assistente de direção, continuísta e diretor de produção, até que a Embrafilme foi extinta, em 1990, e a fonte de verbas para o cinema secou. Seus colegas migraram em massa para a publicidade, enquanto ele tratou de aproveitar o que imaginava ser sua despedida do setor. A convite de um amigo, embarcou para o Festival de Cannes, no qual teve contato com um universo novo: a engrenagem comercial que há por trás de uma produção. Entre sessões e coquetéis, conheceu os donos da principal distribuidora francesa, a Lumière, que lhe propuseram, a título de teste, ser o responsável pelo lançamento de um filme no Brasil. Em um ponto totalmente fora da curva da fria trajetória da produção pelo mundo, Delicatessen, de Jean-Pierre Jeunet, atingiu a marca de 200?000 ingressos vendidos por aqui. Aprovado nesse batismo de fogo, acabou sendo escolhido para comandar a filial brasileira da empresa, onde ficou até abrir o próprio negócio, em 2005. Desde então, a Downtown vem ampliando sua participação no mercado. Embora de 2011 para 2012 tenha havido uma queda na venda de ingressos de filmes nacionais de 17,7 milhões para 13,5 milhões, ela, ao contrário, saltou de 7 milhões para 9,5 milhões de bilhetes comercializados.
Para obter êxito como distribuidor, não basta ter faro comercial ou conhecer a fundo a estrutura de salas exibidoras e o gosto do espectador. Também são necessários conhecimento artístico e visão para investir. A participação de Wainer no processo geralmente começa na elaboração do roteiro. Ele detestou, por exemplo, o primeiro texto que leu da comédia De Pernas pro Ar e fez valer sua opinião com o diretor, Roberto Santucci. “Troquei os roteiristas, discutimos o elenco, e o resultado foi um sucesso estrondoso”, afirma o cineasta. Foi dele a ideia de que a personagem de Ingrid Guimarães virasse uma empresária da internet. Assim que leu Meu Nome Não É Johnny, livro de Guilherme Fiúza que conta a história real do ex-traficante carioca João Guilherme Estrella, viu-se diante de uma pepita. Investiu na produção do longa, que amealhou 2,2 milhões de espectadores. De cara, ainda, identificou todo o potencial de Cidade de Deus, que muitos achavam tratar-se de um filme de arte e, como tal, com público limitado.
Casado com a designer Ana França, Bruno Wainer é pai da pequena Beatriz, de 1 ano. Há pouco mais de um mês, tornou-se também avô. O pai da netinha, Maria Eduarda, é o filósofo Pedro, um de seus dois filhos do primeiro casamento ? o outro é o psicólogo Gabriel. Em 2000, saiu de Ipanema e foi morar na Barra, movido pelo objetivo de poder surfar com mais frequência. Ao decidir pela mudança, comprou briga com a mãe, que não esconde de ninguém sua implicância com o bairro da Zona Oeste. Para o futuro, além dos cerca de cinquenta projetos em várias fases de maturação, tem a meta de trocar o nome da empresa. Ao ser apresentado pelo produtor Luiz Carlos Barreto ao ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, como “o homem do cinema brasileiro”, Wainer percebeu que algo não soou bem. “Quando ele ouviu o nome Downtown, senti um sorriso sarcástico”, diz. Mas ainda não decidiu como vai rebatizá-la.