Rio 50 graus: e agora?

Vaporizadores, chuveirões e outras vias refrescantes chegam para ajudar a enfrentar as ondas de calor extremo que assolam o Rio

Por Paula Autran
Atualizado em 14 fev 2025, 12h52 - Publicado em 17 jan 2025, 06h00
Calor abre
Calor extremo: Alerta Rio prevê chuva abaixo da média para a primeira quinzena de março  (iStock/Getty Images)
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O show da estrela americana Taylor Swift, no Engenhão, em novembro de 2023, foi um divisor de águas para o Rio. A morte de uma fã de 23 anos por exaustão térmica, num dia em que a sensação de calor alcançava os 59,3 graus, atiçou uma fogueira que arde com cada vez mais intensidade graças aos efeitos das mudanças climáticas. As abafadas ruas da cidade nunca estiveram tão quentes — tanto que a prefeitura criou, em outubro passado, um protocolo que detalha medidas a serem adotadas quando a combinação de temperatura e umidade bate 44 graus por três dias consecutivos, pondo em risco a saúde de quem perambula pela canícula. Entre as iniciativas, estão a suspensão de eventos ao ar livre, além de 59 pontos de resfriamento que oferecem sombra e água fresca. A iniciativa inédita ajudou a formar uma onda de vaporizadores, chuveirões e outras soluções refrescantes que não são mais modismos passageiros, restritos a uma única estação e só. “Esta mudança de comportamento é necessária, deve ser permanente e não pode ser capitaneada apenas pelo poder público. Todos precisam agir neste sentido”, alerta a superintendente de Vigilância em Saúde do município, Gislani Mateus.

Toldo e climatizadores foram instalados na laje do bar Sofia, da chef Kátia Barbosa: “Era o inferno na Terra”
Toldo e climatizadores foram instalados na laje do bar Sofia, da chef Kátia Barbosa: “Era o inferno na Terra” (Daniela Dacorso/Divulgação)

A acelerada marcha do aquecimento fez com que o Brasil registrasse 66 dias a mais de calor extremo no ano. Na média mundial, o índice foi de 26 dias. “A gente está numa cidade já conhecida como Rio 40 graus, em que a população, de certa forma, naturaliza os elevados termômetros. Mas, mesmo para nós, essas ondas estão atingindo níveis extremos”, diz Gislani, lembrando que a exposição a temperaturas acima da do corpo afeta as pessoas de várias formas, já que muitos órgãos começam a se “estressar” para chegar a um equilíbrio com o ambiente. Todo esse esforço envolvido gera consequências que vão de câimbras a inchaços, uma vez que as artérias podem se dilatar para fazer a compensação, causando febre, delírios, desmaios e crises convulsivas. Crianças, idosos e gente com comorbidades são as mais suscetíveis, mas até atletas às vezes se tornam vítimas. Não por acaso, nas partidas oficiais de futebol, já há uma pausa para hidratação dos jogadores quando o calor extrapola. “Locais descampados, não arborizados ou asfaltados são preocupação para os cidadãos em geral”, reforça a especialista.

Água garantida: bebedouros fornecem 1,5 milhão de litros de água aos frequentadores do Universo Spanta, durante o mês de janeiro na Marina da Glória
Água garantida: bebedouros fornecem 1,5 milhão de litros de água aos frequentadores do Universo Spanta, durante o mês de janeiro na Marina da Glória (Bruno de Lima/R2/Divulgação)
Chuveirão para todos: agora a Fundição Progresso conta com dois pontos para o público se refrescar
Chuveirão para todos: agora a Fundição Progresso conta com dois pontos para o público se refrescar (./Divulgação)
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Vários escaninhos da vida estão se amoldando aos excessivos graus centígrados. Se antes era comum vetar a entrada com garrafas de água em festivais, manter o público hidratado passou a ser prioridade. “Contamos com duas ilhas de hidratação, que vão fornecer cerca de 1,5 milhão de litros de água fresca”, diz Gabriel Lobo, diretor-geral do Universo Spanta, atração tradicional de janeiro, na Marina da Glória, que traz, em 2025, artistas como Ivete Sangalo, Daniela Mercury e É o Tchan. Outros refrescos providenciados para o público são os ventiladores instalados no pavilhão coberto, para impulsionar a circulação do ar, e um espaço de convivência para descanso embaixo das árvores do Aterro do Flamengo. “Agora, os produtores sabem que até a fila faz parte do evento. Antes, só focavam no que acontecia do muro para dentro”, observa o chefe-executivo do Centro de Operações Rio (COR), Marcus Belchior, chamando a atenção para uma essencial mudança de cultura, que se avista também em bares e restaurantes com áreas ao ar livre, fora do alcance do ar-condicionado.

arte Calor

Muitos empreendedores estão investindo firme em proporcionar uma experiência mais agradável à clientela. Após inaugurar, ainda no inverno, a “laje” de seu Sofia, na acalorada Praça da Bandeira, a chef Kátia Barbosa tratou de modificar completamente o ambiente do bar para receber os comensais no verão. “Era o inferno na Terra”, dispara. Ela então instalou no terraço um toldo, uma estrutura de tecido retrátil e três climatizadores, que a partir de gelo liberam vento umidificado com água fresca, além de um chuveirão, plantas e cadeiras de praia. “Era o mínimo para usarmos o espaço, que é para brincar, fazer bagunça”, diz a chef, que planeja servir ali café da manhã aos domingos. Mesmo o salão climatizado do primeiro andar foi adaptado: além da chegada de mais um aparelho de ar condicionado, a forração do teto será trocada, a fim de proporcionar maior conforto térmico. E nada como a natureza para ajudar — Kátia comprou uma jabuticabeira de 2 metros de altura para fazer sombra na entrada da casa. “Comecei com o Aconchego Carioca neste bairro, em 2002, e só em 2009 fomos ter ar refrigerado. Agora, não dá. A sensação de calor piorou bastante”, reconhece ela, que vê os reflexos dos elevados termômetros inclusive na opção por refeições mais leves e no horário: muitos preferem comer mais tarde, quando o sol dá uma trégua.

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Sombra e água fresca: protocolo da prefeitura indica 59 pontos de resfriamento, como o Parque Rita Lee
Sombra e água fresca: protocolo da prefeitura indica 59 pontos de resfriamento, como o Parque Rita Lee (Beth Santos/Prefeitura do Rio de Janeiro)

Os efeitos do calor avassalador também se fazem notar nas noitadas. No Circo Voador, na boêmia Lapa, o “Xuverão” (escrito assim mesmo) que havia sido incorporado à temporada de verão, como mais uma bossa desse lugar que vive de inventar moda, este ano foi substituído por uma instalação aquática — a Água Viva, de jato mais suave. “Começamos a perceber que a galera não queria se molhar muito, então pensamos em um volume de água menor e mais pulverizado. A ideia é só refrescar mesmo, não tomar um banho de fato”, explica a produtora e designer Gaby Morenah, integrante do coletivo, lembrando que, como o local é aberto, nesta época do ano ganha ares de clube. “A gente incentiva que venham de maiô, canga e chinelo.” Logo ao lado, na Fundição Progresso, o chuveirão lançado no ano passado não só foi mantido no terraço como agora há uma segunda opção, na varanda voltada para os Arcos. A medida foi tomada porque o local será endereço de mais eventos, como os ensaios da Orquestra Voadora, nos domingos de janeiro e fevereiro. “Com a escalada do calor e do número de pessoas, a preocupação cresce”, diz Gaby. Ela representa uma numerosa turma que anda suando para proporcionar bem-estar a todos.

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