Polêmicas na psiquiatria: canabidiol, teste genético e exame radiológico
Especialistas debatem sobre novidades na especialidade psiquiátrica
Qual a real utilidade do uso de exames de imagem em tratamentos psiquiátricos? Quais seriam os exames indicados e para quais doenças? Os testes farmacológicos são capazes de auxiliar no diagnóstico e em tratamentos? Canabidiol e THC realmente funcionam? Para tratar o que? Muitas destas perguntas foram respondidas na palestra on-line “Avanços polêmicos em psiquiatria”. Aproveito este espaço para compartilhar um pouco do rico conteúdo que surgiu deste encontro.
O psiquiatra José Alexandre Crippa, Professor Titular do Departamento de Neurociências e Ciências do Comportamento da USP, explicou que o sistema endocanabinoide atua na regulação de vários aspectos do corpo humano como dor, humor e processo inflamatório, por exemplo. “Com a descoberta do receptor do sistema endocanabinoide, abriu-se a possibilidade de novos medicamentos serem criados”, disse, lembrando que o que existe de cientificamente comprovado é o uso do canabidiol para casos raros de epilepsia refratárias e a combinação de THC com canabidiol para dores e espasmos na esclerose múltiplas.
Para o psiquiatra Marcelo Allevato, Mestre pelo IPUB UFRJ, membro Titular Sênior da ABP e Diretor Secretário da APERJ, a testagem farmacogenética foi se sofisiticando ao longo das décadas, porém sua eficiência é questionável. “Com o advento da informática médica se criou uma série de algoritmos computadorizados que geraram uma promessa de simplificação da prescrição, ou seja, eu poderia passar a prescrever apenas com base na interpretação dos testes farmacogenéticos que seria feito por um algoritmo – que é uma caixa preta – e isso na verdade não tem evidência suficiente. Hoje existem testes comerciais muito caros que, na verdade, são utilizados de uma maneira exagerada”, afirmou Allevato.
Segundo ele, o que interessa aos pacientes é a capacidade do médico de prever interações medicamentosas e prevenir efeitos colaterais. “As empresas que fazem os testes farmacológicos tentam vender a ideia de que analisar um número enorme de genes relacionados principalmente a muitas enzimas de metabolização e alguns alvos farmacológicos teria um efeito decisivo na nossa decisão prescritiva. No entanto, isso nunca foi comprovado. Estudo o assunto há mais de 20 anos, mas eu não confio nos algoritmos, até porque, muitas vezes, a publicidade que se vende não corresponde ao que realmente foi testado no paciente. É como achar que um Volkswagen vai ter o mesmo desempenho de um Fiat, só porque os dois são carros”, resumiu.
O terceiro integrante do encontro, o psiquiatra Marcos Gebara, Professor da Pós-Graduação em Psiquiatria da PUC-Rio, especialista em Bioética e Presidente da APERJ, lembrou que o surgimento da ressonância magnética – em complemento à tomografia computadorizada – abriu novas possibilidades para o uso de exames de imagem no diagnóstico em psiquiatria. O especialista, no entanto, ressaltou que esses exames de neuroimagem não estão validados para serem usado com esta finalidade, mas servem como reforço nas possibilidades de diagnóstico e no acompanhamento do tratamento. “Estamos tão acostumados a ver certas alterações que permitem apostar em hipóteses de diagnóstico. Mas para padronizar, seria preciso estabelecer parâmetros firmes como, por exemplo, o uso do mesmo aparelho sempre, mas isso não é possível”, explicou.
Se você tem interesse em se aprofundar nestes temas, confira o encontro na íntegra na página da Espaço Clif no Youtube.
Analice Gigliotti é Mestre em Psiquiatria pela Unifesp; professora da PUC-Rio; chefe do setor de Dependências Químicas e Comportamentais da Santa Casa do Rio de Janeiro e diretora do Espaço Clif de Psiquiatria e Dependência Química.