Na última edição do Rock in Rio, encerrada há duas semanas, nenhuma noite foi tão concorrida quanto a de sábado (26). O motivo para tanto alvoroço basicamente se resumia à curiosidade em torno dos shows de dois artistas: Sam Smith e Rihanna. O primeiro, um inglês de 23 anos, desembarcou com uma bagagem de quatro prêmios Grammy recebidos dias antes e logo depois de ter emplacado a canção título do novo filme de 007. Já a moça nascida na ilha caribenha de Barbados pisou no Brasil alçada ao posto de estrela de primeira grandeza da música pop. Protegidos por esquemas de segurança inexpugnáveis, eles acabaram flagrados em algumas situações pitorescas, daquelas que fazem a delícia dos fãs. O jovem cantor britânico, por exemplo, foi filmado completamente tonto em meio a admiradores que o agarravam e apalpavam no cercadinho vip do festival. Já Rihanna apareceu dando gritinhos histéricos enquanto topava com um grupo de amigos nos bastidores, assim que ela desceu do palco. Em outro momento, os dois se encontram, trocam beijos e abraços e confessam admiração mútua. As cenas foram registradas por Bruno Rocha, jornalista, 29 anos, nascido em Brasília e morador do Rio desde 2010. Pouco conhecido pelo nome de batismo, ele provoca frisson quando assume seu pseudônimo: Hugo Gloss, blogueiro e palpiteiro-mor do mundo das celebridades nas redes sociais. Juntos, os registros de Smith e Rihanna, divulgados em tempo real no perfil que leva o nome de Gloss no Instagram, renderam mais de 1 milhão de curtidas. Notáveis por sua estrondosa repercussão, os microvídeos de quinze segundos são um feito impressionante. Divertidos e irreverentes, dão a impressão de proximidade e espontaneidade que só alguém muito íntimo dos pop stars poderia capturar.
Bem relacionado, Bruno trafega com desenvoltura por espaços que os simples mortais, mesmo aqueles que se julgam vips, raramente costumam pisar. No Rock in Rio, por exemplo, circulava pelo backstage e pelo local onde apenas os artistas e seu entourage costumavam ficar. Além disso, foi um dos poucos privilegiados a conseguir uma pulseira especial concedida pela organização para permanecer nesse território durante o show dos maiores medalhões desta temporada. “Muitas vezes sou convidado justamente para estar nesses lugares, pois as pessoas esperam de mim coisas exclusivas, diferentes. No caso da Rihanna, deixei todos os meus conhecidos de sobreaviso para qualquer chance de estar perto dela. E deu certo”, explica.Semanas antes do Rock in Rio, Bruno esteve em Los Angeles para participar da cerimônia de entrega do Emmy Awards 2015, o Oscar da televisão americana. Na capital da indústria cinematográfica, circulou pelo Microsoft Theatre, onde ocorreu a premiação, pelo jantar de gala e pela festa oferecida pelo canal pago HBO, tudo a convite do Warner Channel, que transmitiu o evento para o Brasil. Incorporando o venenoso Hugo Gloss e munido de um smartphone, seu principal instrumento de trabalho, ele comentou nas redes sociais a roupa das estrelas presentes — “O povo de Orange tá precisando de um stylist”, disparou sobre as atrizes da série Orange Is the New Black; “Jamie Lee foi de gótica rycah”, referência à veterana Jamie Lee Curtis; “Heidi Klum chegou de Garibaldo”, mandou contra a ex-modelo alemã. Mas também houve espaço para a tietagem explícita. No Snapchat, aplicativo que mostra vídeos de até dez segundos, anunciou: “Gente, agora é hora de fazer umas selfies”, enquanto se dirigia para abordar a cantora Lady Gaga e fazer uma foto a seu lado. Valeu a cara de pau: seu registro alcançou 200 000 curtidas, quase quatro vezes mais que a média das fotos que publica. “O Hugo Gloss é hoje uma figura com enorme poder de influência nas redes sociais, importantíssimo para fazer a ponte entre as transmissões de TV e os comentários em tempo real na internet a respeito dos programas”, resume Rogério Gallo, vice-presidente dos canais de filmes e séries da Turner International do Brasil, uma das empresas do grupo Warner.
A trajetória de Bruno nas redes sociais começou sem grandes ambições, há oito anos. Na ocasião, ele morava na Espanha, onde cursava um mestrado em relações públicas na Universidade Autónoma de Barcelona, após ter-se formado em letras e jornalismo no Brasil. Naquela época, o Twitter engatinhava por aqui, e ele passou a usar a ferramenta para comentar a vida das celebridades que estavam em evidência, com tiradas sarcásticas e bem-humoradas. Inspirado em um personagem do programa Pânico na TV, o Christian Pior (uma piada em cima da marca Christian Dior), criou Hugo Gloss (brincadeira com a grife masculina alemã Hugo Boss). Em 2010, já morando no Rio, tomou coragem e mandou uma mensagem para Luciano Huck, que era um dos seguidores do seu personagem. Foi, então, convidado pelo apresentador para conhecer o estúdio onde era gravado o Caldeirão do Huck. Vidrado em televisão e fã assumido da atração, ele demonstrou um vasto conhecimento da história do programa e recebeu o convite para assumir o posto de redator, que ocupa desde então. Ali sua tarefa é produzir matérias especiais, escrever roteiros e, eventualmente, acompanhar o apresentador em viagens com a equipe. “O Bruno é um cara inteligente, fiel e com um olhar democrático que contribui muito na mistura do Caldeirão”, elogia Huck, fã assumido também de seu personagem na internet. “O Hugo Gloss, por sua vez, tem um humor rápido, crítico e ácido. Gosto de ambos.
