Há uma febre hoje na televisão, como não se via há muito tempo, e ela se chama “Vai na Fé”. A novela acertou na trama, nos personagens e, como consequência, caiu no gosto popular e se tornou um programa adorado pelos brasileiros. A telenovela sempre teve a capacidade de olhar para a sociedade brasileira, interpretá-la e traduzi-la à própria sociedade.
O alto grau de comunicabilidade dos folhetins televisivos sempre foi fundamental para o enriquecimento cultural e educacional do brasileiro. Quando as tramas optam por se valer da ficção para prestar serviço social, de utilidade pública, são imbatíveis. É o caso da novela das sete que está no ar.
Na trama, o ator Caio Manhente interpreta Rafa, um rapaz no início da vida adulta que vive em um ambiente familiar instável. Introspectivo e recluso, Rafa sofre de depressão. O cuidado que a equipe de criadores está tendo para criar um personagem sem caricaturas ajuda a explicar a empatia que o público sente por ele e o interesse que sua história desperta.
A saúde mental, que até a pandemia era vista com desconfiança e preconceito pela população, ganhou relevância e se tornou assunto em todas as rodas. As pessoas estão ansiosas, deprimidas e, pela primeira vez, perderam a vergonha de falar sobre isso e pedir ajuda. Entre os jovens, como o personagem Rafa, a situação não é diferente. E sofre o agravante das redes sociais, cujo uso nocivo pode gerar comparações entre os jovens e ainda mais ansiedade e depressão – sem falar nas vítimas de bullying virtual.
Segundo um estudo publicado na revista Jama Pediatrics, comparado ao período pré-pandêmico, os sintomas de depressão cresceram 26% globalmente nos jovens de até 19 anos. Já a ansiedade teve um aumento próximo de 10% em crianças e adolescentes no primeiro ano da pandemia.
Já de acordo com a pesquisa Covitel (Inquérito Telefônico de Fatores de Risco para Doenças Crônicas não Transmissíveis em Tempos de Pandemia), o número de jovens diagnosticados com depressão praticamente dobrou depois da pandemia. A prevalência do transtorno em jovens na faixa etária entre 18 e 24 anos era de 7,7% e saltou para 14,8%. O crescimento também se confirma tendo em vista os pacientes atendidos no Ambulatório de Psiquiatria da Infância e Adolescência da Santa Casa.
A trajetória do personagem Rafa vai deixar claro que depressão não é “frescura”, ao contrário é uma doença e, como tal, tem tratamento e possibilidade de cura. Quando fui procurado pela autora Rosane Svartman para uma breve consultoria sobre o tema, fiquei muito honrado e feliz. Honrado por ser admirador do seu trabalho. E feliz por poder compartilhar do conhecimento com sua equipe e, como consequência, com milhões de brasileiros que acompanham sua história todas as noites.
Em tempos de redes sociais e fake news, disseminar informação certa e relevante está entre as atribuições sociais de um profissional de saúde do século XXI. Agradeço a Rosane e sua equipe a oportunidade. Parabéns e mais sucesso para “Vai na Fé”!
Fabio Barbirato é psiquiatra pela ABP/CFM e responsável pelo Setor de Psiquiatria Infantil do Serviço de Psiquiatria da Santa Casa do Rio. Como professor, dá aulas na pós-graduação em Medicina e Psicologia da PUC-Rio. É autor dos livros “A mente do seu filho” e “O menino que nunca sorriu & outras histórias”. Foi um dos apresentadores do quadro “Eu amo quem sou”, sobre bullying, no “Fantástico” (TV Globo).