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Os desafios em reaproximar craques da seleção e torcedores

Distância dos convocados acentua a conexão prioritária dos cariocas com o time do peito, observam pesquisadores como o sociólogo Ronaldo Helal

Por Amanda Tauil, Camila Perecmanis e Maria Luisa Resende*
27 jul 2022, 09h19
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  • Ecoada entre os cariocas, a relação visceral com a seleção de futebol levou o escritor Nelson Rodrigues a chamá-la de pátria de chuteiras. O célebre epíteto se consagrou com os cinco títulos mundial, especialmente os conquistados entre 1958, o primeiro, e 1970, o mais icônico. Pesquisadores como os sociólogos Ronaldo Helal e Antônio Jorge Soares identificam, contudo, que a tal relação, tão simbólica no “país do futebol”, esfriou. Passou a se intensificar só em tempos de Copa. Assim se espera no Mundial deste ano, no Catar, com uma corrente em busca do hexa. 

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    A Confederação Brasileira de Futebol reconhece o desafio de reaquecer os laços entre os torcedores e a seleção, fortalecê-los para além da Copa. Recorre às redes sociais e plataformas digitais para aproximá-los, uma vez que a maioria dos jogadores e dos jogos da equipe concentra-se no exterior.

    Dos 23 selecionados pelo técnico Tite na penúltima lista antes da convocação para a Copa do Catar, só quatro jogam no Brasil. Iniciado nos anos 1990, o predomínio estrangeiro tem se acentuado desde 2002. Para analistas, constitui um dos fatores que supostamente arrefeceram a relação dos brasileiros com o escrete nacional.    

    Para compensar a distância entre os astros da seleção e os clubes e estádios nacionais, a CBF tem investido nos meios digitais. O coordenador de Mídias da Confederação, Lucas Varidel, ressalta que a produção crescente de conteúdos nas redes sociais busca intensificar a relação com o público. Parcerias com influenciadores, filmagens de bastidores e ações com o mascote Canarinho têm sido algumas dessas tentativas de aproximação. 

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    Talvez ainda seja cedo para avaliar se tais iniciativas corresponderão ao desejado. Por ora, percebe-se, ao menos entre torcedores cariocas, uma distância significativa entre as conexões com o clube do peito e com a seleção.

    “Vibro mais com o meu clube, o Flamengo. Ele joga aqui com muito mais frequência. Consigo acompanhá-lo melhor, vê-lo no estádio. Isso faz diferença. Além disso, tem a questão familiar: minha família inteira é flamenguista e me influenciou a torcer para esse time”, conta o estudante Gabriel Dias, de 19 anos.

    Embora grande parte dos torcedores acompanhe, sobretudo por meios digitais, os principais campeonatos europeus, nos quais atuam a maioria dos jogadores da seleção, pesquisadores da área consideram importante a proximidade local para criar ou fortalecer o vínculo com a Canarinho.

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    “Hoje a seleção entra em campo com jogadores que você nunca viu jogar. Isso ajuda a esfriar a relação entre os torcedores e a seleção”, acredita o sociólogo e pesquisador Ronaldo Helal, autor de “A invenção do país do futebol” e “O declínio da Pátria de Chuteiras: futebol, imprensa e identidade nacional na Copa do Mundo de 2002”, entre inúmeras publicações relacionadas ao universo futebolístico. 

    Helal pondera, no entanto, que jogadores e ex-jogadores de times cariocas na seleção transferem uma boa parcela do afeto dos torcedores dos clubes para o escrete nacional. Por outro lado, quando os jogadores já detêm uma longa carreira internacional, fica mais difícil estabelecer uma conexão efetiva com a torcida verde-amarela. 

    O calendário asfixiante do futebol também pode prejudicar o apego à seleção. Em meio a competições nacionais e internacionais, clubes como Flamengo e Palmeiras ficam desfalcados de jogadores convocados. Para torcedores, o orgulho de ver um protagonista do seu time vestir a amarelinha é arranhado pela preocupação de perdê-lo em um ou dos jogos importantes da equipe do coração.

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    O atacante do Flamengo Gabriel Barbosa, por exemplo, perdeu diversos jogos do clube por causa de convocações. Esse é mais um fator que pode estremecer o relacionamento do torcedor com a seleção, que passa a ser considerada uma ameaça ao desempenho do time do peito. 

    Outro aspecto que contribui para supostamente enfraquecer o magnetismo da seleção refere-se, segundo torcedores, a uma queda na qualidade dos confrontos com outras seleções. O Brasil raramente tem enfrentado adversários fortes e relevantes, nas Eliminatórias, na Copa América, em amistosos. Consequentemente, os jogos não são tão empolgantes quanto se espera. Às vezes, até os do Mundial decepcionam 

    “Na minha época, a Copa do Mundo era mais interessante. Hoje, não tenho mais a mesma sensação. Meus netos, por exemplo, querem muito mais que o Vasco suba para a Série A do que o Brasil ganhe a Copa do Catar”, compara o vascaíno Celso Oliveira, de 76 anos.

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    Ainda assim, a seleção é revestida de uma força simbólica capaz de cultivar um elo potente com cariocas e brasileiros em geral. Embora tenha fracassado a tentativa, em 2013, de criar uma torcida organizada do Brasil, a Canarinho ainda mobiliza milhões de fãs.

    A goleada sobre o Chile (4 a 0), em março, no Maracanã, reuniu quase 70 mil espectadores. Gritos de apoio à seleção misturavam-se a canções entoadas por rubro-negros e vascaínos para os seus respectivos times. Um retrato da dualidade vivida pelos torcedores entre a seleção, emblema do país culturalmente imaginado, e o clube do coração, cuja paixão tende a ser preponderante.

    * Amanda Tauil, Camila Perecmanis e Maria Luisa Resende, estudantes de Jornalismo da PUC-Rio, com orientação de professores da universidade e revisão final de Veja Rio.

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