Fabio Szwarcwald

Por Fabio Szwarcwald, colecionador de arte e gestor cultural Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
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Uma reflexão sobre os rumos da cultura no futuro governo

Após grave desmonte sob a gestão Bolsonaro, espera-se a retomada do setor. Entre as prioridades do governo Lula está a recriação do Ministério da Cultura

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Atualizado em 6 dez 2022, 15h39 - Publicado em 6 dez 2022, 11h43
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  • Entre as medidas prioritárias do futuro governo Lula estão a recriação do Ministério da Cultura (MinC) e a revisão da Lei Rouanet. Após o grave desmonte sob a gestão Bolsonaro, em que o setor enfrentou cortes sem precedentes, censura e dirigismo nos editais públicos, espera-se, agora, a retomada.

    Diante do cenário de terra arrasada, precisamos de um Ministério bem estruturado, com um quadro político e técnico de alto nível. Que seja um representante com larga experiência na área cultural, apto a estimular o desenvolvimento de novas redes de trabalho a fim de resgatarmos, o quanto antes, a potência produtiva e criativa do setor.

    Para tanto, é necessária não só a readequação do orçamento, mas a rearticulação de uma estrutura robusta de fomento. Também é urgente reestabelecer o diálogo com as secretarias de cultura de todos os estados e municípios do país, criando mecanismos de descentralização e distribuição dos recursos por todo o território nacional.

    Sobre esses desafios e expectativas, conversei com o ex-ministro da Cultura e atual Secretário da Cultura do Estado de São Paulo, Sergio Sá Leitão; a Secretária estadual de Cultura e Economia Criativa do Rio, Danielle Barros; o curador e diretor da Casa do Povo (SP), Benjamin Seroussi; e o também ex-ministro da Cultura, Marcelo Calero.

    Compartilho aqui um resumo destas conversas:

    O setor cultural foi atingido por políticas de desmonte durante a gestão de Jair Bolsonaro. Que impactos você vê na extinção do MinC?

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    SSL: Houve a extinção de quase todos os programas e ações; o aparelhamento e a degradação das instituições federais de cultura; a redução e a paralização dos mecanismos de fomento; a diminuição do orçamento da área; a criminalização do setor cultural; e a redução drástica da equipe interna e da estrutura. Ou seja… Tragédia total.

    MC: O primeiro impacto é bem direto. Ao extinguir o MinC, o governo envia uma mensagem clara de que não tem dimensão da importância da Cultura para o país. Num segundo momento, nós observamos toda uma cadeia produtiva em ruínas, muitos empregos perdidos e uma parte de nossa identidade morrendo. Além disso, também constatamos que todo esse desmonte foi programado e pensado para ser exatamente dessa forma.

    BS: A extinção do MinC tem uma dimensão simbólica e prática. Simbólica por que menospreza o papel da cultura. Prática por que desorganiza o setor.

    DB: A Cultura brasileira é uma das mais aclamadas do mundo. Mesmo sem ministério nos últimos anos o setor seguiu ativo e resistiu, promovendo a arte brasileira. Voltar ao status de ministério é fundamental, vamos formular uma política cultural como motor da nossa economia. Quando não temos um ministério que formule políticas públicas, que não faz o debate com a sociedade, o segmento perde na representatividade, mas segue fortalecido graças a luta dos nossos artistas e todos que fazem parte da cadeia produtiva da cultura.

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    Quais as expectativas da restauração do MinC no futuro governo e da retomada da autonomia da política cultural no Brasil?

    BS: A expectativa é reconstruir o que foi desmontado. Isso vai além da LIC. Vai do IPHAN ao IBRAM, passando pela Biblioteca Nacional e passando por todas as outras instâncias relacionadas à pasta. Mas, além disso, espero que seja possível desenhar uma política cultural para além das Leis de Incentivo, ponto estrutural que sempre fica colocado de lado. Por fim, políticas conexas como APEX precisam voltar a funcionar com maior interseccionalidade entre ministérios.

    DB: Uma melhor divisão de responsabilidades, diálogo e parceira com estados e municípios. A cultura precisa de uma representatividade ministerial com políticas públicas específicas de financiamento para o setor. A Lei Aldir Blanc nos mostrou que é preciso conexão entre União, estados e municípios para fortalecimento do setor cultural. O financiamento é um passo, mas ele precisa de estruturação e normativo, precisa ser perene.

