A Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro (SES), quando ainda estava sob o comando do governador afastado Wilson Witzel, não consultou a área técnica da pasta para realizar licitações e contratações de organizações sociais (OS). Segundo testemunhas ouvidas nesta segunda (28) pelo Tribunal Especial Misto no âmbito do processo de impeachment, o setor que deveria definir as especificações das contratações da pasta, soube pela imprensa de decisões como a compra de respiradores e a contratação de hospitais de campanha.
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Witzel foi afastado do cargo por suspeita de atos de corrupção em contratos públicos do governo do Rio de Janeiro. Segundo o Ministério Público Federal (MPF), um dos principais mecanismo era o direcionamento de licitações de organizações sociais e a cobrança de um percentual sobre pagamentos das empresas fornecedoras do estado, feito mensalmente a agentes políticos e servidores públicos da Secretaria de Saúde. Entre as operações suspeitas está a contratação da organização social Instituto de Atenção Básica e Avançada à Saúde (Iabas) para gerir os hospitais de campanha montados para atender pacientes da covid-19.
“Não fui consultada em momento algum sobre nenhum processo de contratação”, diz a ex-subsecretária de Gestão da Atenção Integral à Saúde da Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro, Mariana Tomasi Scardua. A Subsecretaria tem uma função técnica, ela define por exemplo os termos de referência dos objetos a serem licitados pela Secretaria de Saúde.
Segundo Mariana, após a entrada do então subsecretário executivo de Saúde da SES, Gabriell Neves, a área foi “escanteada” e a equipe dele passou a concentrar também trabalhos que deveriam ser feitos pela equipe de Mariana. Neves chegou a ser preso por suspeita de fraude na compra de respiradores para a rede estadual.
“Em todo o planejamento das primeiras ações no cenário da covid-19, a nossa área técnica não foi ouvida. Ela não era chamada e nem convocada para as tomadas de decisão da SES. Por exemplo, dos hospitais de campanha, a gente ficou sabendo pelo jornal. Dos respiradores, a mesma coisa”, diz o ex-assessor especial da mesma Subsecretaria Luiz Octávio Martins Mendonça.
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Segundo Mendonça e Mariana, a falta de transparência e desinformação no setor fez com que chegassem a pedir exoneração no início do ano. Com a pandemia, no entanto, acabaram permanecendo nos cargos até que foram exonerados em abril. “Eu desconhecia o que estava acontecendo na Subsecretaria Executiva, inclusive, eu achava que nenhum processo estava caminhando e essa era a minha preocupação. A gente estava chegando no final de março sem ter nenhum processo caminhando porque não saiu pedido de respirador da minha pasta, não saiu pedido de leito da minha pasta, as coisas não caminhavam”, diz Mariana.
No entanto, nem Mariana nem Mendonça sabem o motivo exato da exoneração. Ela suspeita que tenha ocorrido por fazer um alerta em relação ao Iabas quando soube que a organização seria responsável pelos hospitais de campanha. “Eu fui dizer que uma OS só e ainda mais o Iabas, que tem histórico de não entregar. E, culminou na exoneração”.
Decisão do STF
O presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) e do Tribunal Especial Misto (TEM), desembargador Claudio de Mello Tavares, no início da sessão, criticou a decisão expedida neste domingo (27) pelo Superior Tribunal Federal (STF), de suspender o depoimento do governador afastado do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, previsto para esta segunda (28).
A decisão foi do ministro Alexandre de Moraes, que determinou que o interrogatório somente poderá ser realizado após a defesa ter acesso a todos os documentos remetidos pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), com prazo mínimo de cinco dias entre o acesso integral e o ato processual, bem como após a complementação da oitiva do ex-secretário de Saúde Edmar José Alves dos Santos, um dos delatores do suposto esquema de corrupção.
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Segundo Tavares, por lei, as declarações de Santos não podem ser publicizadas, pois podem tanto atrapalhar as investigações quanto ferir os próprios direitos do ex-secretário, protegido por acordo de delação premiada. “A defesa tinha, então, pleno conhecimento, ao arrolar a testemunha, da sua limitação quanto aos fatos narrados na delação”, diz.
“Esse Tribunal primou pelo respeito pleno às garantias fundamentais em respeito ao devido processo legal e seus corolários lógicos, o contraditório e a ampla defesa”, afirma e acrescenta: “[A Corte] teve o cuidado, eu diria, até excessivo de preservar a plenitude de defesa. Não foi diferente com a instrução. Toda prova testemunhal requerida pela defesa foi deferida. Literalmente, toda”.
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Processo de impeachment
Em agosto deste ano, Witzel foi afastado do cargo por 180 dias em decisão do ministro Benedito Gonçalves, do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O afastamento foi determinado no âmbito da Operação Tris in Idem, um desdobramento da Operação Placebo, que investiga atos de corrupção em contratos públicos do governo do Rio de Janeiro. Desde o início das investigações, Witzel nega o envolvimento em atos de corrupção e sustenta que seu afastamento não se justifica.