Ele é um caso raro de sucesso rápido que não subiu à cabeça, apenas ampliou seu universo”, enaltece o patrão.Manter separadas as personas do funcionário bem-comportado (Bruno) e do blogueiro tresloucado sem papas na língua (Hugo) parecia ser a solução ideal para resolver um conflito inerente a quem se propõe a detonar celebridades na internet e ao mesmo tempo trabalha na maior emissora de TV do país. Na prática as coisas não foram tão simples assim. Logo que chegou ao Projac, Bruno levou uma chamada por publicar uma conversa que as atrizes Lília Cabral e Adriana Birolli mantinham à mesa no bandejão do Projac. Sentadas próximo a Bruno, ambas comentavam os problemas de audiência da novela Viver a Vida. Rápido, ele imediatamente digitou uma nota no celular e colocou o conteúdo do desabafo na internet. A história se espalhou instantaneamente em sites de notícias de celebridades. Avisada por um amigo em questão de minutos, Lília se levantou e foi tirar satisfação com o blogueiro, criando um barraco no refeitório. Desde então, Bruno aprendeu que precisa domar Hugo, mas também não pode deixá-lo bonzinho demais, sob pena de tornar-se submisso e sem graça. Um sinal de que encontrou o ponto de equilíbrio foi sua cobertura da novela Verdades Secretas, encerrada há duas semanas. Todos os dias, Hugo publicava um resumo de cada capítulo e comentava as cenas ao vivo, batizando os personagens com apelidos impagáveis. Alex, vivido por Rodrigo Lombardi, virou “Raj Grey”, mistura de Raj, personagem do ator na novela Caminho das Índias, com Christian Grey, o protagonista do best-seller Cinquenta Tons de Cinza. Já Grazi Massafera, que fazia uma viciada em crack, virou “Grazi Winehouse”, em homenagem à cantora Amy Winehouse. Só no Snapchat, ele chegava a ter 500 000 visualizações diárias. “O Bruno conseguiu fazer a convergência entre internet e novela de uma forma muito inteligente”, elogia o autor Walcyr Carrasco. “Ele descobriu um novo canal, com um trabalho pessoal e de grande qualidade de humor.”No universo virtual, é fundamental estar atento às ferramentas que surgem e adaptar-se a elas. Isso, sem dúvida, é um dos fatores que fazem com que Hugo Gloss se mantenha em alta na preferência de seus seguidores. Com perfis no Facebook, Twitter, Instagram, Snapchat e Periscope, além do seu site pessoal, que recebe 10 milhões de visitantes por mês, ele criou uma linguagem para cada plataforma. “Poucas pessoas vão bem em tantas redes sociais simultaneamente. Ele redige textos diferentes para cada um desses meios”, explica Rafael Coca, sócio da empresa Spark Inc, especializada em ativação de marcas na internet.
Com essas frentes abertas, Bruno conta com uma equipe de quatro pessoas, que o ajudam a administrar as ferramentas e negociar inserções de publicidade, os chamados publiposts, a maior fonte de renda dessa geração de celebridades virtuais. Profissionais do mercado estimam que Bruno fature, só com a internet, em torno de 40 000 reais mensais, podendo chegar a 100 000 reais em épocas como o Carnaval, quando ele costuma ser contratado por grandes marcas para coberturas especiais. Encoberto por um personagem de fic��ão que existia apenas no mundo virtual, só agora Bruno começa a incorporar Hugo fisicamente, surgindo com seu próprio rosto em selfies e ao lado de celebridades. E faz isso em grande estilo. Com 1,88 metro de altura, não economiza nas roupas de marca que veste — preferencialmente de cores escuras, para esconder os pneuzinhos extras. Adora a grife Givenchy, cujas peças combinam com tênis enormes e supercoloridos. Também não desgruda de seu inseparável Apple Watch, misto de relógio, celular e computador que lhe permite acessar e-mails e receber notificações sobre as postagens dos ídolos, para replicar e comentar imediatamente. Mas sua marca registrada são os chapéus — ele tem oito. Tamanho cuidado com a aparência não é gratuito. Bruno — ou Hugo, como queiram — está empenhado em expandir suas fronteiras. Ele tem planos de pôr no ar um canal de vídeos no YouTube e sonha um dia escrever uma novela. “Tenho muita vontade de fazer alguma coisa de dramaturgia, de ver essas coisas loucas que passam na minha cabeça virar algo a que as pessoas possam assistir”, planeja. Não há dúvidas de que não falta ambição ao rapaz