Para Michel Temer, foi “uma jogada de mestre”. Já na visão de Fernando Henrique Cardoso, tratou-se da medida de um governo “encurralado”. Prestes a completar três meses na próxima quarta (16), a intervenção federal na segurança pública do Rio já despertou as mais diversas opiniões. Uma pesquisa do instituto Datafolha feita no fim de março mostrou que 76% dos cariocas apoiavam a iniciativa, 20% eram contra e outros 4%, indiferentes. Porém, um levantamento da Fundação Getulio Vargas (FGV) sobre as primeiras doze semanas de operação traz um retrato um pouco diferente da situação. Após monitorar mensagens publicadas no Twitter, a instituição constatou que a quantidade de manifestações favoráveis foi muito próxima do total de protestos contra o programa. Ao todo, somaram-se mais de 560 000 tuítes para cada lado, em um verdadeiro Fla-Flu que partiu ao meio a internet. “Em geral, perfis de direita tendem a apoiar ações mais duras contra a violência, enquanto páginas de esquerda criticam o caráter militar e outros aspectos da medida”, afirma Amaro Grassi, um dos coordenadores do estudo que está sendo realizado pela diretoria de análise de políticas públicas da FGV (FGV-Dapp). “O objetivo é acompanhar e compreender como a sociedade está enxergando a intervenção”, acrescenta.
Todos os dias, o time de pesquisadores da FGV rastreia mensagens contendo palavras como “exército” e “segurança”, entre outras. Mais de 2 milhões de tuítes já foram contabilizados e tiveram seu conteúdo classificado no processo. Logo de cara, chama atenção o impacto de episódios ligados à segurança no número de publicações postadas na rede social, que cresce vertiginosamente após fatos dessa natureza. A maior prova disso é o recorde de mensagens relacionadas à intervenção que foi registrado por minuto na noite da morte da vereadora Marielle Franco e de seu motorista, Anderson Gomes. Em outra ocasião, a revista do material escolar de estudantes por militares em uma favela da Zona Norte pôs o termo “mochila” entre os três mais mencionados da semana. Um ponto interessante é a ânsia por discutir os resultados, traço comum tanto entre aqueles que são contra quanto entre os que são a favor da medida. Ela se reflete nas mensagens com maior número de interações, ou seja, nas que geram mais repercussão por meio de curtidas e compartilhamentos. Do lado dos defensores, uma foto de uma senhora recebendo uma flor de um soldado no Dia Internacional da Mulher foi usada como exemplo do bom trabalho dos interventores. Do lado dos opositores, um comentário do humorista Marcelo Adnet criticando o alto investimento e os poucos resultados da iniciativa serviu de munição. Notícias, piadas e outros comentários neutros representaram 44,8% das publicações avaliadas. De acordo com o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, no entanto, os efeitos não podem ser medidos em tão pouco tempo. “A intervenção não foi algo pensado para dar resultados em três meses”, explica.
A existência de apoiadores e críticos tão apaixonados reflete o atual cenário da intervenção, no qual vitórias e derrotas se acumulam. No comando da Segurança Pública fluminense, o general Braga Netto reforçou o patrulhamento no Centro e na Zona Sul a partir do fim de março, ordenou o retorno à PM de 87 agentes cedidos à Alerj e deu uma atenção especial à questão carcerária, que foi tema de 47 de seus 92 atos administrativos. Por outro lado, o número de mortos em chacinas no estado cresceu de 27 entre fevereiro e março de 2017 para 52 no mesmo período de 2018; o índice de roubos aumentou 70%; e a tropa cometeu erros graves, como a prisão por suposta ligação com milícias de 159 homens que estavam em um show em Santa Cruz no começo de abril. Entre os detidos, havia até um artista de circo, posteriormente liberado. Formado por especialistas e grupos da sociedade civil que acompanham a iniciativa, o Observatório da Intervenção divulgou um relatório no qual afirma que, ao que tudo indica, não há um novo modelo de política de segurança sendo implantado no estado. Quem ainda estiver em dúvida em relação ao quadro tem até 31 de dezembro, quando deve acabar a operação, para escolher seu lado no Fla-Flu. ß