Após um processo seletivo aberto que durou quase dois meses, a pesquisadora e curadora autônoma carioca Beatriz Lemos foi escolhida para assumir o cargo de curadora-adjunta do Museu de Arte Moderna do Rio. Beatriz superou entre 139 candidatos de diversos estados. Com mestrado em História Social da Cultura pela PUC-Rio, ela é idealizadora e diretora da plataforma Lastro – Intercâmbios Livres em Arte. A partir de perspectivas anticoloniais, atua na condução e articulação de processos em rede e transdisciplinares de criação e aprendizagem.
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O MAM vem promovendo diversas mudanças institucionais neste ano, pensando na arte como propulsora de mudança na sociedade e mostrando que é possível realizar ações afirmativas em tempos de crise. A curadoria-adjunta tem a responsabilidade de implementar a visão artística e a missão do museu, desenvolvendo exposições e dialogando com as áreas de pesquisa, conservação, educação e formação.
VEJA Rio fez cinco perguntas à nova integrante da equipe do MAM Rio.
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Como foi desbancar tantos concorrentes no processo seletivo?
Prefiro acreditar que processos como esse não se tratam de competição por uma vaga, sobretudo diante desse cenário que vivemos atualmente. Estamos enfrentando um momento bem crítico para a cultura no país. No campo das artes visuais, por exemplo, houve um grande índice de projetos cancelados nos setores públicos e privados, além de profissionais sendo dispensados de cargos institucionais nas áreas de curadoria e educação. A junção da pandemia e das diretrizes do atual governo intensifica pulsões de morte e medo, bem como a escassez, historicamente autorizada, de chamadas abertas como essa que foi promovida pelo MAM Rio.
O Museu de Arte Moderna vem mudando a forma de gestão e pensando as pluralidades tanto da arte quanto do Rio de Janeiro. Quais são seus desafios nesse sentido ao assumir o cargo?
Me sinto contemplada em somar nas intenções de mudanças que vêm sendo elaboradas pela atual gestão do museu, priorizando os movimentos que operam na quebra das estruturas de poder solidificadas em modos de pensar e fazer arte baseados no controle dos corpos e que compactuam com a exclusão. Entendo que esses desafios são compartilhados por toda a equipe. Precisamos perfurar processos institucionais já gastos, alimentados por parâmetros ocidentalizantes de neutralidade.
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O que representa viver de arte num país que vem vilipendiando a cultura?
Atuar na área da cultura, um setor marcado pelas diretrizes de classe e pela precarização do trabalho, sempre foi caminhar na contradição. Assim, como única sobrevivência possível, acredito que a prática curatorial pode redesenhar mundos e incentivar a autonomia. Busco uma perspectiva de atuação em cultura que tenha como base conceitual a condução de práticas de aprendizagem e educação como potências radicais de expansão crítica e autoconhecimento.
Quais artistas plásticos cariocas são referência para você atualmente?
Tenho acompanhado Vitoria Cribb, Mulambo, Rastros de Diogenes e Pedro Vitor Brandão. Mas gosto de pensar arte para além das ficções dos territórios, então também prefiro citar aqui produções que possam dialogar com o que entendemos por cidade do Rio de Janeiro ou cultura carioca, como os trabalhos de Castiel Vitorino Brasileiro, Ventura Profana, Denilson Baniwa e Luana Vitra.
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Quais exposições você sonha em desenvolver no MAM?
Mais do que exposições pontuais, desejo estar num museu aberto paras as variadas releituras anticoloniais de seus acervos e sua arquitetura em relação ao entorno. O MAM é um lugar para o estudo crítico das políticas de representação, arquivo e memória. Me interesso principalmente em ver um museu que não se satisfaça com as narrativas únicas de Brasil ou de América Latina, que reúna perspectivas pautadas em vocabulários afroindígenas, ecologias dissidentes e genealogias antipatriarcais.