O Dia das Mães foi inesquecível para quem mora no começo da Rua Barão da Torre, em Ipanema. Naquele 11 de maio, duas crateras de 5 metros de diâmetro desabrocharam na calçada em frente aos números 137 e 138, acompanhadas de tremores e rachaduras em alguns dos prédios vizinhos. Sobressaltado com o cenário desastroso que se formou, um grupo de moradores buscou informações no consórcio responsável pela obra do metrô naquele trecho, constituído pelas empreiteiras Odebrecht, Queiroz Galvão e Carioca Engenharia. As empresas reconheceram o contratempo e revelaram que blocos de rocha se desprenderam durante a abertura do túnel no subsolo, causando um assentamento do terreno que, num efeito dominó, chegou até a superfície e abriu as fendas. Foi montada, então, uma força-tarefa para reiniciar a obra com segurança e o mais rapidamente possível. A previsão era que em dois meses a perfuração seria retomada. No entanto, mais de 100 dias depois, a operação continua estagnada. No informe mais recente, o consórcio estabelece agora o fim de setembro como prazo para que a Tunnel Boring Machine, imensa máquina mais conhecida como tatuzão, seja reativada e volte ao trabalho. “A falta de informação e transparência só aumenta a nossa apreensão”, queixa-se a aposentada Carla Portilho, moradora da área.
Uma intervenção feita no subterrâneo, longe dos olhos da população, é um terreno fértil para gerar desconfiança e rumores de todos os tipos. Numa obra do porte da extensão do metrô em Ipanema, de alta complexidade, os percalços não chegam a ser tão surpreendentes assim, salvo quando envoltos em mistério. Como agravante, o perfil geológico da faixa subterrânea entre a Lagoa Rodrigo de Freitas e a praia é particularmente difícil de trabalhar (veja o quadro). Ao contrário das características do trajeto do metrô em Copacabana, também próximo ao mar, o subsolo em Ipanema revela-se heterogêneo. Até pouco depois da Rua Teixeira de Melo, no sentido Leblon, é formado pela mesma rocha do Morro do Cantagalo. Dali em diante, predomina a areia. O problema é que há uma faixa de transição onde se encontram blocos de pedra e argila, mais suscetíveis a deslocamentos. A solução encontrada foi injetar calda de cimento nessa zona indefinida para obter coesão, mas não deu certo. Agora, os responsáveis pela obra recorrem a outros materiais para compactar o solo e evitar deslizamentos nas profundezas. “Só recomeçaremos as escavações quando estivermos 100% seguros de que não há risco. Nosso compromisso não é com datas, é com a segurança”, afirma Aluísio Coutinho, gerente de produção do consórcio Linha 4 Sul.
Um dos argumentos de quem defendia a manutenção do trajeto inicialmente planejado para a Barra da Tijuca, que passava por Botafogo, Humaitá e Jardim Botânico em vez de Ipanema e Leblon, era a facilidade de escavar naquela região, mais distante do litoral. “O solo no trecho mais próximo à praia é de restinga. Cavar ali tão perto da superfície é uma temeridade. Não há espaço de folga para nenhum imprevisto”, alerta o geólogo Newton Carvalho, conselheiro da Fundação Geo-Rio. No entanto, para Marcos Vidigal, diretor do consórcio, as críticas carecem de fundamentos técnicos e, dependendo do caso, têm viés político. “Já ouvi muita gente dizendo que nós fazemos tudo errado, mas é gente que fala de orelhada, sem acesso aos nossos estudos”, rebate.
Sensível à preocupação de especialistas e moradores, o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro foi o primeiro a agir. Requisitou uma série de documentos ao consórcio e os encaminhou ao Grupo de Apoio Técnico Especializado (Gate), órgão interno da instituição, e à Defesa Civil. Em outra frente, a Sociedade dos Engenheiros e Arquitetos do Estado do Rio de Janeiro e o Clube de Engenharia realizaram encontros de seus associados para discutir a obra, mas o consórcio, apesar de convidado, não mandou representantes. A alegação é que há outros canais oficiais para manifestar sua posição e que a porta da empresa está permanentemente aberta para quem busca esclarecimentos. O consórcio teve a mesma postura em iniciativas similares organizadas por associações de moradores preocupadas com a intervenção em seu bairro. “Temos mil e um questionamentos, mas não aparece ninguém para responder. É mais fácil conseguir informação com os operários do que com os representantes oficiais”, reclama a líder comunitária Ignês Barreto, coordenadora do Projeto de Segurança de Ipanema (PSI). Que a poeira se assente e o problema seja resolvido da melhor maneira possível, com segurança para moradores, trabalhadores e pedestres.