Na derradeira edição do ano, a seção Retrato da Semana muda de nome e atribui a uma única imagem o baita desafio de simbolizar o espírito carioca nos últimos doze meses. A eleita de 2016, obra do fotógrafo Ricardo Moraes, rodou o mundo distribuída pela agência de notícia Reuters. Aliás, só deu Rio: na conta de Instagram da agência de notícias britânica, com 1 milhão de seguidores, dez das trinta fotos mais populares da temporada foram feitas aqui. Oito delas são registros da Olimpíada e as outras duas, retratos embevecidos do Cristo Redentor. O prestígio da cidade alcançou outras redes. No Twitter, a hashtag #Rio2016 foi a mais usada de janeiro a dezembro, à frente de, entre outras, #Election2016 e #PokemonGo. Essa foi a parte boa. Ricardo Moraes encontrou o ângulo perfeito no alto do Morro da Mangueira, na noite da sexta‑feira, 5 de agosto, em que o Maracanã abrigou a cerimônia de abertura dos Jogos. Visto assim do alto, o foguetório da festa no estádio fez contraste indisfarçável com o casario da favela mal iluminada.
Terminada a Rio 2016, só uma parte da paisagem acima permaneceu. Foi a pobreza, cevada por uma crise que não deixou de crescer, apenas tinha perdido espaço no noticiário, e voltou com tudo após a saída de cena dos atletas. Na internet, quebrou-se o encanto e o Rio virou Geni. O estado, falido, atrasava salários no começo do ano. Agora, quer parcelar o 13º dos servidores. Confrontos entre bandidos e PMs multiplicam-se nas áreas com UPP, como a Mangueira. Dá aquele desânimo, só aplacado pela ira descarregada nas redes, mas é preciso evitar a sensação de que a culpa é do outro. Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) oferece uma saída nos versos de Receita de Ano Novo:
“Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre”.