Por que você não deve acreditar nos movimentos anti-vacinas
Uma entrevista com o secretário estadual de Saúde, Luiz Antonio Teixeira Jr, sobre o assunto
A vacina é a forma mais segura e eficiente de proteção contra uma série de doenças, mas, apesar das evidências científicas incontestáveis quanto à segurança dos imunizantes, em todo o mundo é possível observar o crescimento de grupos contrários às vacinas. Principalmente na Europa, onde os casos de sarampo voltaram a ser registrados.
No Brasil, esses grupos encontram na internet um espaço livre para a divulgação de qualquer informação, sem qualquer base científica, com o objetivo de difundir diferentes teorias infundadas listando motivos para que adultos não vacinem seus filhos e nem a si mesmos. Para estes grupos, a decisão de vacinar-se ou não é vista como individual, excluindo sua responsabilidade para com toda a sociedade.
Vacinar-se é um ato em benefício do coletivo. É preciso que haja a compreensão: a partir do momento em que a escolha de um indivíduo se torna uma ameaça à saúde pública, ela passa a ser dever de todos nós para com a nossa comunidade.
O Programa Nacional de Imunização brasileiro é reconhecido internacionalmente como um dos mais eficientes do mundo e oferece os principais imunizantes de forma gratuita, nos postos de saúde em todo o país. A preocupação das autoridades é com a baixa adesão: o Ministério da Saúde já vem observando a queda do índice de cobertura no Sistema Único de Saúde. Em 2016, por exemplo, a segunda dose da tríplice viral, vacina que protege contra sarampo, caxumba e rubéola, foi tomada por apenas 76,7% do público-alvo.
Nem mesmo a vacina contra a gripe, utilizada há anos sem que tenhamos registros de reações graves, vem sendo procurada nos postos. Diante da baixa adesão, a campanha deste ano, que terminaria em 26 de maio, foi prorrogada por mais duas semanas – até esta sexta (9), Dia Nacional da Imunização. O estado do Rio de Janeiro tem, até o momento, menos de 80% do público-alvo imunizado – dentro deste público, o mais preocupante é o grupo prioritário formado pelas crianças com idades entre seis meses e menores de seis anos (menos de 500 mil foram vacinadas).
Confira a entrevista com o secretário estadual de Saúde, Luiz Antonio Teixeira Jr, sobre o assunto.
O estado do Rio vive um importante momento para a prevenção de doenças. Quais são os desafios enfrentados pelas autoridades de saúde pública agora?
A vacina contra a gripe é um bom exemplo para buscar respostas para esta pergunta: como é vista pela sociedade como uma doença simples, sem grandes complicações, não se observa na população a preocupação com a prevenção. Além da falta de informação, nossa cultura não é a de prevenção. É isso que precisamos tentar mudar, fornecendo informações confiáveis e esclarecendo as dúvidas das pessoas. No caso da gripe, é preciso lembrar que, entre os grupos prioritários – gestantes, crianças com idades entre seis meses e menores de seis anos, mulheres com até 45 dias após o parto e idosos a partir dos 60 anos –, a gripe pode evoluir para suas formas mais graves, podendo, inclusive, levar à morte. Desde o início do ano até esta quarta (7), 45 casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) foram notificados, sendo 10 deles causados pelo vírus Influenza B e outros três pelo vírus H1N1. Ao todo, já são oito óbitos no estado por SRAG, sendo três por Influenza B e dois por H1N1. Isso é preocupante. No ano passado, com o surto de H1N1 em São Paulo, decidimos antecipar a vacinação contra gripe no território fluminense para os grupos mais vulneráveis e a meta de vacinação no RJ foi atingida antes mesmo do fim da campanha. Não podemos deixar que a gripe se espalhe para que haja a preocupação com a prevenção.
Ainda há muitas dúvidas quanto à segurança da vacina e a possibilidade de reações. Como esclarecer à população sobre os benefícios das vacinas?
