Cresci num sítio em Teresópolis comprado a preço de nada por meus pais, na década de 50, pouco depois do seu matrimônio. Com o tempo, a região se transformou numa área de pequenos produtores rurais.
Um dos maiores orgulhos da minha família foi ter preservado uma das poucas reservas florestais que resistiram ao extrativismo de madeira para carvão, à pecuária, à lavoura e à expansão do eucalipto. Ela ainda está lá, viva, nos três morros do vale, cinco décadas depois do meu nascimento.
Quando meu pai morreu, trocamos essa terra por outra menor, no entorno de Secretário, que, já há alguns anos, passa por um processo de recuperação da mata devastada.
É uma região rica em água, coberta de árvores de portes médio e pequeno, onde ainda é possível encontrar um exemplar gigante ou outro, raros sobreviventes da cobertura original. O aspecto geral é de mata fechada, com jacus graúdos alçando voos curtos de galho em galho, à procura de frutas silvestres.
Aos poucos, notamos a presença massiva de bambuzais pelo terreno. Convocamos um biólogo, que confirmou a suspeita. Havia uma guerra em curso entre a floresta e o grupo de gramíneas denominadas Bambusoideae.
O Brasil possui a maior diversidade de bambu das Américas. As clareiras provocadas pela ação do homem propiciam a sua rápida proliferação por meio de rizoma. Assim como o capim e a grama, eles impregnam o subsolo no sentido horizontal, formando uma teia impenetrável para as demais populações de árvores e arbustos. Colonizadores agressivos, interferem na regeneração natural, estrangulando indivíduos adultos e sufocando os brotos. O resultado é o empobrecimento da flora e o afastamento da fauna, que migra para ambientes mais saudáveis.
A sombra produzida pelas espécies arbóreas inibe a concentração das gramíneas. Mas, em áreas desmatadas, o sol abundante beneficia a espécie, impedindo a regeneração.
É uma competição que teve início há 6 milhões de anos, quando o aquecimento da Terra provocou terríveis incêndios, que reduziram a selva ancestral. As sementes das gramíneas, protegidas por seu invólucro, resistiram ao cenário infernal e deram origem às savanas.
O trigo, o milho e o arroz que nos alimentam, assim como a grama, o bambu e o capim, provêm desses capinzais. Alguns cientistas afirmam que não fomos nós que os domesticamos, mas eles que nos domesticaram para tomar o planeta.
Na nossa singela chácara, demos início à tortuosa capina. É preciso desentocar as raízes e cobrir o solo com lonas para aniquilar o taquaral a contento. O reflorestamento é feito em seguida, com árvores frutíferas, que atraiam os animais para a polinização, e outras de crescimento variado, que produzam sombra suficiente para inibir a ressurreição do bambu.
Mexer num bioma é uma ciência complexa, sujeita a incontáveis variantes.
Com um prazer que beira o fetiche, encomendei 100 pés de jequitibás, jatobás, paus-brasis, pitangueiras, paineiras, ipês, perobas, sibipirunas e jacarandás. Talvez eu não viva para vê-las adultas, mas sonho em presenciar ao menos a floração.
Existe algo mais belo do que um ipê-amarelo em flor?