Nosso velho conhecido, o desastre, desta vez foi democrático: a chuvarada que começou a desabar na noite da segunda-feira (19) e, copiosa, avançou pelo dia seguinte, espalhou alagamentos, sujeira e transtornos por cerca de quinze bairros cariocas — do Jardim Botânico à Freguesia, de Laranjeiras à Tijuca, da Barra a São Cristóvão, passando por Botafogo, Catete, Centro, Lapa, todos unidos num tremendo aluvião. Alguns exemplos do estrago: o aguaceiro fez transbordar o Rio Maracanã, levando peixinhos a nadar nos quintais da vizinhança, derrubou árvore no Alto da Boa Vista, interditou a Rua Jardim Botânico e a Avenida Borges de Medeiros e banhou as dependências da estação BRT do Morro do Outeiro (frequentada pelo público da Rio 2016). Ao longo da quarta-feira (21) o tempo deu uma trégua, mas ainda choviam reclamações. Alvo mais vistoso, o prefeito Marcelo Crivella concedeu entrevista diante de um barranco desmoronado no Cosme Velho e parecia aliviado. “Passamos no teste”, disse, não sem levantar controvérsia. O descontentamento geral foi alimentado por notícias como a de que o orçamento da Secretaria Municipal de Conservação e Meio Ambiente (Seconserma) sofreu um corte de mais de 60% — o que poderia prejudicar, por exemplo, a limpeza das galerias de escoamento. O titular da secretaria, Rubens Teixeira, autor best-seller de títulos como As 25 Leis Bíblicas do Sucesso e Sociedade com Deus, culpou os céus, não sem razão. De fato, choveu mais (em alguns pontos, muito mais) durante 24 horas do que o previsto para o mês inteiro. E, seguramente, o fenômeno vai se repetir. Causa preocupação, portanto, a suspeita de que as autoridades atuais foram tão surpreendidas pela tempestade quanto os passageiros do ônibus 584 flagrado quase boiando no Jardim Botânico. Ou, ainda, a constatação de que os piscinões subterrâneos da Praça da Bandeira e da Tijuca, obra milionária da gestão passada, não evitaram as inundações recorrentes na região.