Instagram é coisa de velho. Facebook então, nem pensar. A rede social que está mobilizando os jovens no momento chama-se “BeReal”. E acredite: ela traz algumas vantagens diante das redes sociais do “passado”.
A proposta é simples. Como o próprio nome já diz, a rede se propõe “ser real”. Portanto, nada de filtros ou truques para se fazer passar por alguém que não é, com algum detalhe que não tem, em alguma situação irreal. Na “BeReal”, o que vale é a realidade do usuário, como uma Polaroid do instante presente.
O usuário do “Be Real” recebe um alerta de notificação por dia, em horários diferentes. A partir deste momento, ele tem apenas dois minutos para postar uma foto, independente de onde esteja, do que esteja vestindo, se a luz estiver boa ou não ou de como esteja arrumado. Se desperdiçar os 120 segundos daquele dia, fica de fora da rodada (e, como punição, o aplicativo veta o usuário de qualquer interação).
De acordo com seus criadores, a rede social foi desenvolvida para estimular a autenticidade a espontaneidade dos usuários – em oposição ao excesso de filtros e montagens do Instagram. Um dos recursos que confirmam esta intenção é que ao fazer a selfie, o usuário aciona a máquina fotográfica para registros frente e verso, independente do glamour de onde se esteja. Ou seja: é impossível ser “totalmente” falso. A adolescente pode até aparecer toda maquiada e bem vestida, mas… não conseguirá negar que estava em seu quarto, em mais uma tarde normal de estudo, por exemplo.
Outro ponto que pode soar um detalhe, mas que é relevante: é impossível fazer vários cliques e depois escolher apenas um. Apertou o botão, valeu. Além disso, para quem está acostumado a perder muitos minutos (ou seriam horas?) correndo o dedo no feed dos outros, certamente irá se decepcionar. Na timeline do Be Real só é possível ver as fotos de quem aceitar a sua amizade – e mesmo assim, apenas a foto daquele momento: nas páginas dos usuários não fica nenhum registro. Ou seja, é o fim daquele hábito bastante nocivo de ficar acompanhando a vida dos outros como se fosse novela ou série, tendo a certeza (equivocada) que eles são mais felizes a partir de uma simples imagem. A rede se resume a quem é, de fato, a sua rede. Nada de ter acesso às páginas da Beyoncé ou do Neymar.
A estratégia tem se provado bem-sucedida: em apenas alguns poucos meses a base de usuários cresceu mais de 1.000%, especialmente entre os mais jovens (que não querem ser usuários das mesmas redes sociais que seus pais e avós).
A notícia é, a princípio, positiva. Se não há ingênuos bem-intencionados no mundo dos negócios de tecnologia, por outro lado sabemos o quão nocivas as redes sociais existentes até agora pode ser. Elas podem trazer graves consequências à saúde mental de crianças e adolescentes que projetam naquela plataforma a única condição de felicidade possível. Por essa lógica, só se é alguém na vida real quando se tem algum reconhecimento na vida online. É uma confusão comum para quem nasceu no mundo digital, mas, de todo modo, extremamente nociva.
O “BeReal”, de alguma forma seguramente pensada e construída, não tem interesse que o usuário permaneça por muitas horas navegando. Outra prova disso é que não há hashtags ou sistemas de busca. São pontos que podem ter atraído os jovens pelo imediatismo e instantaneidade. Se eles permanecerão ali por muito ou pouco tempo, ainda é cedo para afirmar. Mas arrisco supor que, por todas essas razões, trata-se de uma rede com menor tendência à adição, a comportamentos compulsivos e nocivos à saúde mental de jovens. É um passo e tanto.
Fabio Barbirato é médico psiquiatra pela UFRJ, membro da Academia Americana de Psiquiatria da Infância e Adolescência e responsável pelo setor de Psiquiatria Infantil da Santa Casa do Rio. Como professor, dá aulas na PUC-Rio. Foi um dos apresentadores do quadro “Eu amo quem sou”, sobre bullying, no “Fantástico” (TV Globo).