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Idioma yiddish conquista adeptos em busca do resgate de tradições

A língua foi praticamente extinta no século XX, mas guarda uma rica cultura e desperta curiosidade não só de descendentes judaicos

Por Marina Mann*
Atualizado em 9 jan 2024, 18h02 - Publicado em 9 jan 2024, 17h10
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Núcleo Viver com Yeddish: criado há sete anos na PUC-Rio (./Divulgação)
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Fusão entre alemão, hebraico e as línguas eslavas, o yiddish é um idioma que abrange cultura, memória e tradição, mas a língua foi esquecida e praticamente extinta no século passado, devido ao nazismo e stalinismo. Num exercício de se reconectar com o passado a as próprias famílias, descendentes têm buscado aprender o idioma.

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Professora do Departamento de Comunicação na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), Marcia Antabi afirma que a sua relação com a língua e a cultura yiddish remonta à infância, mas esteve presente em diferentes esferas da vida. Os avós maternos da jornalista de formação eram poloneses e partiram da cidade de Radom rumo ao Brasil pouco tempo antes de estourar a Segunda Guerra Mundial, trazendo o idioma na mala. As histórias que ela escutava da avó, que perdeu quase toda a família assassinada pelos nazistas, provocavam dúvidas, que foram compreendidas anos mais tarde. “Minha ligação com a língua, para além de afetiva, também passa pela memória, trazendo histórias, dores, alegrias e, também, a paixão pelo cinema”, define.

O laço com as raízes serviu de base para Marcia encontrar o tema de seu doutorado: “O cinema yiddish de ontem, hoje”. Na tese, ela investigou como esse cinema, produzido na Polônia até a Segunda Guerra, é uma produção esquecida e quase desconhecida na bibliografia sobre a História do Cinema Mundial. Mas, segundo Marcia, essa produção retrata detalhes da vida judaica na Europa Oriental e as películas que ainda existem são verdadeiras obras-primas. A professora considera que a cinematografia yiddish possibilita “desenterrar” o cinema-passaporte. “Resgatar esses filmes significa entrar em contato com a língua yiddish como marca inscrita de uma cinematografia remanescente”, diz Marcia.

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Em outro eixo cultural do idioma, a cantora Yasmin Garfunkel, de Buenos Aires, identificou na música uma forma de se conectar com o yiddish. O primeiro contato foi aos 9 anos, na escola primária. “Nos ensinaram uma canção que não era em hebraico, mas em yiddish. Fiquei fascinada e trago essa lembrança até hoje”, lembra a artista. Ao final da graduação, Yasmin percebeu que a música a encantava, mas não havia um sentimento de pertencimento. A partir daí, decidiu se conectar culturalmente com o judaísmo e, por já estudar alemão, começou a aprender o yiddish. “De forma efetiva encontrei aquilo com o que me identifico, que me interpela identitariamente. O que eu mais gosto é de cantar, investigar, saber mais e falar o idioma, porque é tudo isso”, conta Yasmin.

O estudante de Letras da USP Gustavo de Oliveira Emos é um pesquisador da língua e curioso. Apesar de não vir de família judia, ele acabou se convertendo ao judaísmo. O contato com o yiddish veio após ter estudado hebraico em um intercâmbio em Israel. Ele admite que começou a aprender a língua porque “soava legal”. Depois, descobriu a existência de grupos de leitura e conversação no Centro de Memória Judaica, em São Paulo, havia. Rapidamente ele se apaixonou pelo lugar e pelas pessoas, a maioria composta de falantes nativos do yiddish, que ficaram empolgados ao ver que havia um jovem também interessado em aprender a língua.

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Por já saber hebraico e alemão, o estudo ficou mais acessível para Gustavo. “Eu consegui sentar junto já no primeiro dia e ler romances com as pessoas. Era o ambiente perfeito para aprender, porque sempre que eu tinha uma dúvida, não precisava olhar no dicionário. Era uma mesa com quinze falantes nativos e eu perguntava ‘o que é isso?’ e conseguia cinco respostas de uma vez”.

Uma das coordenadoras do Núcleo Viver com Yiddish, criado há sete anos na PUC-Rio, a professora emérita do Departamento de Educação Sonia Kramer lembra que “nasceu em yiddish”. A família era migrante de pequenas cidades na Polônia, onde só falavam o idioma. Ela teve contato com a língua através do pai, sobrevivente de Auschwitz, além de ouvir música, ler jornais e frequentar uma escola em que o idioma era ensinado. Todos esses fatores geraram nela uma relação forte e pessoal com o yiddish.

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Nos últimos anos, o vínculo se tornou central, o que a impulsionou a trazer sua experiência de pesquisa, ensino e extensão na PUC-Rio. Assim, há sete anos, nasceu na universidade o Viver com Yiddish. “Nas últimas décadas, o yiddish voltou à cena em muitos países. Cursos de yiddish, encontros de falantes, pesquisas, traduções de yiddish, projetos culturais. Nesse movimento, as universidades e os centros de pesquisa passaram a desempenhar um papel fundamental”, destaca Sonia.

Professora do Departamento de Letras da PUC-Rio, Inés Miller é coordenadora do Núcleo Viver com Yiddish e conta que estabeleceu a relação com a língua por causa do marido, que era ashkenazi, grupo de judeus localizados geograficamente na Europa Central. “Através do yiddish ele encontrava expressões idiomáticas que expressavam melhor o que queria dizer”, lembra. Durante a pandemia, Inés resolveu começar a estudar o idioma e, atualmente, é aluna de uma disciplina oferecida on-line pela PUC-Rio.

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Apesar de ter bastante dificuldade para ler, ela diz que é uma experiência cultural, social e linguística muito forte. “Sou professora de inglês e estou acostumada a formar educadores. De repente, me vi no lugar de aluna e isso tem sido muito positivo”, complementa. Gustavo também comenta que a procura e demanda por professores de yiddish é algo que ele qualifica como “incrível” e que ele não teria imaginado antes de fazer aulas do idioma, hoje parte presente da sua rotina.

* Marina Mann, estudante de Jornalismo da PUC-Rio, com orientação de professores da universidade e revisão final de Veja Rio.

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