Fabiano Serfaty

Por Fabiano M. Serfaty, clínico-geral e endocrinologista, MD, MSc e PhD. Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Saúde, Prevenção, Tratamento, Qualidade de vida, Bem-estar, Tecnologia, Inovação médica e inteligência artificial com base em evidências científicas.
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Câncer de pele: por que não devemos ignorá-lo

Responsável por 30% de todos os tumores malignos registrados no Brasil, esse tipo de câncer apresenta altos percentuais de cura, se detectado precocemente

Por Fabiano Serfaty e Gabriella Campos
Atualizado em 23 Maio 2017, 13h38 - Publicado em 23 Maio 2017, 12h18
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  • Mais comum no país, sendo responsável por 30% de todos os tumores malignos registrados no Brasil, o câncer de pele apresenta altos percentuais de cura, se detectado precocemente. Ainda assim, muita gente subestima sua capacidade de matar, como qualquer outra doença do temido grupo. A boa notícia é: de fato, a maioria dos casos é reversível. No entanto, com um pouco mais de cuidado, cirurgias mutilantes e com consequências deformadoras poderiam ser largamente evitadas.

    A doença acomete desde crianças até idosos, atingindo sobretudo pessoas de pele clara, sensível à ação dos raios solares, ou com doenças cutâneas prévias. A seguir a dermatologista Gabriella Campos esclarece as principais dúvidas, prevenção, detecção, tratamento e outros assuntos relacionados ao câncer de pele.

    Fabiano ­­– Por que o câncer de pele é o mais comum?

    Gabriella – A pele é o maior órgão do corpo humano e toda a exposição solar fica acumulada nela, desde a infância. A médio e longo prazo ocorrem mutações que, se não reparadas pelo organismo, podem dar origem a cânceres naquela região. Existem doenças raras, porém clássicas na dermatologia, como o Xeroderma Pigmentoso, em que a criança não apresenta a capacidade de regeneração do DNA lesado pelo sol e desde muito cedo, neste caso, apresenta dezenas a centenas de cânceres de pele naquelas áreas expostas aos raios solares.

    Fabiano – O câncer de pele deve ser encarado como perigoso?

    Gabriella – Claro, ele pode matar! E mais do que isso: essa informação tem que ser mais divulgada. Grande parte da população, dos leigos à classe médica, encara o câncer de pele como um “cancerzinho”. Felizmente, a maioria não mata, mas recebemos todos os dias no INCA (Instituto Nacional de Câncer, referência em saúde pública no tratamento da doença no país) pacientes com lesões avançadas, grandes, múltiplas, e que, no mínimo, terão de ser submetidos a cirurgias mutilantes e deformantes.

    Fabiano ­­ – Como prevenir então?

    Gabriella –  A informação e o bom senso são sempre bons aliados na luta contra o câncer. Como toda doença deste vasto grupo, quanto mais precoce a detecção, mais efetivo o tratamento. Muitos cânceres de pele são curados com uma simples cirurgia. Quanto mais clara a pele e menos melanina, mais ela tende a sofrer queimadura por exposição à radiação ultravioleta. Até a década de 70 não se falava em proteção solar, prova disso é que os primeiros protetores vendidos no mercado tinham também fator de bronzeamento. Àquela época, saudável era ter uma pele dourada, bronzeada. No entanto, a melhor proteção é não chegar no estágio de queimadura solar, à pele ardida, descascando. Bolha pelo sol então é marca direta no DNA, significa que alguma consequência na pele ocorrerá. Hoje temos que ter em mente que devemos evitar queimadura, ardência e bolha!

    Fabiano ­­ – E se a pessoa já contraiu, como identificá-lo?

    Gabriella –  O câncer de pele pode ser desde uma ferida que não cicatriza e que sangra fácil até um caroço áspero que cresce rápido ou até mesmo uma mancha ou pinta que vai se modificando.

    Fabiano ­­ –  Peles mais escuras podem ter câncer de pele?

    Gabriella –  Podem, claro! Dou sempre o exemplo do cantor Bob Marley, negro e jovem, que morreu de melanoma iniciado no dedo do pé e que se espalhou para todo o organismo. O melanoma, o mais letal dos cânceres de pele, pode ocorrer inclusive independentemente do sol, em áreas escondidas, mas também é mais frequente em áreas expostas ao sol (dorso, nos homens, e pernas, no caso das mulheres).

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    Fabiano ­­ – Sol então é totalmente proibido ?

    Gabriella –  Sol é vida! Não contraindico o sol, nem para meus pacientes que já tiveram câncer de pele. Contraindico a queimadura solar, são coisas completamente diferentes! Moderação e bom senso! Explico que o sol que incidirá na pele é o que podemos controlar. A roupa do dia a dia já é um protetor de barreira. Agora, os hábitos do paciente indicam se ele tem que usar mais ou menos protetor solar. Se é esportista, por exemplo, se é muito branco, deve se proteger mais, obviamente. Não ficar tantas horas seguidas diretamente no sol sem nenhuma proteção. Mas o sol que já acumulou não tem jeito, a pele tem memória. Esse já fez o dano e esses pacientes deverão ser monitorados daí para a frente.

    Fabiano ­­– Como lidar como o índice UV, ou seja, o número que indica a intensidade da radiação solar naquele instante?

    Gabriella – Hoje temos aplicativos no celular superacessíveis e que nos dão a previsão do tempo e o índice UV. Acho muito útil para saber se devemos levar o guarda-chuva e se precisamos usar ou reaplicar o protetor solar. Índice UV acima de 4 já significa sol forte e que pode deixar a pele ardida.

