Quem me acompanha sabe que tenho como rotina a visita a centros culturais, museus e galerias. Esse hábito quase que diário, somado às gestões do MAM Rio e da Escola de Artes Visuais do Parque Lage, me trouxe a percepção da relevância da atuação dos programas educativos nesses espaços.
Durante a pandemia, os educadores foram os primeiros colaboradores a serem afastados das instituições e, nos últimos meses, assistimos à gradativa retomada do trabalho de mediação que dinamiza e transforma por completo a experiência do público diante de uma exposição de arte.
Quando há oferta de visita mediada, uma relação horizontalizada de diálogo e de trocas se estabelece, levando em consideração os saberes dos visitantes e valorizando a sua contribuição ativa. Os educadores são preparados para adequar as propostas práticas de atividades paralelas às mostras, conforme as demandas específicas de seus públicos.
Se no eixo Rio-São Paulo a intervenção das equipes de educação nos museus e centro culturais é essencial, no interior do país essa mediação pode ser revolucionária.
No projeto Arte nas Estações, que leva parte do acervo do Museu Internacional de Arte Naif a três cidades de Minas Gerais, temos visto exemplos reveladores da potência desse trabalho. O desenvolvimento de ações educativas neste tipo de projeto funciona não só para atrair público, mas para construir informação a partir das narrativas que os artistas populares e as obras trazem consigo, convocando os visitantes a estabelecer relações entre os seus cotidianos e a produção artística apresentada.
Esse trabalho de mediação levou professores da rede municipal de Ouro Preto, onde o Arte nas Estações atua, a transferirem suas salas de aula para o espaço expositivo. Lá, o educativo recebeu também um grupo de mulheres frequentadoras do Centro de Referência de Assistência Social e a situação de vulnerabilidade de muitas delas encontrou eco nas obras presentes na exposição, que se tornou uma espécie de vetor de redes de solidariedade, afeto e cuidado.
Conselheiro Lafaiete, outra cidade contemplada pelo mesmo projeto, realizou, a partir do programa público de educação, uma das experiências mais radicais de aproximação da cena local ao envolver a “Cavalgada do Batom”, que levou dois carros de boi para dentro da exposição. O gesto é importante por conectar elementos representados nas pinturas naïf à própria realidade do território: o público pôde observar o carro de boi retratado nas telas e o carro de boi real.
Outro exemplo relevante da potência da intervenção de educadores aconteceu durante a temporada da exposição Queermuseu – Cartografias da diferença na arte brasileira, no Parque Lage. Muito se falava à época sobre a falta de representatividade queer da mostra. Esta lacuna foi preenchida na montagem carioca ao convocarmos exclusivamente pessoas LGBTQIA+ para compor a equipe de educação.
É preciso pensar as instituições de arte não só como territórios de fruição estética, mas como espaços ativos de escuta, construção de saberes, interpretação de culturas e fortalecimento das noções de cidadania. Isso se desdobra na ampliação do repertório cultural dos visitantes, promovendo uma reflexão acerca dos valores e contribuindo para o respeito às diferenças.
Para tanto, é fundamental o investimento na formação de educadores capacitados e de novos agentes para o sistema da arte, que tem as suas complexidades.
Nesse sentido, ressalto a qualidade dos programas de formação do MAR, do MAM Rio e da EAV Parque Lage. Outra iniciativa interessante é o Veredas, um festival de arte contemporânea com programação inteiramente on-line e gratuita, até 26 de maio. Já na 2ª edição, o projeto realiza oficinas, palestras, cursos e leituras comentadas com convidados de peso como Benjamin Seroussi, Carmela Gross, Daniel Jablonski, Jochen Volz e Lenora de Barros. Voltado a artistas, curadores, educadores e produtores culturais, o festival tem como foco a capacitação de novos agentes para o setor artístico.
Precisamos difundir essas ações para que o estado e a iniciativa privada entendam que investir nessas frentes é necessário e urgente. A arte, com suas rupturas do cotidiano, é capaz de subverter nosso olhar sobre as coisas e o mundo. E as visitas mediadas e o serviço educativo colaboram na construção dos processos de inclusão e na democratização do acesso. Avançar é preciso.