Gastronomia: Bruno Calixto prova as mineirices de São José das Três Ilhas
Cidade fica a 170 km do Rio (2h30 de carro), na cidade de Belmiro Braga, aquela escapada que a gente ama


Ana Carolina Mendes e Janete Santos se revezam, tocando o sino da Igreja São José das Três Ilhas (MG), uma imponente construção de pedra terminada em 1828. “Quando a gente esquece, os moradores reclamam no WhatsApp”, me contou Ana, que se diverte quando é a sua vez. “Duas badaladas rápidas são para anunciar a missa e duas mais espaçadas significam morte.”

Essa relação íntima e pessoal (apesar do Zap) dá o sabor especial ao doce de leite premiado da Leila, ao queijo ultrarrequisitado da Gabriela (La Porta), à goiabada do Jardel (filho da doce Lucila), ao café Ferreira e à cachaça da família Botti, além da rosca da Lúcia, dos biscoitos da Ângela e do macramê da Isabel. Tudo isso a 170 km do Rio (2h30 de carro), na pequena São José das Três Ilhas, na cidade de Belmiro Braga, Minas Gerais. É aquela escapada que a gente ama.



O vilarejo já foi cenário de duas produções do cinema nacional: “Lavoura Arcaica” e “O Menino Maluquinho 2”. Apenas uma rua, uma igreja, uma lojinha com todas essas delícias e séculos de memórias preservadas pelo patrimônio. São José é o centro histórico mineiro mais perto do Rio, tombado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA, em 1997). Basta uma volta para encontrar os casarios lindos, coloridos, preservados, onde, pouco a pouco, cabecinhas vão surgindo nas janelas, para ver o tempo aqui fora. Típico de um domingo de sol antes da missa. São apenas 200 moradores nessa raridade cheia de lindezas. As meninas do sino já estão a postos, esperando à porta da igreja.

Mas é sobre a gastronomia mineira local de que vamos tratar. É na casa cheia de plantas onde mora com a mãe, que Jardel faz e acontece, reverenciando a doceria mineira, com sua famosa goiabada feita no tacho de cobre: 10 kg da fruta para 5kg de açúcar no fogo alto por 3 horas. Ele vem durinho, mas gruda na faca, ideal para besuntar em cima do queijo e deixar a felicidade agir. O menor, cariocas, sai por R$ 18.


Pelas redondezas, a expert Gabriela La Porta celebra a união estável perfeita entre a potência do queijo mineiro e a delicadeza do paladar. Isso porque suas mais de cem vacas são da raça Jersey, de origem do Canal da Mancha, na Inglaterra, capaz de produzir um leite com uma porcentagem maior de gordura do que as vacas holandesas, mais habituais no Brasil. Detalhe: as vacas são divididas em três grupos para a ordenha, só comem capim e ficam no bem-bom, levando coçada de uma geringonça que parece lava-jato.
Ano passado, a empresária do ramo lácteo voltou da França com uma medalha de bronze para o seu “Belmiro Blu”, segundo os especialistas, “de perfume típico de casca natural que remete às florestas, misturado ao gosto amanteigado e à picância delicada do fungo penicillium roqueforti”. Gabriela é uma craque!
Para dar conta de um queijo tão incrível, somente o doce de leite da Leila, o mais procurado na Barraca Colaborativa, que comercializa tudo o que São José das Três Ilhas tem de mais gostoso. A receita segue a tradição mineira do doce de leite mais caseiro, bem clarinho, escorregadio na colher, bem diferente do colonial, de sabor intenso, caramelizado e mais cremoso.




Ir a Minas e não tomar cachaça é pior do que não ver o papa em Roma (tá pensando o quê?). Um dos nomes de maior prestígio por trás dessa produção é a família Botti. Para ser bem sincero, a Du Botti ouro, quase uma raridade engarrafada, passa por madeira jatobá, o que confere suavidade na boca, delicadeza no aroma e um belo visual amarelado. Presente que agrada fácil!

Um bate-volta de fim de semana é o suficiente para começar. Há duas boas opções de hospedagem. A melhor delas é a Casa do Barão, um imóvel histórico de fachada azul e branca, piscina e conforto sem presunção (32 99900-2237 – R$ 890, a diária para até dez pessoas). A outra é a Pousada São José, com pensão completa (R$ 790 o casal).
Na volta para o Rio, atenção para uma porteira diferente, uma das mais recentes vinícolas da Serra Fluminense, a Tassinari, São José do Vale do Rio Preto, já tradicional no cultivo de café especial (quase todo exportado), mas que, de uns anos para, cá vem se lançando no mundo dos vinhos: Syrah, Marselan, Cabernet Sauvignon e Tempranillo estão na paleta de castas plantadas pela família a mais de 900 metros de altitude. A primeira safra saiu em 2021, mas a vinificação foi feita numa outra vinícola, na vizinha Secretário. Atualmente acontece ali mesmo e, em 2022, o primeiro reconhecimento nacional: uma medalha de ouro no ViniBraExpo para o Syrah. A visitação com prova de três rótulos dura menos de duas horas e sai por R$ 155. Tim-tim a São José das Três Ilhas, a um pulo do Rio!
