Caça aos porcalhões
A sujeira recorde no réveillon leva a prefeitura a lançar medidas para o Carnaval
O réveillon de Copacabana tornou-se um programa comparável às grandes atrações da cidade, como as praias, o Pão de Açúcar e o Corcovado. Estima-se que, na noite do dia 31, cerca de 2 milhões de pessoas tenham ocupado as pistas da Avenida Atlântica, a areia e o calçadão do Leme ao Posto 6 para ver o show pirotécnico da virada do ano. Durante dezesseis minutos, 22?000 bombas e fogos de artifício espocaram no céu, diante de uma multidão mesmerizada. Com justiça, o espetáculo foi eleito pelo World Travel Guide, publicação voltada para o turismo, a melhor festa do gênero no planeta. Porém, os elogios se encerram aí. Terminada a celebração, o que ficou foi um cenário degradante. Ao alvorecer do primeiro dia de 2012, a faixa à beira-mar era uma imundície só. Parecia varrida por um tsunami, cujas causas, no entanto, não passam por um rompante da natureza. Estava apinhada de garrafas de vidro, latas de cerveja, caixas de isopor, restos de papel, sobras de comida e até colchões deixados para trás. Esse rastro de sujeira proporcionou uma triste marca. Apenas naquela área, a Comlurb recolheu 370 toneladas de lixo, um recorde negativo relativo à data. Pior: o número representa um aumento de 80% em relação à edição de cinco anos atrás. Além de ser uma mácula para os cariocas, o episódio provoca apreensão em relação ao Carnaval, que arrasta outros milhões de foliões às ruas. Medidas para uma ocupação civilizada do espaço público estão em estudo. ?Vamos montar uma logística ainda mais elaborada, para que as pessoas sujem menos a cidade?, diz o secretário municipal de Conservação e Serviços Públicos, Carlos Roberto Osório.
A preocupação com o Carnaval é pertinente, como deixam claro as estatísticas do ano anterior. Em 2011, após a passagem dos 400 blocos que desfilaram a céu aberto pelo Rio, a Comlurb recolheu 1?304 toneladas de resíduos, mais que o dobro do registrado na festa do último fim de semana, se levarmos em consideração todo o município. Para evitar a repetição da porcalhada, uma nova estratégia de limpeza urbana será implantada pela prefeitura, dividida em três partes. A primeira delas, prevista para as próximas semanas, é a convocação dos representantes de todas as agremiações de rua. Eles receberão a tarefa de abraçar a campanha por um Carnaval mais limpo, ficando responsáveis por orientar seus seguidores sobre o óbvio: lugar de dejeto é na lixeira. A segunda etapa tem a ver com o trabalho dos garis. Como já aconteceu em alguns blocos no ano passado, a determinação é que a turma dos laranjinhas faça um arrastão com a vassoura em punho assim que os cortejos acabarem de passar, a exemplo do que ocorre no Sambódromo após a apresentação de cada escola de samba. Por fim, a prefeitura vai pedir à cervejaria patrocinadora do evento que ajude na missão de colocar os latões de lixo próximo aos pontos de venda móveis da bebida. Assim, quem terminar de tomar sua latinha não terá a desculpa da falta de recipiente por perto para depositá-la. A medida pode ajudar, mas está longe de resolver o problema. ?Precisamos dividir nossa responsabilidade com quem faz e aproveita a festa?, avalia o secretário Osório. Ele lembra que houve progressos significativos na repressão a quem urina nas calçadas, outra conduta inconcebível – e infelizmente habitual – dos foliões do asfalto. ?Agora é a vez de obter a mesma participação da sociedade.?
Resolver o problema dos dejetos produzidos nos grandes eventos é um desafio complexo, que não só envolve uma estrutura pública mais eficiente como passa pela mudança de postura da população. De nada adianta centenas de contêineres se a pessoa não está disposta a depositar o lixo dentro deles, da mesma maneira que é inútil o cidadão querer jogar a latinha no local apropriado se não houver cestas disponíveis. Na passagem do ano em Copacabana, foram colocadas 1?300 lixeiras em pontos-chave ao longo da praia e em torno das estações do metrô. Não funcionou. Boa parte dos recipientes recolhidos estava bem abaixo de sua capacidade de armazenamento. Ao redor deles, entretanto, o acúmulo de detritos parecia um chiqueiro enorme. ?Nunca vi tanta sujeita quanto na manhã do dia 1º. Acredito que 90% dos resíduos recolhidos estavam no chão?, relata Angela Fonti, presidente da Comlurb. ?Minha vontade era pegar uma vassoura e ajudar os garis.? O mau comportamento, diga-se, reproduz-se diariamente. Mais de 40% do lixo coletado no Rio é retirado das ruas. Nos países desenvolvidos, esse porcentual cai pela metade. Para estimular o carioca a fazer a coisa certa, em 2009 a prefeitura começou a instalar pela cidade painéis que informam a quantidade de lixo produzida em cada região. Infelizmente, os lixômetros, como ficaram conhecidos, mostraram-se inócuos para mudar a situação. É deplorável, mas teremos de conviver com ela até o espírito de porco acabar.