    Fabiano – E a relação do sol com a Vitamina D?

    Gabriella – Hoje temos uma verdadeira epidemia de déficit de Vitamina D. Novamente aqui o bem senso é essencial. Em países de clima temperado e sem sol a suplementação de Vitamina D é indicada desde a infância. Em nosso país tropical, teoricamente ninguém deveria ter este déficit, pois 15 minutos de sol em apenas 5% de superfície corporal 3 vezes por semana já seria suficiente para o sol fixar a Vitamina D nos ossos. A questão é que o sol necessário para converter a Vitamina D que recebemos na alimentação é o sol do pior horário, o sol UVB, (das 10h as 14h). Mas é o sol que devemos evitar pois é o mais associado a câncer de pele e queimadura solar! Sim, o que fazer? Continuar se protegendo desse sol numa exposição maior, e se estiver totalmente exposto como na piscina ou praia e eventualmente, por pouco tempo no dia a dia, deixar uma parte do corpo exposta para receber o sol da Vitamina D. Mas, se sua pele é muito clara e mesmo pouco tempo de exposição a deixa ardendo, ou se você já teve câncer de pele e seu déficit de vitamina no sangue é grande, o ideal é também suplementar a vitamina D.

    Fabiano ­­ – Pele pintada tem mais chance de adquirir câncer de pele?

    Gabriella –  Pele com mais sarda significa mais sensibilidade acumulada ao sol, é para ser mais protegida e examinada. Pessoas com sinais ou pintas escuras, muitas vezes de caráter familiar, têm de fato mais chances de ter especialmente o melanoma, e deveriam observar mais a pele e procurar dermatologistas para serem examinadas periodicamente.

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    Fabiano ­­ – Pinta de nascença é sempre benigna?

    Gabriella –  É, sim, mas ainda assim acompanhamento é indicado ao longo da vida. Qualquer pinta, mesmo de nascença, se um dia começa a se modificar, escurecer, pode estar sofrendo alguma transformação maligna. No entanto, se ficam estáveis, podem ser apenas monitoradas. Vejo pacientes passando protetor solar apenas em cima da pinta. Não é esse o conceito, está errado. O risco de um câncer de pele surgir na pele é maior do que sobre um sinal pré-existente. Existem, contudo, sinais de nascença gigantes, mais raros, que têm mais riscos de transformação. Nestes casos, uma equipe multidisciplinar, composta de pediatra, cirurgião e dermatologista acompanha a criança já desde pequena.

    Fabiano ­­ – Que exame precisamos fazer periodicamente?

    Gabriella –  Um dermatologista treinado e experiente, com um bom olho médico,  faz a maioria dos diagnósticos. Mas hoje o dermatologista também tem seu “estetoscópico”, que em nossa especialidade leva o nome de dermatoscópio. Ele é capaz de disponibilizar mais informações sobre as lesões cutâneas, especialmente as pigmentadas. Se o paciente teve melanoma ou é muito pintado, ele pode ser mapeado com esse recurso, que permite documentar a pele toda do paciente por meio de fotos que ajudam no monitoramento dos sinais e na detecção de pintas novas e suspeitas.

    Fabiano ­­ –  O que o médico deve fazer para identificar ?

    Gabriella –  Examinar o paciente inteiro! O câncer pode estar em qualquer local da pele. Muitas vezes não é a queixa do paciente.  Pode estar no dorso, couro cabeludo, na planta do pé, ser uma pinta assintomática. Apenas examinando-o por completo podemos agir na prevenção secundária do câncer, que é o diagnóstico precoce. Além disso, todos os médicos generalistas deveriam também estar atentos às lesões cutâneas e alertarem sempre os pacientes em casos de suspeitas.

    Fabiano ­­ –  A quais características precisamos estar atentos para identificar uma pinta suspeita ?

    Gabriella –  O tão temido melanoma pode ser um sinal preto, novo, de crescimento rápido, ficar elevado ou ir crescendo para os lados e mudando de cor ou textura. O consagrado método ABCDE deve ser ensinado a todos, inclusive aos jovens, já que o melanoma não atinge apenas idosos, mas pode matar inclusive crianças. Funciona da seguinte maneira:

    A – Assimetria

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    B – Bordas irregulares

    C-  Cores distintas

    D – Diâmetro maior que 6 milímetros

    E – Elevação ou evolução, modificação

    Ou seja, um sinal estranho deveria motivar uma ida ao médico, ao dermatologista. Mas nós, especialistas, temos também que examinar os pacientes por inteiro, já que a pele é o maior órgão do corpo e o câncer de pele está ali, externamente, esperando pelo diagnóstico e o tratamento.

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    Fabiano ­– Você queria dar algum conselho final?

    Gabriella – A preocupação maior é alertar aos jovens, estes têm mais tempo de atividades de lazer e a maioria acha que câncer é doença apenas de idoso. O sol que acumulamos na infância até os 18 anos, especialmente com episódios de queimaduras, mesmo que esporádicos, já é suficiente para acarretar o câncer de pele mais tarde. O melanoma é uma das causas mais frequentes de morte entre adultos jovens. A população tem que saber que ele existe, mas se identificado precocemente pode ser curável.

    Gabriella Campos é médica formada pela UFRJ. Dermatologista pela Sociedade Brasileira de Dermatologia com especialização em Dermatologia Oncológica pelo INCA.

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