Uma verdadeira pandemia de depressão entre crianças e jovens. Essa é a conclusão de uma pesquisa publicada na revista científica da Associação Médica Americana a partir de outros 29 estudos que ouviram 80 mil crianças de diversos países da Ásia, América Latina, América do Norte, Europa e Oriente Médio. A pesquisa aponta que a prevalência de transtornos mentais dobrou entre os jovens, se considerarmos o período anterior à pandemia do coronavírus. Além disso, uma em cada quatro crianças e adolescentes apresenta sintomas de depressão e uma em cada cinco apresenta sinais de ansiedade.
Do Brasil, a instituição participante foi a Universidade Estadual Paulista (Unesp). A pesquisa brasileira ouviu 289 crianças, de seis a 12 anos, de todo o país, em 2020. A prevalência de sintomas de transtorno de ansiedade foi constatada em 19,4%, acompanhando o percentual mundial. Um ano depois, em março de 2021, a Unesp submeteu o mesmo questionário novamente e a resposta positiva aos sinais de ansiedade subiu para 25%.
O resultado é bastante compreensível. Ninguém questiona que todos fomos sacrificados nos últimos dois anos pelas restrições impostas pela pandemia. Mas arrisco dizer que as crianças e os adolescentes foram ainda mais cobrados. De uma hora para a outra, se viram privados de liberdade, sem aulas escolares presenciais (muitos sequer as tiveram online), sem a prática de exercícios físicos ou hobbies, limitados a viverem a vida por telas – na fase em que tudo que se quer é a rua e a interação social que ela oferece.
Agora, com a vacinação encaminhada no país, é hora de reestabelecer a normalidade na vida dos jovens e crianças. Rotina e previsibilidade fazem bem a eles. Com responsabilidade e segurança, devem retomar às aulas e às atividades normais, sob a certeza de que não vivê-los é mais prejudicial do que o risco do vírus.
Fala-se amiúde das sequelas físicas da pandemia, mas lembro que os danos à saúde mental tendem a ser mais numerosos e duradouros. No Ambulatório da Santa Casa já fazemos, há muitos anos, um trabalho sério e consolidado, com milhares de pacientes atendidos gratuitamente. Mas não será suficiente. É hora de governos e instituições assumirem o compromisso com o tratamento e apoio à saúde das crianças e adolescentes.
Fabio Barbirato é psiquiatra pela ABP/CFM e responsável pelo Setor de Psiquiatria Infantil do Serviço de Psiquiatria da Santa Casa do Rio. Como professor, dá aulas na pós-graduação em Medicina e Psicologia da PUC-Rio. É autor dos livros “A mente do seu filho” e “O menino que nunca sorriu & outras histórias”. Foi um dos apresentadores do quadro “Eu amo quem sou”, sobre bullying, no “Fantástico” (TV Globo).