Há exatos 108 anos, em 8 de setembro de 1915, um dos crimes políticos mais infames da nossa História, aconteceu, em plena luz do dia, bem ali na Praça José de Alencar, no Flamengo.
O Senador gaúcho Pinheiro Machado, após sessão do Palácio Conde dos Arcos (atual Faculdade Nacional de Direito, onde era o plenário do Senado), vai ao luxuoso Hotel dos Estrangeiros para reunir-se com o colega paulista Albuquerque Lins.
No saguão do hotel, é pego de surpresa pelas punhaladas covardes pelas costas de seu conterrâneo Manso de Paiva, ex-policial e padeiro desempregado que havia viajado do Rio Grande do Sul até o Distrito Federal para o cruel projeto.
Pinheiro Machado é amparado pelo colega e por funcionários do hotel. Logo, a notícia corre e mais senadores e deputados chegam ao estabelecimento, tradicional ponto de encontro da vida política — agora lugar de morte. O Hotel dos Estrangeiros, em vez de negociatas e acordo, presencia um velório. Pinheiro Machado é velado em cima de uma simples cama de ferro; o que o hotel podia providenciar no momento.
Facilmente detido, sem oferecer resistência, Manso de Paiva alega ter agido por conta própria sem nenhum mandante ou cúmplice. O motivo? Queria dar um fim às ações políticas de Pinheiro Machado, sobre as quais lia na Imprensa; principalmente no Correio da Manhã, jornal carioca a que tinha acesso em terras gaúchas.
O Correio da Manhã era, aliás, o maior inimigo declarado de Pinheiro Machado, o “eterno” vice-presidente do Senado na República Velha. Edmundo Bittencourt, dono do jornal chegou inclusive a ser desafiado pelo Senador a um duelo na Praia de Ipanema anos antes. Bittencourt saiu do evento com um tiro na perna, dado, segundo dizem, por ato cavalheirismo e misericórdia do Senador.
Pinheiro Machado era um dos homens mais poderosos da Primeira República. Tinha muitos inimigos, inclusive o ex-presidente Nilo Peçanha. Boatos dão conta de que o assassino, Manso de Paiva teria pernoitado na residência de Peçanha na véspera. Nada foi confirmado.
Manso de Paiva faleceu, já em liberdade, nos anos 1960, confirmando sua autonomia em relação ao crime. Matou o Senador porque quis. Teria sido influenciado por uma Imprensa sensacionalista? Teria ele algum transtorno mental?
O Hotel dos Estrangeiros não durou muito tempo depois dessa tragédia e foi demolido nos anos 1930. Hoje, no lugar, fica o monstrengo edifício Simon Bolívar (onde, no térreo, estão o Planalto do Chopp e o Tacacá do Norte).
Uma curiosidade sobre o local do crime, o Hotel dos Estrangeiros: ele aparece na logomarca do Instagram @rioantigo (que este colunista criou e administra). É o edifício do lado esquerdo da logo, ainda com sua fachada neoclássica, conforme foto de 1865 que utilizamos como base para o design.
Outra curiosidade: o punhal usado por Manso de Paiva, a arma do crime, está na reserva técnica do acervo do Museu da República, Certamente um artefato relevante para os rumos da nossa história republicana.
São tantos os crimes políticos do nosso país. Muitos deles cometidos aqui na nossa cidade, a antiga capital. E, no que se refere a homicídios políticos mais recentes, o Rio de Janeiro como capital e sede da milícia continua sendo cenário e protagonista desses absurdos.
E você? Se lembra de algum assassinato político ocorrido na nossa cidade?
Daniel Sampaio é advogado, pesquisador, ativista do patrimônio e criador da página @rioantigo no Instagram.