A advogada carioca Daniela Wanderley, 29 anos, ainda sonhava com a maternidade quando começou a traçar um roteiro para adquirir o enxoval do bebê. Moradora da Barra da Tijuca, ela bolou, com a ajuda de amigas e primas, um percurso com dezenas de lojas que vendiam todo tipo de produtos para recém-nascidos. Curiosamente, o endereço mais perto incluído na lista ficava a cerca de 7?000 quilômetros da Praia do Pepê. Seu projeto era fazer todas as compras em Miami, o que de fato aconteceu. Ao entrar no quarto mês de gravidez, ela embarcou com o marido para a Flórida. Depois de seis dias dedicados exclusivamente a bater pernas por lá, o casal retornou ao Rio de Janeiro com a bagagem abarrotada: babá eletrônica com vídeo, termômetro de última geração, mamadeiras e chupetas aos montes, além de roupinhas das grifes Carter?s e Ralph Lauren, entre outros objetos. ?A Julia já tem o guarda-roupa completo até seu primeiro aniversário?, conta Daniela, atualmente no sétimo mês de gestação. Ela desembolsou 8?000 reais na brincadeira. Para montar um kit parecido aqui no Brasil, calcula que gastaria mais que o dobro. ?Só a economia feita com a aquisição do carrinho de bebê foi o suficiente para pagar a viagem.?
Não se trata de um caso isolado. É crescente o número de gestantes e mães de pequeninos que optam por viajar para o exterior na hora de montar o enxoval ou renovar o guarda-roupa dos filhos. Essa escolha deve-se a um alinhamento de fatores. Entre eles, a valorização do real, as passagens aéreas com desconto se compradas com antecedência e, fundamentalmente, a disparada frenética de preços no Brasil, algo facilmente constatável, seja no mercado imobiliário, numa lanchonete ou numa loja de apetrechos infantis. Disparidade que leva uma peça a custar até quatro vezes menos se adquirida lá fora (veja o quadro abaixo). Outro ponto destacado pelas turistas de consumo é a qualidade dos produtos importados. Graças a essa conjunção de motivos, somados ao vigor econômico do país, o movimento de brasileiros nos Estados Unidos foi recorde no ano passado. De acordo com a US Travel, associação de turismo americana, quase 1,2 milhão de brasileiros visitaram os EUA em 2010, um aumento de 40% em relação à temporada anterior. Só o estado da Flórida, onde fica o parque temático da Disney e as cidades de Miami e Orlando, sedutores centros de compras, recebeu no período 550?000 brasileiros, que gastaram, em média, 4?900 dólares per capita.
[—FI—]
Em sua varredura para pinçar bons negócios, o radar do mercado detectou o movimento e tenta suprir a demanda. De olho nesse tipo de viajante mais afeito às vitrines, as agências de viagem já oferecem passeios batizados de ?tour de compras?, com programação dedicada exclusivamente à peregrinação por shoppings e outlets. Maior operadora de turismo do país, a CVC lançou recentemente pacotes direcionados a quem quer torrar dinheiro nas lojas. Além de Miami e Nova York, a empresa oferece roteiros para Buenos Aires e Dubai, nos Emirados Árabes. O mais barato é para Miami, a 1?600 dólares. O negócio mostrou-se próspero. De abril para cá, houve um salto de quarenta para 900 pacotes desse gênero vendidos mensalmente. ?Até novembro, está quase tudo esgotado?, diz o gerente João Torisco.
Para facilitar a vida das mães de primeira viagem, é possível encontrar na internet dicas de produtos e de lojas nos Estados Unidos. Radicada em Miami, a economista brasileira Priscila Goldenberg mantém um site (www.enxovaldomeubebe.com) em que oferece dois tipos de serviço às gestantes. Ela pode acompanhar as viajantes em seu tour comercial pela cidade americana ou fazer as compras por encomenda. Nesse caso, ela envia às clientes fotos pelo celular para se certificar de que aquele é realmente o objeto desejado. ?Ela ficava on-line o tempo todo e eu ia acompanhando?, conta a publicitária Roberta Pochettini, mãe de gêmeos de 1 mês, que, por prescrição médica, não pôde viajar durante a gravidez. No final, seu pai foi buscar os dois enxovais, pois Priscila não despacha as mercadorias para o Brasil. Ao todo, a publicitária gastou 7?000 reais. ?Aqui, seria no mínimo o dobro?, estima Roberta. Vale ressaltar que o limite para a aquisição de produtos no exterior é de 500 dólares por pessoa. O valor excedente, caso declarado voluntariamente na Alfândega, sofre uma taxação de 50%. Do contrário, ainda incide uma multa de mais 50%. Nada que pareça afugentar as consumidoras daqui. Mãe de Isabela, 1 ano e 8 meses, e de Gabriel, 10, a advogada Jessica Bubman não compra mais roupas para os meninos no Rio. Pelo menos uma vez por ano ela embarca para os Estados Unidos a fim de abastecer o armário dos pimpolhos. ?Confesso que achava frescura?, assume. ?Mas não tem comparação. Lá é tudo mais barato mesmo.?