    MC: O momento é realmente de restauração, é esperado que haja o restabelecimento da força institucional da área cultural. Como caminho para chegar a isso, é importante reconstruir as bases de diálogo com a sociedade civil no que se refere à Cultura (algo que foi enfraquecido, para não dizer dizimado, nos últimos quatro anos). É também importante pensar em um novo Plano Nacional de Cultura. Inicialmente, realizar um diagnóstico de tudo o que foi produzido a partir do que está em vigor atualmente e, depois, construir este novo Plano Nacional para entrar em vigência até o final de 2023.

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    SSL: Espero que Lula recrie imediatamente o MinC, incluindo os cargos e a estrutura interna. Que a nova gestão revogue todos os decretos, resoluções, portarias e instruções normativas do período 2019/2022. Que sejam colocados quadros técnicos e profissionais nas funções principais. E que sejam retomados e ampliados os mecanismos de fomento e os programas e ações.

    Leis aprovadas, como a Paulo Gustavo e Aldir Blanc 2, estavam sob forte ameaça e a Rouanet permanece com liberações represadas. Você acredita que os investimentos voltarão a ser mais orgânicos, menos dificultados?

    DB: Cultura é investimento, não é custo. Quem aporta na cultura está movimentando pelo menos 60 setores da economia do Brasil. Ela não pode ser apenas pensada para um edital ou lei, precisa ser sistematizada. Tenho falado muito sobre isso com o Fórum de Secretários. Precisamos criar políticas públicas que sejam integradas. Exportar o que dá certo no Rio para o Espírito Santo, pegar exemplos bem-sucedidos do Ceará e levar para outros estados. Esse fluxo de trocas é positivo aliado ao investimento emergencial e à política de fomento que cada cidade e município faz. Elas, quando integradas, fazem girar toda economia criativa da arte, que é responsável por mais de 4% do PIB do Brasil.

    MC: Certamente. No último pleito tivemos dois projetos de Brasil bem diferentes. Mas o projeto vencedor já traz consigo toda uma história de valorização da Cultura e um entendimento de que ela é bem mais que uma política qualquer, é elemento importante na geração de emprego e renda, e na construção da nossa identidade. Espera-se que haja o fortalecimento das ações de financiamento em todo o país. As leis Paulo Gustavo e Aldir Blanc 2 foram muito importantes em termos emergenciais e, agora, por meio de um novo Plano Nacional de Cultura, será importante perenizar e fortalecer esses mecanismos. Outras expectativas são em relação ao resgate da Condecine e do Iphan, e à revisão das regras da Rouanet, que foram alteradas no mandato de Jair Bolsonaro.

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    BS: Vai demorar, mas acredito que a cultura volte a ser política de estado e não o bode expiatório de um governo.

    SSL: Certamente! Essa é a expectativa de todos que compreendem o papel estratégico da cultura e da economia criativa para o desenvolvimento pleno do Brasil.

    Que perfil deveria assumir a pasta?

    MC: Reconstrução e Diálogo. Independente da escolha do nome, acredito que essas duas palavras precisam estar presentes na execução do trabalho. Tendo em vista estas prioridades, é evidente que o perfil precisa ser aceito pela maioria da classe dos fazedores de cultura, que precisa ser ouvida. Para reconstruir e inovar, precisamos de pessoas com grande capacidade técnica, que entendam que o Brasil necessita de políticas públicas culturais de larga escala. Não podemos mais sofrer com ministros que ignoram o real tamanho do Brasil e tratam as ações governamentais como “políticas butique”. O perfil escolhido precisa entender o país, saber que a Cultura gera empregos e renda, e é responsável pelo sentido de existência de muitos brasileiros.

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    BS: Não acho que cargos políticos são cargos técnicos. Mas é bom ter alguém que tenha uma história vinculada à cultura obviamente. Porém o mais importante é menos o perfil da pessoa e sim a certeza que terá uma equipe técnica boa e estável e uma capacidade aguçada de escuta do setor que sabe muito bem o que é bom para ele.

    DB: Um perfil que construa junto, que dialogue e entenda as especificidades dos estados, que construa uma política cultural que desconcentre recursos, porque isso atinge positivamente mais pessoas, movimenta negócios, gera emprego, renda e vocaciona os artistas de todas as regiões. Independente do nome que seja o escolhido para a pasta, eu penso que o perfil de gestão deve ser voltado para pensar políticas culturais em conjunto.

    SSL: Um gestor com experiência em administração pública, histórico de realizações, conhecimento da área cultural, habilidade política, capacidade de diálogo e credibilidade junto ao setor cultural e criativo, e ao conjunto da sociedade.

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