Por quase meio século, o livro Sociedade Brasileira tem funcionado como uma espécie de bíblia da alta-roda. Ali estão reunidos figurões com sobrenomes de quatro costados, herdeiros de grandes fortunas e uma constelação de personalidades que povoam o circuito de festas da cidade. Coordenada pela socialite Lourdes Catão, a publicação costuma ser atualizada a cada dois anos. A versão mais recente foi lançada no dia 24 de setembro, com pompa e circunstância, no salão nobre do Copacabana Palace. Na ocasião, o suntuoso espaço decorado com sofás e poltronas em tons de verde ficou apertado para acomodar os convidados. Em pouco mais de três horas, Lourdes autografou mais de 500 exemplares de capa dourada ao preço de 170 reais cada um. Ao todo, são 356 páginas com 2?200 nomes acompanhados de telefone e endereço, quarenta deles recém-incluídos na lista pela autora. Da turma de calouros fazem parte as atrizes Maitê Proença e Christiane Torloni, o empresário Wagner Belfort Duarte e o investidor Roberto Cooper. Em meio às doses de uísque e taças de prosecco servidas no lançamento, o que animava as conversas não era tanto o pelotão de recém-chegados, mas sim o destino de quatro figurantes da seleção anterior que simplesmente desapareceram da atual. Levaram bola preta o colunista social Jeff Thomas, o casal Ana Lúcia e Laerte Coutinho e o apresentador paulista Amaury Jr. “Eles não se enquadraram no perfil do livro”, afirma Lourdes.
Expurgos desse porte são coisa rara no Sociedade Brasileira. Normalmente, exclusões só ocorrem em caso de morte e de envolvimento em grandes escândalos. Foi o que aconteceu com o ex-presidente Fernando Collor de Mello, logo depois da campanha pelo impeachment, em 1992, e com o cirurgião plástico Hosmany Ramos, condenado por uma série de crimes. Nesse sentido, os recentes cortes surpreenderam os leitores. O que tem provocado maior falatório é o de Jeff Thomas, autor de mais de uma dúzia de publicações sobre a alta sociedade e dono de um lugar cativo no guia de Lourdes há três décadas. Os comentários nos salões, restaurantes e à beira das piscinas são de que ele vinha fazendo uso indevido de sua situação privilegiada. Explica-se: um dos mecanismos de admissão na lista é a indicação por uma pessoa que já faz parte dela. Assim que o livro de 2010 foi lançado, imediatamente começaram a correr rumores de que Thomas havia cobrado para indicar o suíço radicado no Rio Alessandro Wassilieff Ofrosimoff. Neste ano, chegaram à organizadora denúncias de que mais três pessoas ? a atriz Terezinha Sodré, a empresária Regina Lemos Gonçalves e o investidor João Chamarelli ? teriam recebido propostas para ser indicadas em troca de valores que alcançavam 25?000 reais. “O Jeff Thomas foi citado. Não quero acusar ninguém, mas optei por tirá-lo do livro”, justifica Lourdes. O colunista contra-ataca: “Desafio qualquer pessoa a provar que pedi dinheiro para indicar alguém, darling”. E até vai mais longe, ao sugerir que tal conduta seria adotada pela própria equipe que edita a publicação. “Em vez de falarem bobagem, deveriam é investigar o mensalão da Lourdes Catão”, cutuca.
Originalmente restrito a um pequeno círculo de bem-nascidos, o catálogo, antes organizado pela irmã de Lourdes, Helena Gondim, passou por uma série de adaptações para melhor refletir os tempos atuais. A maioria dos listados ainda provém de linhagens tradicionais, mas a cada edição cresce o número de atores, profissionais liberais bem-sucedidos, casais gays e, eventualmente, emergentes da Zona Oeste. Foi nessa última categoria que a empresária Ana Lúcia Coutinho, nascida e criada em Duque de Caxias e moradora da Barra da Tijuca, debutou, há dois anos, ao lado do marido. Sua indicação foi feita pelo assessor de imprensa Mauro Guerra, conhecido por ajudar seus clientes a galgar o caminho rumo à alta sociedade. O estilo da empresária, que adora um churrasquinho à beira da piscina com os amigos, vários deles jogadores de futebol, não agradou à grã-finagem mais tradicional. Ana Lúcia, que chegou a ser convidada para o reality show Mulheres Ricas, foi surpreendida com o corte. “Não sabia das mudanças. Foi muito bom estar lá, mas ela tem todo o direito de pôr ou tirar quem quiser”, diz com elegância. O último limado, Amaury Jr., convidado em 2009 pela própria autora, ainda tenta entender a exclusão. “Talvez ela queira dar um tom mais carioca”, especula. Lourdes justifica sua decisão argumentando que o apresentador nunca lhe telefonou ou demonstrou interesse pelo livro. Um pecado que, para ela, é imperdoável.