Não é novidade nenhuma para quem acompanha essa coluna que sou uma entusiasta do edital Natura Musical. A plataforma de cultura da marca Natura é responsável por fomentar uma cena importantíssima dentro da cadeia produtiva da música há quase duas décadas através de seu edital. E isso é louvável e deveria ser exemplo para outras marcas. Não se investe em cultura com ações pontuais. A gente só muda uma realidade quando apostamos a longo prazo. Mas falarei sobre isso em outra coluna.
Nesta eu quero apenas informar a todos que as inscrições para a edição deste ano estão abertas e artistas, bandas, coletivos e festivais poderão enviar suas propostas. Mais uma vez, a prioridade da plataforma é apoiar projetos de artistas e regiões historicamente sub representados com seleções específicas para a Amazônia e para os estados da Bahia, de Minas Gerais, do Pará e do Rio Grande do Sul.
A grande novidade deste ano é uma categoria exclusiva para promover a música brasileira na América Latina, especialmente nos países em que a Natura tem atuação – Argentina, Chile, Colômbia, Peru e México.
O Natura Musical continuará selecionando novos trabalhos de artistas e bandas que queiram lançar álbuns ou circular em território nacional e coletivos, festivais e casas de shows que proponham programações e experiências ao vivo. Este ano o investimento da plataforma é de R$ 6 milhões. Deste total, R$ 2 milhões serão destinados a projetos nacionais, mantendo 20% desta verba para artistas e iniciativas da região Amazônica. Os outros R$ 4 milhões serão distribuídos para iniciativas nos estados da Bahia, de Minas Gerais, do Pará e do Rio Grande do Sul. Mais uma vez, a seleção será feita com a avaliação de uma rede de curadores do mercado musical.
Conversei com a Fernanda Paiva, Head of Global Cultural Branding, sobre a edição deste ano. Se você é produtor ou artista, vale conferir este papo:
Fabiane Pereira – A pergunta que não quer calar: quais as novidades do edital Natura Musical 2022?
Fernanda Paiva – Esse ano, acompanhando a expansão da marca Natura para a América Latina, também queremos projetar a música brasileira no mundo. Por isso, no edital Nacional abrimos uma nova categoria para artistas que já tenham um reconhecimento da crítica, do público e do mercado e que desejam expandir suas conexões para outros territórios. Abrimos espaço para turnês e projetos internacionais que passem por países da América Latina – principalmente Argentina, Chile, Colômbia, Peru e México, estabelecendo intercâmbios com as cenas locais.
FP – Em que a edição deste ano se difere das dos anos anteriores?
Fernanda Paiva- Estamos incentivando a retomada das experiências ao vivo. Tanto para artistas como para bandas, vamos estimular o lançamento de novos trabalhos, mas buscamos pelo menos uma experiência presencial – show, turnê. Entre os coletivos e projetos de fomento da cena, direcionamos para para casas de show, festivais e programações que movimentam a cena musical e contribuem na expansão de público e formação de plateias. Além disso, tivemos evoluções nos nossos critérios, que consolidam o nosso compromisso com diversidade e inclusão ao mesmo tempo que abrem espaço para a criatividade e o frescor da nossa música. Continuaremos com a nossa ação afirmativa de destinar 20% dos nossos recursos para a região Amazônica.
FP – O Natura Musical já há alguns anos têm apoiado projetos e artistas historicamente sub representados. Sob esse aspecto, como será esse ano?
Fernanda Paiva – Esse é um trabalho contínuo, que a gente avança a cada ano. De fato, a pluralidade é um direcionador das nossas escolhas há alguns anos. O edital já vinha fazendo esse movimento e tivemos, em outras edições, artistas muito emblemáticos em seus discursos conectados à diversidade e à inclusão. A cada ano renovamos nossos critérios, categorias e processo de curadoria para deixar as nossas escolhas mais intencionais. Estamos caminhando para olhar essa representatividade de forma transversal – do palco às equipes técnicas. O retrato da nossa última seleção revela a interseccionalidade, com mais da metade da cesta com projetos de mulheres, mais de metade da cesta de artistas negros, artistas LGBTQIA+, indígenas de diversas cenas – nos projetos individuais mas também nos coletivos (como Favela Talks, Mostra Pankararu, Pagode por Elas, Crias de Curupira, entre outros). Também estamos atentos à distribuição dos recursos e no último ano, mais do que os 20% estipulados para a Amazônia foram destinados a projetos da região.
FP – Quanto que a marca vai direcionar para os projetos selecionados este ano?
Fernanda Paiva – Completando 17 anos de plataforma cultural, Natura Musical vai disponibilizar R$ 6 milhões no Edital Natura Musical 2022. Deste total, R$ 2 milhões serão destinados para o Edital Nacional (que em mais um ano destina 20% para projetos da região amazônica) reafirmando seu compromisso com o fortalecimento da cultura local. E assim como nas edições anteriores, teremos os editais regionais que destinará R$ 1 milhão para o Pará, via Lei Semear, R$ 1 milhão para a Bahia, via Lei FazCultura, R$ 1 milhão para Minas Gerais, via Lei Estadual de Incentivo à Cultura de Minas Gerais – LEIC e R$ 1 milhão para o Rio Grande do Sul, via Lei Pró-Cultura.
