A vida de Henrique Saraiva deu uma guinada abrupta em 1998. Logo depois de completar 18 anos, ele foi atingido por um tiro durante um assalto. Desde então, convive com um projétil alojado na região lombar e usa muletas para se locomover. Até chegar a esse ponto, enfrentou um difícil processo de recuperação, que incluiu seis meses sobre uma cadeira de rodas, uma intensa rotina de exercícios de fisioterapia e muita vontade de voltar a levar uma vida normal. Foi justamente essa ambição que o inspirou a criar um projeto pioneiro de inclusão e acessibilidade. Trata-se da Adaptsurf, ONG que promove e divulga o surfe para portadores de necessidades especiais. As aulas, gratuitas, acontecem nos fins de semana em praias como a da Barra da Tijuca (Posto 2) e a do Leblon (Posto 11) e atendem até sessenta participantes. “Queremos melhorar a qualidade de vida das pessoas com deficiência, devolvendo a elas as oportunidades e o direito de ir e vir, que é universal”, define Saraiva, um apaixonado por esportes.
“Na água somos iguais a todo mundo. O esporte nos dá essa liberdade.”
O incentivo para pôr a ideia em prática veio há seis anos, a partir de uma conversa com o surfista Marcos Sifu, sumidade em aéreos, manobras em que o atleta voa sobre as ondas. Ao ajudar outros em situação semelhante, Saraiva se encontrou. O projeto levou-o a reconquistar a autoestima perdida e resgatou o convívio com os amigos. “Eu largo minhas muletas na areia e, na água, sou como eles. Voltei a viajar e a sair. Hoje tenho uma vida muito mais parecida com a que tinha antes. É essa a liberdade que o deficiente experimenta com o esporte.” Com seis pranchas adaptadas, quatro cadeiras anfíbias e uma esteira especial para a locomoção de cadeirantes, a ONG já devolveu a alegria a centenas de deficientes, mas atingiu seu limite. A chegada de patrocinadores ajudou a reverter os prejuízos que a entidade, administrada com a ajuda dos amigos Luana e Phelipe Nobre, acumulava até o ano passado. O trio ainda procura novos apoios para crescer, mas nada abala a confiança de Saraiva em ver sua iniciativa se alastrar por outras praias. “O Rio é uma cidade conhecida mundialmente pela beleza de suas areias e ondas. Nós vamos democratizar ainda mais esse espaço”, acredita.