Essa cena cotidiana, retratada, nos anos 1950, pelo grande fotógrafo Alberto Ferreira, pode nos parecer curiosa, mas era muito corriqueira no Rio de Janeiro de antigamente.
Nessa época, os bondes elétricos ainda circulavam por toda a cidade e o percurso dessas viagens nem sempre era ininterrupto. Como eram alimentados por fios de eletricidade que estavam suspensos ao longo dos trilhos, os bondes precisavam se conectar à sua fonte de energia. Para isso serviam os “chifres” do bonde, apelido dado aos coletores — “antenas” que conduziam a eletricidade dos fios até o motor.
Volta e meia acontecia, principalmente nas curvas, do “chifre” do bonde se desconectar da fiação. E o bonde simplesmente parava de funcionar. Mas isso não chegava a ser um considerável transtorno. A solução era fácil e rápida, porém extremamente arriscada.
Nas fotos, o motorneiro de um bonde da linha 33 — que fazia o trajeto Lapa-Praça da Bandeira — sobe até o teto do veículo, a fim de trazê-lo de volta ao normal. O conserto era fácil; bastava reposicionar o “chifre” na fiação, acionando uma mola em sua base.
Fiquei me perguntando se esses condutores não corriam o risco de receber uma descarga elétrica fatal, sem o uso de equipamentos de proteção individual para realizar essa simples porém perigosa tarefa.
Os passageiros do bonde 33 provavelmente haviam aproveitado a breve parada em frente ao quiosque do Largo da Lapa para tomar um “hidrolitol” geladinho ou comprar um bilhete da loteria.
Reparo feito e o bonde 33 já estava pronto para seguir viagem.
Os bondes elétricos circularam na Guanabara até 1963, quando o governador Carlos Lacerda aposentou esse meio de transporte tão tradicional. Apesar de muito querido, o bonde estava sucateado e já era insuficiente para um Rio cada vez mais populoso.
*Daniel Sampaio é advogado, memorialista e ativista do patrimônio cultural. Fundou o Instagram @RioAntigo e é presidente do Instituto Rio Antigo.