FP – Quais as categorias desta edição?
Fernanda Paiva – Nesta edição, o Edital se concentra em 3 categorias: Música Brasileira na América Latina (edital nacional), que busca conexões com a cena latino-americano, voltada para artistas e bandas com reconhecimento de público, crítica e mercado, mirando resultados que podem ser desde novos produtos (álbum, EP, clipe), até turnês por países onde a Natura atua; Novos Trabalhos (edital nacional e regional), focado no fortalecimento de artistas em ascensão e/ou consolidação da carreira e Circulação e Programação ao Vivo (nacional e regional), para fomentar iniciativas que estimulem o presencial seja com festivais, projetos especiais ou programação de casas noturnas, mirando no fortalecimento e criação de público.
FP – Quais os critérios de seleção para a escolha da curadoria que vai analisar os projetos este ano?
Fernanda Paiva – Todos os anos reunimos uma rede de curadores formada por artistas, produtores, jornalistas, empreendedores e profissionais de diferentes origens e trajetórias no mercado musical para avaliar os projetos, tanto individualmente como coletivamente. Entre os critérios estão a relevância musical da proposta, a autenticidade em suas linguagens, analisamos suas narrativas e os impactos que elas causam na cena, quais são suas capacidades de mobilização, além do frescor que ela traz. Isso sem contar no compromisso com o impacto positivo e qual o seu potencial de conexão com diferentes públicos e redes.
FP – Projetos musicais como livros, pesquisa e eventos poderão ser contemplados na edição deste ano?
Fernanda Paiva – Nesta edição nosso desafio é essa expansão que promova um intercâmbio com a cena latino-americana, além do foco na formação de público, estimulando a experiência do ao vivo, seja através de festivais, turnês ou programações em casas de show ou centros culturais. Projetos de livros e pesquisa podem entrar como lançamentos na categoria de novos trabalhos, desde que também promovam algum tipo de experiência ao vivo.
FP – Quais projetos contemplados nos últimos anos de edital que surpreenderam a marca em relação a visibilidade, amplificação e conexões?
Fernanda Paiva – Em 17 anos de existência, a plataforma cultural Natura Musical já apoiou mais de 600 projetos de todo o país. Todo ano temos projetos que se destacam em premiações, como os últimos discos de Elza Soares, Juçara Marçal, Margareth Menezes e Amaro Freitas. Também temos nomes que consolidam novos momentos de carreira de artistas como Rico Dalasam, Letrux, Tuyo, Mariana Aydar. Todo ano também temos encontros inéditos, como o que Russo Passapusso prepara em parceria com os mestres Antônio Carlos e Jocafi. Eles lançam logo mais o álbum Alto da Maravilha, um projeto histórico, afetivo e identitário, que reúne diferentes gerações baianas em parcerias inéditas. Outro exemplo é o projeto Os Amantes, que reúne Jaloo e a banda Strobo. Na programação ao vivo, destaque para a terceira edição da Mostra Pankararu de Música, que promove a visibilização e o fortalecimento do povo Pankararu, originário de Jatobá e Petrolândia, interior de Pernambuco. Em Brasília, teremos esse ano o projeto Favela Talks, um desdobramento do projeto Favela Sounds, que fomenta e dá projeção para a periferia do Distrito Federal.
FP – Quais os desafios do Natura Musical para se reinventar todos os anos num edital que é considerado o mais importante edital de música do país?
Fernanda Paiva – Para nós, o Edital é um momento importante do ano para nos conectarmos com diferentes perspectivas e experiências, além de renovar nosso olhar sobre a cena musical. Ao mesmo tempo que o Edital nos traz frescor, novas referências, é também um momento que apontamos novos caminhos, indicamos para onde estamos olhando. Como visão de longo prazo, a Natura Musical tem esse papel de materializar a essência da marca Natura, que a cada ano vai acrescentando novas camadas. Nesse momento de expansão, a plataforma assume esse papel de projetar a música brasileira para outras geografias, a fim de valorizar esse patrimônio de humanidades. Ao mesmo tempo, consolidamos o nosso compromisso de fomento à música aqui no Brasil, evoluindo as demais categorias, critérios e também o processo de curadoria, reforçando nossos compromissos para gerar impacto positivo.
FP – Como gestora, quais são os grandes desafios do setor cultural para o próximo ano considerando que estamos saindo de uma pandemia num cenário sem incentivo governamental?
Fernanda Paiva – O ano de 2022 é um ano marcado pela retomada do setor cultural, com atividades presenciais: artistas lançando novos trabalhos, turnês voltando para a estrada, novas casas de show surgindo, a volta dos festivais e as marcas voltando a investir no setor. É um novo começo, em uma cena que teve muitas restrições nos últimos anos. Acreditamos que essa retomada ainda vai demandar esforços e investimentos coletivos e institucionais. A nossa convivência com o mercado nos ensinou que um ambiente mais sustentável é fruto de uma combinação de políticas públicas, investimento privado e financiamento da própria cadeia e do público. Não vemos uma solução única, que atenda a todas as demandas de um mercado que é tão diverso. Nosso papel é manter o olhar atento e um diálogo com o mercado, com outras instituições, empresas e governos para construir caminhos, influenciar estruturas e ampliar o impacto das nossas ações.