A última e formidável ressaca que devastou e destruiu grande parte da Avenida Beira-Mar merece considerações especiais que não posso deixar de fazer.” Assim começava a crônica “A revolta do mar”, publicada pelo escritor Lima Barreto na revista Careta, em 1921. Quase um século depois, outra “formidável ressaca” se abateu sobre a orla carioca, mas, ainda bem, os danos foram poucos. A Ciclovia Tim Maia — que, nunca é demais lembrar, em abril de 2016 teve um trecho destruído pela força das águas, levando à morte dois cidadãos que por ela passeavam — desta vez foi devidamente interditada. No domingo 13, pelo menos uma embarcação desgovernada acabou nas areias poluídas da Enseada de Botafogo e, na Praia do Flamengo (bem perto da velha Avenida Beira-Mar), a costa ficou repleta de pedras, lixo e areia. De olho no mar revolto, o surfista profissional Marcelo Trekinho tratou de aproveitar o momento único e fez suas manobras em plena Baía de Guanabara. Em Copacabana, lugar das maiores ondas registradas, com até 4,5 metros, as pranchas tomaram conta do Posto 6. Banhistas menos preparados também decidiram enfrentar a natureza em fúria e deram trabalho ao Corpo de Bombeiros: em todo o fim de semana foram feitos 57 salvamentos. Visto de distância segura, o fenômeno é uma beleza. A prefeitura recomenda às pessoas que, nos dias de ressaca, evitem mirantes e pontos mais próximos da água, cuidado bastante sensato. Afinal, como lembra Lima Barreto no final de sua crônica, o mar costuma cobrar o que é seu. “De há muito que ele havia marcado os seus limites com a terra; de há muito que ele dissera a esta: o teu domínio para aí e daí não passarás”, escreveu o autor de Triste Fim de Policarpo Quaresma.