Das instalações olímpicas, novas ou adaptadas, que se ergueram (e ainda se erguem) no Rio nos últimos anos, o Engenhão é considerado por muita gente o patinho feio da história. Ele não tem a tradição nem o gigantismo do remodelado Maracanã, palco das cerimônias de abertura e encerramento dos Jogos, tampouco conta com os holofotes do Parque Olímpico, que surge imponente na Barra. Em 2013, foi interditado por problemas estruturais em sua cobertura. Recentemente ainda sofreu certa crise de identidade: chamava-se João Havelange, virou Nilton Santos, ídolo do Botafogo. Porém, ao que parece, o mau tempo ali está acabando. Custou a acontecer, mas agora o estádio ganha os últimos retoques para receber as provas de atletismo. E aqui vem o melhor: não apenas arquibancadas e campo estão renovados, mas todo o entorno passa por revitalização. É o tal legado chegando a olhos vistos.
Fotos aéreas da região já conseguem revelar o tamanho das mudanças. Formando um quadrilátero quase perfeito ao redor do estádio, as ruas das Oficinas, Doutor Padilha, Arquias Cordeiro e José dos Reis estão com obras de drenagem, enterramento de fios, revestimento asfáltico e de mudança na iluminação. Trata-se de benfeitorias reivindicadas há tempos pelos moradores, que desde a abertura do Engenhão, em 2007 (para servir ao Pan do Rio), testemunharam abrupto aumento de circulação nessas vias, além de maior incidência de assaltos. A visão lá de cima também mostra que está ficando pronta a Praça do Trem, projetada para ser a maior área de lazer do bairro. Há ainda a Nave do Conhecimento, que está sendo concluída, e, a passos largos, dá-se a reforma da Estação Engenho de Dentro da SuperVia, que terá sua capacidade ampliada dos atuais 28 000 passageiros por hora para cerca de 40 000.
Aos poucos, a rotina nas cercanias do estádio vem se modificando. Perto do portão da ala leste, o professor de educação física Felipe Puell treina todas as manhãs seus alunos, em circuitos semelhantes aos que se popularizaram nas areias das praias cariocas. “Os espaços de lazer nesta região são muito raros”, diz ele, festejando a criação da Praça do Trem, dona de longa história.
No fim do século XIX, com a expansão da Ferrovia Dom Pedro II, construiu-se na área hoje ocupada pelo Engenhão um complexo para a manutenção de trens. Inauguradas em 1871, as Oficinas de Locomoção se mantiveram em atividade até 2003. A partir de 2014, o lugar começou a tomar nova forma. Ali haverá ciclovias, uma centena de árvores e iluminação de LED, num investimento de 35 milhões de reais. Em dezembro, a praça ficará pronta. Durante os Jogos Olímpicos, ela funcionará como uma área de convivência. Depois, receberá mobiliário urbano. “Com aparelhos de ginástica, vai virar um grande playground”, promete Alexandre Pinto, da Secretaria Municipal de Obras.
+ Inscrições abertas para carregar a tocha olímpica
Com o previsível aumento de pessoas passando pelo local, a pé ou de carro, vão-se tomando providências para evitar o caos. Há dois anos surgiu o Viaduto Jornalista Armando Nogueira, que liga a Rua das Oficinas à Rua da Abolição e à Linha Amarela. E uma reforma está em curso na estação ferroviária ali em frente. Orçada em 45 milhões de reais e com promessa de entrega em abril de 2016, a obra consiste na construção de um novo mezanino para o desembarque e a instalação de acessos, com rampas, escadas rolantes e elevadores. “Será totalmente acessível”, diz Carlos Roberto Osório, secretário estadual de Transporte. Além disso, 34 vias foram incluídas num programa urbanístico que refaz calçadas e meios-fios, obra toda enfeitada com tijolos vermelhos, considerados pelos técnicos da prefeitura mais resistentes que as tradicionais pedras portuguesas. Está ficando bonito, diferente. Agora, a esperança dos moradores de Engenho de Dentro, e do Rio em geral, é que essas transformações feitas no bairro não se apaguem junto com a chama olímpica.