Os macacos bugios são conhecidos pelo vozeirão. De tão potentes, seus rugidos alcançam 128 decibéis, volume superior ao da sirene de uma ambulância, e são ouvidos a até 5 quilômetros de distância. Com pelagem alaranjada, alimentam-se basicamente de folhas e frutos, pesam, em média, 7 quilos e podem medir de 30 a 75 centímetros. Também são famosos por se movimentar com rapidez entre os galhos, mas isso não impediu que acabassem dizimados na Floresta da Tijuca, devastada por fazendas de café ali instaladas ao longo dos séculos XVIII e XIX. Após mais de 100 anos sem ser vistos na região, uma boa notícia: os bugios voltaram a circular livremente pela mata, graças a um programa de reintrodução de animais nativos extintos em consequência da caça predatória e do desmatamento. “As próximas espécies da fila são as antas e as araras-vermelhas, que desapareceram da área antes mesmo de termos registros fotográficos delas no local”, revela Fernando Henrique Sousa, diretor de sustentabilidade do Grupo Cataratas, uma das entidades que vêm financiando as atividades do projeto Refauna.
Os bugios, também conhecidos como guaribas ou barbados, foram instalados em um viveiro dentro do Parque Nacional da Tijuca que permitiu sua aclimatação gradativa ao ambiente. Nesse período, eles ganharam uma dieta nova, com folhas e frutos típicos que poderiam encontrar quando soltos. Dos seis animais já reintroduzidos no parque, oriundos de cativeiro e de apreensões feitas por órgãos ambientais, dois deles, Kala e Juvenal, se saíram tão bem que tiveram até um filhotinho, em setembro do ano passado. O principal entrave para a adaptação, no entanto, é mesmo o contato com seres humanos, que podem transmitir doenças contra as quais os primatas não têm imunidade. Muitas pessoas ainda oferecem comida, o que vicia os bichos em comportamentos que inviabilizam a ambientação e o exercício da função ecológica da espécie. “Tivemos de resgatar dois macacos que só ficavam no chão pedindo comida. Dessa forma, eles também deixam de comer os frutos com as sementes dentro, e as fezes não contribuem mais para a dispersão das plantas, o que é importante para garantir que a floresta possa conservar, a longo prazo, a sua biodiversidade”, explica Ernesto Viveiros de Castro, chefe do Parque Nacional da Tijuca.
Equipados com coleiras de rastreamento, os novos moradores do parque recebem visitas semanais de doze pesquisadores da UFRJ, que verificam como anda a saúde dos bichos e avaliam o processo de adaptação à nova casa, bem mais ampla e desafiadora. “O monitoramento é auxiliado por armadilhas fotográficas e marcas no pelo, que os diferenciam uns dos outros”, detalha o biólogo da UFRJ Fernando Fernandez, coordenador do projeto, que trabalha agora em uma nova soltura. Até o fim de janeiro, um grupo de doze cutias, capturadas no pátio do zoológico do Rio, numa área que passará por obras em breve, também será devolvido à natureza, na região do Corcovado. No momento, os pequenos roedores estão no período de quarentena em cativeiro, quando são submetidos a baterias de exames, para garantir que não levem doenças ou parasitas para o meio ambiente. Como aconteceu com os macacos, as duas primeiras semanas na floresta serão de confinamento em um cercadinho, onde começam a se habituar ao novo terreno. Se tudo der certo, ficarão o resto da vida em liberdade.