O filme só estreia em julho. Mas bastou a produtora Warner Bros anunciar que a continuação de “Space Jam” não contaria com a presença do personagem Pepe Le Pew que a polêmica foi criada. O gambá conhecido por seu maus cheiro e insistência (sempre fracassada) na sedução foi acusado de “comportamento abusivo e incentivo à cultura do estupro”.
Passados quase 30 anos da primeira versão de “Space Jam”, talvez Pepe Le Pew – criado em 1930 – tenha se perdido no novo contexto histórico. Ou ainda pior: não tenha mais graça. São duas razões plausíveis para se banir um personagem de um desenho animado. Mas será que a sociedade ganhou abusadores nas últimas décadas por influência de personagens como Pepe Le Pew? Desenhos devem refletir apenas o mundo como ela deveria ser? Ou, tendo em vista seu viés educativo, também devem mostrar comportamentos inaceitáveis da sociedade?
Para Charles Blow, colunista do The New York Times, conteúdos infantis que propagam opressão estruturais como o machismo devem ser sumariamente banidos. Décadas depois de gerações que cresceram assistindo aos embates de Tom & Jerry e às implicâncias de Coiote & Papa Léguas, podemos acusá-los de nos fazerem mais ou menos violentos? Por via das dúvidas, o canal Cartoon Network optou, em 2013, por retirar “Tom & Jerry” do seu catálogo de desenhos animados, sob a alegação de serem politicamente incorretos.
Segundo a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), vários estudos internacionais comprovam os efeitos nocivos da exposição de crianças e adolescentes às imagens e conteúdos com menções diretas ou indiretas a situações de sexo, de violência, de emprego de linguagem imprópria ou de uso de drogas. E ressaltam ainda o período de extrema vulnerabilidade pela qual passam esses segmentos, com impacto em processos de formação física, mental e emocional.
Muita gente não sabe, mas “Peppa Pig” foi banida na Austrália, “Bob Esponja” em mais de 120 países, Pato Donald já foi vetado na Finlândia e “Shrek” em Israel. O que soa aceitável para uma sociedade não cabe de acordo com os valores de outra cultura.
Toda essa discussão reforça a minha percepção da relevância que os pais e responsáveis tem neste processo. São eles que devem arbitrar, com bom senso, sobre o conteúdo a que seu filho deve ou não ter acesso, de acordo com a idade e grau de maturidade e compreensão da criança.
Fabio Barbirato é psiquiatra pela ABP/CFM e responsável pelo Setor de Psiquiatria Infantil do Serviço de Psiquiatria da Santa Casa do Rio. Como professor, dá aulas na Pós Graduação em Medicina e Psicologia da PUC-Rio. É autor dos livros “A mente do seu filho” e “O menino que nunca sorriu & outras histórias”. Foi um dos apresentadores do quadro “Eu amo quem sou”, sobre bullying, no “Fantástico” (TV Globo).