Acredito que a melhor forma ainda seja o esclarecimento por meio da informação, de fontes confiáveis, das conversas com médicos e profissionais de saúde. A história nos mostra que é preciso haver conscientização em larga escala. Na década de 60, o sarampo ainda era uma das principais causas da mortalidade infantil até a vacina começar a ser usada. Com a popularização do imunizante, a doença foi controlada na maior parte do mundo. Porém, recentemente, vimos notícias de que há números crescentes de casos em outros países – como na Europa, onde os grupos anti-vacinas se mostram mais fortes. As pessoas que se declaram contrárias à imunização alegam que este é um direito individual, porém, essa alegação não é válida, uma vez que representa um retrocesso e vai contra os avanços da medicina, oferecendo risco para todos. Vacinas salvam milhares de vidas todos os anos e é preciso que a população tenha essa consciência até para que tenhamos o efeito da “imunidade de rebanho”, ou seja, quando a maior parte das pessoas está imune e acaba não abrindo espaço para circulação de vírus entre as pessoas que não estão imunizadas. Mas, para isso, precisamos ultrapassar os 90% de cobertura vacinal. A nossa própria história nos mostra o caminho: considerada erradicada pela Organização Mundial da Saúde, a varíola, doença infectocontagiosa, só pode ser eliminada com o uso da vacina. E no Brasil, em 1904, o sanitarista Oswaldo Cruz foi duramente criticado ao tentar tornar obrigatório o controle de varíola com a vacina.
Como é possível garantir às pessoas que não há risco de eventos adversos ou reações graves por causa das vacinas?
Como qualquer medicamento, a vacina pode, sim, oferecer reações. Porém, é preciso deixar claro que as vacinas oferecidas pelo Sistema Único de Saúde são seguras e que, em geral, o risco de contaminação por um vírus é sempre muito maior do que qualquer efeito adverso que uma vacina possa oferecer. Obedecendo às indicações e contraindicações dos imunizantes, as chances de intercorrência são raras. Não há dúvidas de que as doenças são muito mais perigosas do que as vacinas. Esta é a mensagem a ser passada às pessoas.
Ainda analisando o cenário no Rio de Janeiro, além da gripe, está ocorrendo a vacinação contra febre amarela. É preciso ter algum cuidado por quem já se vacinou contra uma doença e ainda não se vacinou contra a outra?
Desde março, estamos adotando a estratégia de vacinação de bloqueio contra a febre amarela e, antes mesmo dos primeiros indícios de circulação do vírus no estado, solicitamos ao Ministério da Saúde a inclusão do Rio de Janeiro na área de recomendação da vacina. Isso significa que iremos vacinar toda a população do estado até o final do ano, de acordo com o fluxo de vacinas disponibilizadas pelo governo federal. No momento, nossa prioridade em geral é a imunização contra a gripe, porque o inverno se aproxima e, certamente, teremos aumento do número de casos. Outro ponto importante: estamos observando maior circulação do vírus da Influenza B, que não circulou de forma intensa nos últimos anos, o que faz com que nossa população esteja mais suscetível a infecção por ele. Isso também nos faz acender o alerta para a população. Quanto à vacina contra a febre amarela, não há qualquer contraindicação para que elas sejam tomadas juntas. Reforçando o que já foi dito, estamos em um momento crucial para a prevenção. A gripe nos preocupa diante da proximidade do inverno e da queda de temperatura, enquanto, em relação à febre amarela, vivemos um momento de antecipação, já que neste período do ano a incidência de casos costuma cair, principalmente pelos fatores climáticos. Mas é preciso se imunizar agora para garantir a proteção no futuro, quando o calor voltar, a partir de novembro. É importante que tenhamos nossa população protegida e é por isso que estamos sempre nos antecipando. A cultura da prevenção ainda não faz parte da nossa rotina, mas estamos certos de que essa é uma mudança necessária e que só vai acontecer com a conscientização da sociedade.
Luiz Antonio Teixeira Jr é médico ortopedista com MBA Executivo em Saúde pela Coppead – UFRJ e desde o início de 2016 ocupa o cargo de Secretário de Estado de Saúde do Rio de Janeiro