Pelo menos duas vezes por mês, a carioca Ana Paula Carneiro, 34 anos, viaja para o exterior a trabalho. Na semana passada, embarcou para a Espanha. Em maio, segue rumo a Israel e aos Estados Unidos. Lá fora, ela é atração de badaladas casas noturnas e das “gigs”, como são chamadas as concorridas festas de música eletrônica. Nessas andanças, já fez tabelinha nos pickups com astros do calibre do holandês Tiësto e do francês David Guetta. Sua trajetória guarda semelhança com o percurso de outras duas DJs da cidade. Mary Zander, 33 anos, e Mary Olivetti, 27, também conquistam prestígio, inflam seus cachês a um patamar antes impensável e constroem uma sólida carreira internacional. Dividida entre a vida de DJ e a de modelo com diversas campanhas publicitárias de porte no currículo, Mary Zander está escalada para o Rock in Rio. Ela passou a maior parte de 2010 em Londres. De segunda a sexta, dedicava-se a um curso de história da arte. Nos fins de semana, sacudia alguns dos clubes europeus de grande afluência. Com Ana Paula não tem sido diferente. Para administrar sua agenda atribulada, montou uma equipe no exterior. Tem um manager e uma secretária no Canadá, um booker na Europa e outro nos Estados Unidos. Estima-se que seu cachê esteja na faixa de 10 000 dólares. “A paixão pelo ritmo vem desde pequena”, revela a moça. “Minha mãe conta que qualquer melodia me fazia dançar.”
Para brilharem como fazem atualmente, todas elas precisaram romper a barreira do gênero ? não exatamente musical. É que o universo da discotecagem tem predomínio masculino. Na lista dos 100 melhores do mundo segundo a DJMag, publicação que é referência no assunto, figura apenas uma mulher, a romena Claudia Cazacu, e ainda assim na 93ª colocação. Mary Olivetti arrisca uma explicação. “Os grandes disc-jockeys são também produtores. Por isso, eles prevalecem”, diz. De fato, os profissionais mais bem-sucedidos exercem essa dupla função, como é o caso de David Guetta, que já fez parcerias com a cantora Rihanna e o grupo Black Eyed Peas. A possibilidade de penetrar no mundo do showbiz e a chance de pôr legiões para dançar, no entanto, são as faces glamourosas da profissão. Em contrapartida, trata-se de uma atividade extremamente desgastante, cuja jornada de trabalho vara a madrugada. Quando não estão nas pistas, Ana Paula e as Marys passam boa parte do dia, e às vezes da noite, pesquisando e colhendo novas sonoridades. Para armazenar todos os seus arquivos, Ana Paula dispõe de três laptops e três HDs externos. Há muito perdeu a conta da quantidade de canções em seu acervo digital, um arsenal reforçado pela coleção de CDs e discos de vinil. “Quem mora perto de mim vive reclamando do barulho. É o meu carma”, conta. Carma dela ou dos vizinhos?
Além da vocação para agitar as pistas e do ótimo momento profissional, o trio tem outras peculiaridades em comum. Todas elas deram os primeiros passos na juventude, começaram botando som na festa de amigos e evoluíram na prática. Com muita cara de pau para bisbilhotar discotecários em ação, aprenderam a manusear os equipamentos de som e assim puderam desenvolver um estilo próprio. Mary Olivetti levou uma vantagem: fez seu bê-á-bá rítmico dentro de casa. Filha do compositor e arranjador Lincoln Olivetti, que tem serviços prestados a Rita Lee, Roberto Carlos, Caetano Veloso e Tim Maia, ela cresceu no estúdio do pai. Começou a mixar quando tinha 18 anos e teve a feliz ideia de gravar um CD para tocar na butique onde trabalhava como vendedora. A trilha chamou a atenção das clientes, ganhou divulgação espontânea, e em pouco tempo ela era contratada para ser residente numa boate do Leblon. De lá para cá, vem recebendo diversos convites para animar festivais aqui e no exterior. Mary Olivetti está casada com o DJ Memê, que, tal como a mulher, é um dos bambas da vertente house no país. Com o cotidiano abarrotado de compromissos, o casal passa a maior parte do tempo namorando pelo Skype. “Ele tem os shows dele, e eu, os meus”, justifica. “Acontece com frequência de nos encontrarmos no aeroporto.” Não é mesmo fácil ganhar a vida com o suor alheio. É preciso também se mexer um bocado.