A história de São Sebastião, santo padroeiro da nossa cidade, reflete, como a de nenhum outro, as características incomuns do Rio, como a sua diversidade —demonstrada nas esferas geográfica, cultural, social — assim como a sua grande capacidade de resistir a adversidades.
Assim como o Rio, o padroeiro viveu contradições e enormes dificuldades: sendo cristão e soldado romano quando os seguidores de Cristo eram punidos pelo Império, foi perseguido e torturado. Sua força e resistência para permanecer fiel aos seus princípios e crenças são exemplo para os sofridos cariocas. A imagem do santo fala por si: mesmo cravejado de flechas por todos os lados, mantém-se de pé.
Como todo santo popular, Sebastião tem uma história oficial e as histórias consagradas pelo povo, que lhe foram sendo atribuídas pela fé dos crentes. Em nossa cidade não foi diferente. O padroeiro é reverenciado por grupos diversos e de diversas maneiras.
A característica guerreira e resistente do santo católico foi assimilada pelas religiosidades africanas e indígenas, em sincretismo com a narrativa trazida pelos europeus. As flechas de Sebastião se tornam, assim, as flechas do orixá caçador Oxóssi, conhecedor da mata e da cura que vem das plantas. Caçador e curandeiro, Oxóssi é também considerado o chefe dos caboclos.
No catolicismo, é reverenciado como protetor contra as pragas e pestes. Isso fez que fosse acolhido também como padroeiro dos gays, grupo especialmente vitimado no início da epidemia de HIV-Aids. No momento atual, em que uma pandemia assola o mundo de forma tão dramática, o padroeiro do Rio nos recorda que devemos nos manter firmes.
Embora o Rio fosse oficialmente a “cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro”, o nome não foi conferido diretamente por causa do santo. Tratou-se de uma homenagem, através do santo, a D. Sebastião de Portugal e Algarve, rei de Portugal à época da fundação. Alguns fatos e coincidências ligam a história da fundação da cidade à do santo e à do rei.
Quando o Rio foi batizado, não se sabia que, dois anos depois, Estácio de Sá, fundador da cidade, morreria da mesma forma que o santo, após ter sido atingido por flechas em na Batalha de Uruçumirim, em 20 de janeiro de 1567, lutando pela expulsão dos franceses. Diz-se que o próprio santo teria aparecido na batalha. Já o rei Sebastião, desapareceria anos mais tarde também em uma batalha, esta no Marrocos, tornando-se, ele mesmo, uma figura de culto popular.
Neste momento difícil para todos, recordamos o dia do nosso padroeiro como uma oportunidade para pedir proteção para a nossa cidade, para o Brasil e o mundo, além de maior consciência do nosso povo para a manutenção permanente de todos os protocolos sanitários tanto quanto possível (distanciamento social, utilização de máscaras de forma correta, utilização de álcool em gel, evitar aglomerações). Que possamos ter a mesma firmeza com que Sebastião resistiu aos males que o perseguiram.
São Sebastião, rogai por nós!!!
*Texto feito em parceria com o advogado e tradutor João Freire, redator da Equipe Rio Antigo.
**Daniel Sampaio é carioca do Grajaú. Advogado, memorialista e ativista do patrimônio. Fundador do perfil @RioAntigo no Instagram.