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Daniel Sampaio

Por Daniel Sampaio: advogado, ativista do patrimônio, embaixador do turismo carioca e fundador do Instagram @RioAntigo Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
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Na Brás de Pina do início do século XX, a criminosa privatização da água

Caso foi noticiado em novembro de 1915, pelo jornal “A Noite”, e mostra como o patrimonialismo e o clientelismo estão arraigados no Brasil

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19 jan 2024, 16h17
Um homem de chapéu está parado ao lado de uma fonte de água. Lê-se uma manchete de jornal dizendo "Na terra dos monopólios, um senhor de casas e águas"
O Sr. Manoel Ignácio Rodrigues posa ao lado de sua "fonte"...de rendas, em Brás de Pina (Jornal “A Noite” - 12/11/1915 - Hemeroteca da Biblioteca Nacional/Reprodução)
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Em novembro de 1915, o jornal “A Noite” denunciou um caso muito peculiar e bem típico do patrimonialismo e clientelismo do nosso país. Naquela época, a falta d’água era um problema grave e corriqueiro que afetava as residências situadas entre as estações ferroviárias de Brás de Pina e da Penha, no subúrbio da Leopoldina. Esse problema parecia afligir apenas as pessoas menos favorecidas daquela região ainda rural, enquanto os mais abastados simplesmente tinham a questão resolvida. Ocorre que a Diretoria de Águas e Obras Públicas, na Prefeitura do Districto Federal, concedia privilégios a todo aquele que tivesse “boas” relações com os engenheiros dos distritos onde moravam.

Um desses cidadãos que tinham muitos “bons conhecimentos” na repartição de águas, Sr. Manoel Ignácio Rodrigues, era também proprietário de muitos terrenos em Brás de Pina. Esse senhor obteve a inusitada e privilegiada concessão de passar canos d’água por uma de suas propriedades. Essa tubulação galvanizada ia buscar água direto da fonte, na Estrada do Portinho, e terminava bem em frente à casa onde ele morava, em um dos terrenos.

Curioso foi quando os vizinhos do Sr. Manoel, moradores de um total de 2.000 casas, viram o cano abastecendo de água o terreno ao lado. Festejaram, batendo palmas, foi uma algazarra. Mas como alegria de pobre dura pouco, os vizinhos logo descobriram que, para acessarem essa água, teriam que convencer o Sr. Manoel a “puxar um ramal do cano que passa em seus terrenos”. Sem problemas. Mas para fazer isso, o Sr. Manoel cobrou a módica quantia de 50 mil réis de cada um.

“Houve protestos, mas quase todos tiveram de pagar — os que o puderam — ao feliz proprietário, o quinhão do privilégio imoral”, ironiza a matéria do jornal “A Noite”.

O Sr. Manoel explicou, sem nenhum pudor, ao repórter que logo vai requerer outro cano de 500 metros na Diretoria. E ainda acrescentou “que o seu privilégio é eterno e que o seu cunhado Manduca irá fazer o mesmo nas ruas ultimamente abertas na Penha”. A matéria termina com a pergunta (que só pode ser retórica): “Que dirá a isso o Sr. ministro da Viação?”

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Curiosamente, a reportagem do jornal “A Noite” tirou uma fotografia do Sr. Manoel Ignácio Rodrigues, o grande monopolista aquífero de Brás de Pina, posando orgulhoso ao lado de uma de suas “fontes” (de renda). No anos seguintes a essa história, Brás de Pina passou por um importante processo de urbanização, que a transformou na “Princesa da Leopoldina”, mas isso é assunto para outro momento.

*Daniel Sampaio é advogado, pesquisador, ativista do patrimônio e fundador do Instagram @RioAntigo.

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