Quando a pandemia se tornou uma realidade entre nós, há um ano, os idosos foram os primeiros a se trancarem em casa. As noticias que chegavam da Itália, então foco da doença, davam conta de que o coronavírus era implacável com os mais velhos. Milhares deles permaneceram isolados por meses, privados do convívio social.
Agora, por estarem nos grupos prioritários e serem os primeiros a tomar a tão almejada vacina contra a Covid, aos poucos os mais idosos vão retomando a rotina de que estavam afastados. Avós de 80 e 90 anos começam a conviver novamente com seus netos, finalmente em segurança.
Se a alegria é grande entre os mais velhos, não é menor entre os pequenos. Nos últimos meses, ouvimos no consultório inúmeros relatos do sofrimento das crianças quanto a privação severa de contato interpessoal com as professoras, com os amigos e, claro, com os parentes mais velhos. Houve aqueles que estavam saudosos dos avós pela imposição do isolamento social, mas também os que perderam seus parentes idosos para a Covid-19.
A relação de cumplicidade imediata que existe entre avós e netos é das mais bonitas que existem em uma família. Avôs e avós carregam e transmitem a história familiar. A existência deles, muitas vezes, explicam a nossa. São eles os responsáveis pela estruturação do nosso arcabouço emocional, direta ou indiretamente. Com o passar dos anos e o inevitável amadurecimento, isso fica evidente. Aos poucos vamos nos reconhecendo nos gestos, nas atitudes, nos hábitos daqueles que nos formaram.
Se o convívio é importante para as crianças, também é fundamental para os idosos. O contato com jovens faz com que os mais velhos mantenham-se ativos e antenados com assuntos e informações que dificilmente chegariam até eles se não fosse pela proximidade com outras gerações.Segundo o Censo 2000 do IBGE, 466 mil avós e bisavós cuidavam diretamente das crianças, dividindo, na maioria das vezes, não apenas a criação dos netos, mas também seus lares e a renda financeira.
Pessoalmente, tenho as melhores e mais carinhosas lembranças da minha avó, Clotildes Barbirato, de quem sinto muita falta até hoje. Mulher de fibra, foi uma das pioneiras no Brasil na área de Farmacologia e uma grande influência na minha escolha pela Medicina. Meus pais e meus sogros estão sendo vacinados e a ansiedade do meu filho em reencontrar os avôs e avós, depois de tantos meses, é enorme. Que a ampliação da vacinação aos idosos com menos de 80 anos, que se inicia agora, amplie a sensação de acolhimento e esperança que só o colo de uma avó é capaz de oferecer.
Fabio Barbirato é psiquiatra pela ABP/CFM e responsável pelo Setor de Psiquiatria Infantil do Serviço de Psiquiatria da Santa Casa do Rio. Como professor, dá aulas na Pós Graduação em Medicina e Psicologia da PUC-Rio. É autor dos livros “A mente do seu filho” e “O menino que nunca sorriu & outras histórias”. Foi um dos apresentadores do quadro “Eu amo quem sou”, sobre bullying, no “Fantástico” (TV Globo).