Para quem nunca subiu em um skate, construir uma pista para a prática desse esporte é uma obra banal. Basta erguer uma rampa, escavar um grande buraco no chão, cobrir tudo com cimento e pronto – está feito mais um playground para jovens e adolescentes em busca de emoções fortes. No entanto, o risco de uma estrutura feita dessa forma ficar às moscas é enorme. O motivo é que, como ocorre com qualquer equipamento destinado à prática esportiva, tais canchas exigem cuidado com uma infinidade de detalhes, completamente ignorados por quem não entende do assunto. Sua inclinação, por exemplo, deve estar milimetricamente relacionada à extensão, sob risco de os skatistas não conseguirem vencê-la. O espaço de manobras, conhecido como bowl, precisa ter um raio proporcional à profundidade, para garantir que a velocidade não seja alta demais, o que tornaria os tombos inevitáveis. Até mesmo o revestimento tem de ser feito com um tipo de concreto diferente, mais resistente e liso, para não rachar e ao mesmo tempo não oferecer atrito. “Apesar da boa intenção, a maioria das pistas é feita de forma sofrível, sem o menor cuidado”, diz o arquiteto Bruno Pires, de 25 anos. Ao lado do sócio Sylvio Azevedo, de 35, ele é dono do único escritório carioca especializado nesse tipo de instalação, o Rio Ramp Design. Juntos, os dois estão por trás de alguns dos mais elogiados projetos do ramo, como o skatepark da Lagoa, o do Arpoador e o circuito do Parque Radical, a ser erguido na área da antiga Estação do Corpo.
O segredo do sucesso de Azevedo e Pires está no fato de ambos serem praticantes fanáticos do skate. Na adolescência, sonhavam em se tornar profissionais. Pires até chegou perto, conseguindo alguns troféus em competições amadoras, mas não passou disso. Azevedo trocou as acrobacias sobre rodinhas pela vida de comerciante, ao abrir uma loja especializada em equipamentos e acessórios para a atividade, a Versão 02, no Recreio. Foi ali que ambos se conheceram em 2000, quando Pires, então um garoto de 13 anos, se tornou um de seus clientes de carteirinha. O primeiro a participar do planejamento de uma pista foi Azevedo. Em 2001, reconhecido especialista do bairro no assunto, ele seria chamado para dar palpites na construção da estrutura da Praça Tim Maia, no Pontal. “O conceito era muito, mas muito ruim”, recorda. “As pessoas iam se machucar, como acontece em várias estruturas malfeitas por aí.” A fama de Azevedo aumentou e ele passou a desenhar rampas particulares, como a que servia de cenário para um show itinerante da Xuxa. “Acabei indicando o Bruno junto com outros garotos para se exibirem enquanto ela cantava”, diz Azevedo. O trabalho ganhou nova dimensão em 2007, quando surgiu um convite para desenhar um grande skatepark na Barra. Parte da revitalização no entorno de um condomínio às margens da Lagoa da Tijuca, o empreendimento era muito ambicioso. Pires, na época, já cursava a faculdade de arquitetura e acabou sendo chamado pelo amigo para participar do projeto (entusiasmado, Azevedo prestou vestibular para a carreira e vai se formar em dezembro deste ano). A encomenda não saiu do papel, mas a parceria deu origem à Rio Ramp Design, que, desde sua criação, já projetou, reformou ou construiu sete circuitos públicos na cidade.
Com estimados quase 4 milhões de adeptos no país – 48% deles na Região Sudeste -, a prática de skate passa por um excelente momento. Na elite mundial do esporte, o Brasil só perde para os Estados Unidos em número de praticantes do esporte. No último X Games, uma espécie de campeonato mundial da categoria, cinco das dezesseis medalhas vieram para cá. Não espanta, portanto, que Azevedo e Pires tenham tantos e tão grandiosos projetos nas mãos. Fica pronto em julho, por exemplo, o Parque de Madureira, com 3?850 metros quadrados de área construída, que terá a única pista do Brasil para longboard (modelo com prancha mais alongada), além de um bowl com craddle (uma rampa acoplada em um dos lados), na qual o skatista quase chega a ficar de cabeça para baixo. Também estão em fase de acabamento um skatepark na Vila Olímpica do Engenhão e uma terceira estrutura no Jockey. Para quem não acreditava, os dois amigos provaram que é possível, sim, ganhar a vida com a arte de deslizar em pranchas com rodinhas.