No último dia 13 de agosto, comemorou-se o Dia do Psiquiatra. Talvez seja uma das especialidades da Medicina mais envoltas em dúvidas e prejulgamentos do público leigo. Geralmente, psiquiatras são rotulados como “médicos de loucos”. Isso apenas confirma o quanto as doenças mentais ainda são cercadas por preconceitos.
Desde jovem, sabia que iria estudar Medicina. Filho de um grande pediatra, à medida que fui crescendo, me interessei cada vez mais pelos sentimentos das pessoas. Ainda jovem, decidi que queria ser “médico das emoções”. E lá se vão quase 30 anos, dos quais 25 como psiquiatra infantil.
Não é uma profissão fácil. A Medicina – especialmente a pública – enfrenta um déficit enorme de recursos e de mão de obra. Ser médico no Brasil é conviver com a eterna sensação que poderia ter feito mais, se o entorno assim o permitisse. Mas não trabalhamos com o ideal, trabalhamos com o possível. E sim, muita coisa tem sido possível.
Com mais de 200 mil pacientes atendidos em 25 anos à frente do Ambulatório de Psiquiatria da Infância e da Adolescência na Santa Casa do Rio, eu e uma enorme e valorosa equipe pudemos testemunhar o quanto um tratamento ético, responsável e dedicado é capaz de fazer diferença na vida de milhares de pequenos pacientes. E não apenas deles: de toda família. Uma criança corretamente diagnosticada, tratada e acompanhada é capaz de mudar o próprio futuro e a dinâmica social daqueles que a cercam.
A pandemia de coronavírus agravou ou deflagrou uma série de transtornos mentais que há muito eram conhecidos, mas que viviam sob uma certa névoa perigosa de ignorância e vergonha combinadas. Número de casos de ansiedade e depressão foram expressivos, não apenas entre adultos, mas também entre crianças e adolescentes.
Dos 642 mil alunos ouvidos pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, 440 mil relataram sequelas na saúde mental, ou seja, 69% do total. Sete em cada dez alunos da rede pública relataram níveis altos de sintomas de ansiedade e depressão durante a pandemia de Covid-19. Se havia alguma dúvida que qualquer pessoa é passível de ser diagnosticada com algum transtorno mental, ela caiu por terra depois de meses de isolamento social e alteração brusca da vida cotidiana.
Por tudo isso, já é mais do que tempo do estigma que ronda as doenças mentais serem derrubados. O primeiro passo para a prevenção e melhor tratamento é falarmos sobre os transtornos, saber que eles existem, aumentar a quantidade de informação correta compartilhada com a população e desmistificar o que é absolutamente humano.
Fabio Barbirato é médico psiquiatra pela UFRJ, membro da Academia Americana de Psiquiatria da Infância e Adolescência e responsável pelo setor de Psiquiatria Infantil da Santa Casa do Rio. Como professor, dá aulas na PUC-Rio. Foi um dos apresentadores do quadro “Eu amo quem sou”, sobre bullying, no “Fantástico” (TV Globo).