Decidimos, hoje, pelo fechamento de nossos três restaurantes por tempo indeterminado. O coronavírus foi, obviamente, a causa.
Em 21 anos, desde a fundação da empresa, a incerteza veio de mãos dadas com todas as decisões tomadas, mas não desta vez.
Empreender, sei lá o motivo, estava no meu sangue desde o início. Minhas bonecas, acreditem, não viviam de penteados ou modelitos: trabalhavam em escritórios de grandes empresas, tomando decisões. Quando ganhei um gravador de meu pai, daqueles trambolhos antigos com botões, fingia que era um “speaker” como os que via em filmes, em que o chefe falava com a secretária, e gravava mensagens de um para o outro. Eu, claro, era ambos.
Ser ambos não é fácil.
Como empresária, me aperta o peito perder qualquer receita; inclusive abrir mão de operar em capacidade mínima, como determinou o Governo neste estado de emergência. Terei de enfrentar uma montanha de contas a pagar, de um lado, sem um tostão furado entrando do outro.
Parece um poço sem fundo que não tenho energia pra escalar; ainda assim, não tive dúvidas quanto à decisão de fechar. Simplesmente porque jamais teria a consciência tranquila ao expor pessoas a um risco absurdo, num Brasil com um sistema de saúde em colapso, leitos em falta e transportes coletivos deficientes e, ainda, abarrotados.
Chegamos neste estado calamitoso de coisas por diversas razões, mas para a frente é que se anda. No meio da crise tem uma peste e, já que reclusão é inevitável, passemos à reflexão.
Em situações emergenciais, é importante decidir o que é prioritário. Para mim, o importante é, nesta ordem: salvar vidas, preservar empregos e pagar salários.
Não se salva vidas trabalhando a 30%, porque a estrutura está lá. Melhor fechar cozinhas, fábricas, isolar pessoas. Não venderemos NADA por pouco tempo, mas é ainda melhor que vender pouquíssimo por muito tempo, colocando em risco o maior ativo do nosso negócio: funcionários e clientes.
Preservar empregos é o segundo desafio. Precisamos conversar com as equipes, já. Garçons chegam a perder 40% de suas receitas sem as comissões. Ouvi-los, participar de suas dificuldades, entender o elo fraco é importante. Fiquei emocionada com meus diretores, por exemplo, que abdicaram de 25% dos seus salários enquanto passamos por esta fase.
E como pagar a todos, se o dinheiro não entra? Temos de ser rápidos. Não basta contar com o adiamento dos prazos de pagamento do Fundo de Garantia ou com o diferimento do Simples – medidas sinalizadas pelo Governo, hoje. Locadores de espaços para restaurantes terão de entender que esta crise pode quebrar o País e sugiro que flexibilizem seus contratos de locação, sob o risco de não haver ninguém que alugue nada, amanhã; devemos colocar em férias todos aqueles que já estão em época de goza-las; e ainda, conversar com cada fornecedor buscando acomodar ambos os lados e enfrentar a montanha de boletos com a faca entre os dentes.
Como eu disse antes, é difícil ser ambos.
Sejamos, ao mesmo tempo, patrões e empregados, contratantes e contratados, governo e povo. Sejamos solidários e empáticos. A questão é humanitária.
Restaurantes empregam um mundaréu de gente. Sustentamos cidades, atraímos viajantes, alimentamos pessoas, celebramos aniversários, festas, formaturas e casamentos. Tenho muito orgulho de trabalhar com isso há 21 anos e não vou parar agora.
Que todos passemos por este furacão rapidamente e possamos brindar, a plenos pulmões: À NOSSA SAÚDE!